Faltando menos de uma semana para o fim da concessão do transporte público, sob responsabilidade da Viação Santa Tereza (Visate), os vereadores de Caxias do Sul terão de votar na sessão desta quinta-feira (7) da Câmara se autorizam ou não a prorrogação do contrato por até um ano. A permissão vence no dia 12 de maio, e a dilatação do prazo foi a alternativa proposta pelo governo municipal para que a cidade não fique sem o serviço até que o novo edital seja lançado.
Enviado às pressas na segunda-feira, o projeto de lei causou reação dos parlamentares. Kiko Girardi (PSD), Rafael Bueno (PDT) e Denise Pessôa (PT) protocolaram emenda modificativa para reduzir o prazo de prorrogação para seis meses por entenderem que é possível elaborar uma nova licitação em menos tempo.
Vice-prefeito de Caxias e secretário de Planejamento, Elói Frizzo (PSB) concorda que não será necessário um ano a mais para o novo edital. O prazo de 12 meses, segundo ele, foi uma orientação da Procuradoria-Geral do Município em virtude da pandemia de covid-19 e de eventuais questionamentos jurídicos que possam ser feitos ao longo do processo.
Conforme Frizzo, a minuta do edital está praticamente pronta. O planejamento é manter o isolamento ao longo deste mês e realizar uma reunião com o Conselho Municipal de Trânsito e Transportes (CMTT) na primeira semana de junho para apresentar a proposta. Depois, uma audiência pública será convocada para discutir o documento. A intenção é lançar o edital entre o final de julho e o início de agosto. Assim, a administração espera ter a definição da concessão em outubro.
De acordo com o vice-prefeito, a minuta ficou pronta da semana passada. O governo vinha trabalhando nela desde o início do ano e precisou iniciar do zero porque, segundo Frizzo, não conseguiu aproveitar o edital lançado pela gestão de Daniel Guerra — que acabou suspenso em janeiro pelo prefeito Flávio Cassina (PTB).
— O edital vai inovar bastante nas possibilidades de novos modais. Não só elétricos, mas de veículo leve sobre trilhos e de veículo leve sobre rodas. Ele vai dar possibilidades, não será amarrado — adianta Frizzo, complementando que provavelmente serão mexidas as gratuidades, mas sem dar detalhes.
Secretário de Trânsito, Transportes e Mobilidade, Alfonso Willenbring Júnior também fala de um novo edital "não engessado" e transparente — por isso a necessidade de discussões com a comunidade que iriam começar justamente quando o coronavírus avançou no Brasil. Segundo ele, o que for possível ser feito por videoconferência.
— O transporte é muito caro e perdeu muitos passageiros nos últimos anos. Como recuperar esses passageiros? Se todos andarem de carro, ninguém mais anda na cidade. Isso precisa ser pensado. A prioridade do transporte é essa. Daqui a 10 anos na Europa não pode mais usar óleo diesel. No Brasil, é só o que se usa. Tem que pensar nisso — diz Willenbring.
"Se lastima a falta de debate"
A forma como a prefeitura está encaminhando a manutenção do serviço na cidade é questionada pelo advogado Marcus Gravina. Para ele, a administração poderia se valer da Lei 8.666, das Licitações, para celebrar um novo contrato temporário em caráter emergencial, sem licitação, com a própria Visate ou outra empresa.
A legislação, no artigo 24, inciso IV, diz que é dispensável a licitação "nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo de 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos contratos".
No dia 7 de abril, o Executivo decretou situação de calamidade pública, ainda não reconhecida pela Assembleia, para o enfrentamento da pandemia. O estado de calamidade ficou declarado pelo prazo mínimo de 60 dias.
— Se a prefeitura acha que pode prorrogar por 12 meses, pode prorrogar por 10 anos. Essa prorrogação não tem previsão — entende Gravina.
Ele critica a demora e o descaso do atual governo e do anterior, pois a concessão deverá vigorar nas próximas duas décadas:
— Deixaram para a última hora. Uma licitação tão importante, um contrato de 20 anos! Deveriam ter organizado simpósios, encontros com especialistas de outras cidades. Se lastima a falta de debate.
"Se continuar como está, vai desaparecer"
Para o presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade de Caxias do Sul (DCE/UCS), Hector de Oliveira Vieira, a prorrogação (da concessão do transporte coletivo) é necessária para que haja debate sobre o futuro não apenas do serviço, mas da mobilidade urbana. Ele, inclusive, entende que a nova concessão poderia ser uma discussão do processo eleitoral deste ano e que o novo edital poderia ser lançado pelo próximo governo.
— A atual administração não tem condições de encaminhar em meio a essa crise. E é uma gestão tampão. Não vejo ambiente democrático de discussão. De que forma seria uma audiência online se muitas pessoas não têm acesso à internet, principalmente quem mais usa o transporte coletivo? — questiona o presidente do DCE.
O representante do movimento estudantil espera que o novo edital para a futura concessão contemple questões como valorização do transporte público, modais como bicicleta e subsídio das passagens.
O presidente da União das Associações de Bairros (UAB), Valdir Walter, também concorda com a prorrogação do contrato, porque acredita que é necessário tempo para fazer a discussão que não foi feita sobre o transporte coletivo urbano.
Ele diz que o movimento comunitário quer contribuir com sugestões para o novo edital. As gratuidades, por exemplo, precisam ser revistas, na opinião do dirigente comunitário. É preciso adotar, segundo ele, critérios como renda para a distribuição do benefício. Além disso, defende que o poder público subsidie parte da tarifa para baratear o valor.
— O transporte em Caxias, se continuar como está, vai desaparecer — diz Valdir Walter.