É possível lutar por uma causa sozinho. Mas em grupo, a bandeira se torna um movimento, e ganha força. A vereadora de Caxias do Sul Denise Pessôa (PT) sabe bem disso. Na última legislatura, ela era a única mulher eleita, entre 23 parlamentares. Naquela época, comandou a Frente Parlamentar Pelo Fim da Violência Contra as Mulheres (FPPFVCM), na qual conseguiu promover algumas ações, mas nada comparado ao que pôde desenvolver, ao lado de outras três outras vereadoras que integram esta legislatura, por meio da Procuradoria Especial da Mulher (PEM). Denominada procuradora do grupo, ela tem parceria ativa de Gladis Frizzo (MDB), Paula Ioris (PSDB) e Tatiane Frizzo (SD).
A PEM surgiu como projeto de resolução da ex-vereadora Ana Corso (PT), aprovado há dois anos, em novembro de 2017, mas começou as atividades efetivamente em março de 2018. Em pouco mais de um ano e meio, o grupo realizou mais de 20 ações, incluindo palestras em escolas e empresas sobre violência doméstica, campanhas de empoderamento e amamentação em público e apitaços.
— Por mais que sejamos apenas quatro de 23, essa coalizão e disposição de trabalharmos juntas faz com que as nossas pautas ganhem força — afirma Denise Pessôa.
— Estou achando excelente essa união. Com a PEM, a gente pode discutir melhor, conversarmos mais sobre o tema. Tudo que criamos de campanhas surgiu dessa aproximação. É com as atividades que realizamos que também podemos sair daqui (da Câmara) e levar até a comunidade, no ambiente de trabalho, escolas, bairros, associações — ressalta Gladis Frizzo.
Da dinâmica a partir da união das quatro vereadoras também surgiram projetos de lei temáticos. Na última semana, dois deles foram aprovados pela Câmara. Um de autoria de Denise, que proíbe nomeação para cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração e de estágio de pessoas condenadas na Lei Maria da Penha. O outro criado por Tatiane Frizzo, que prioriza 5% das vagas de educação infantil para filhos e filhas de mulheres em situação de violência doméstica.
— Independente de sigla partidária, nos unimos e temos desenvolvido trabalho forte em prol da mulher. Não só na violência, mas no empoderamento, na saúde da mulher. Em 127 anos de Poder Legislativo, apenas 13 mulheres passaram por aqui. Precisamos nos apoiar e incentivar que mais mulheres façam parte desse espaço. Todo mundo ganha com isso — defende Tatiane.
Nesta segunda-feira, Dia Internacional para Eliminação da Violência contra Mulheres, Tatiane vai protocolar proposta de criação da Semana de Combate ao Feminicídio.
— Falamos muito da mulher em 8 de março (Dia Internacional da Mulher), mas no resto do ano fica batido. Em 2018, tivemos 93 feminicídios no Estado e neste ano já 82 (até semana passada). Precisamos olhar de diferentes perspectivas sobre o tema.
A Procuradoria Especial da Mulher também elaborou uma cartilha Por Elas, na qual constam leis, direitos e canais de denúncia para vítimas de agressão. O material pode ser conferido no link: bit.ly/2OCuTd9
* Outras três vereadoras assumiram, na condição de suplência durante a legislatura 2012-2016: Ana Corso (PT), Daiane Mello (MDB) e Gladis Frizzo (MDB)
Articulação para capacitação profissional
Entre as ações desenvolvidas pela Procuradoria Especial da Mulher (PEM) está a busca por oportunidades a vítimas de violência doméstica. Por meio de articulação com entidades e empresas, o grupo de vereadoras busca vagas de emprego e cursos de qualificação que possam ajudar mulheres a reinserir-se no mercado de trabalho e, por meio do empoderamento financeiro, ter a possibilidade de sair de um relacionamento abusivo.
— Tem alguns setores que a maioria das vagas são ocupadas por mulheres. Então procuramos empresas assim. Também buscamos e já conseguimos alguns cursos que possam ajudar a qualificar profissionalmente essas mulheres — salienta Paula Ioris.
— Muitas vezes mulheres se submetem a várias situações de violência porque não conseguem se reinserir no mercado de trabalho. Por isso, primeiro temos que garantir a proteção dela. Mas qual é o próximo passo para garantirmos a autonomia e independência (financeira) dessa mulher? Como vai recomeçar a vida dela? — questiona Tatiane Frizzo.
Entre as parcerias já estabelecidas, uma instituição hospitalar garantiu vagas para mulheres em situação de violência e cursos. Entidades representativas também se prontificaram a ofertar capacitações profissionais de maneira gratuita.
Proteger as vítimas indiretas
Um ciclo de violência inevitavelmente, envolve terceiros, sejam amigos, vizinhos, ou familiares diretos. Em um dos contextos mais graves, filhos da vítima (e muitas vezes do agressor) convivem e crescem em meio a traumas psicológicos e, por vezes, físicos.
Um projeto de autoria da vereadora Tatiane Frizzo (SD), aprovado na última semana na Câmara, visa justamente proteger crianças que vivem em ambientes de violência doméstica. Conforme a proposta, 5% das vagas em creches serão priorizadas a filhos de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.
A ideia, segundo a parlamentar, surgiu de relatos que ouvia quando atuou no Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres (Comdim), em que as vítimas declaravam dificuldades em ter onde deixar os filhos para procurar o emprego.
— É forma de proteger a criança, tirando ela de um ambiente agressivo. Colocar essa criança num local adequado e seguro possibilita à mulher buscar uma vaga no mercado de trabalho e romper com essa situação de violência, ao se tornar autossuficiente financeiramente — destaca.
Para ter acesso à prioridade de lista de espera, a vítima precisará apresentar boletim de ocorrência e ter acompanhamento do Centro de Referência para a Mulher (CRM).
— Conversei com alguns integrantes do Conselho Tutelar que atestaram existirem casos de violência em que crianças sofrem junto ao presenciar a violência contra mãe ou o próprio agressor desconta também na criança. Você retirar a criança de um ambiente desses e dar condições de viver em um ambiente mais saudável é oportunidade de preservar a integridade psicológica e física dessa criança lá na frente — complementa.
Ainda segundo o projeto, caso o percentual de 5% das vagas não seja utilizado, as remanescentes serão redirecionadas às demais crianças, respeitando os critérios definidos em lei.
Restringir espaço dos agressores
Na mesma sessão em que o projeto de Tatiane Frizzo foi aprovado, na última terça-feira (19), outra matéria que versava sobre o tema também recebeu aval positivo do Legislativo. A proposta, de autoria de Denise Pessôa, caracterizou-se no substitutivo do projeto de lei 36/2019. A iniciativa prevê impedimento de nomeação para cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração e estágios de condenados em decisão transitada em julgado na lei federal 11.340, a Lei Maria da Penha. A idealização, segundo ela, foi inspirada em relatos de vítimas de agressores que detinham cargos em órgãos públicos.
— Não é regra, são casos pontuais. Mas se formos avaliar que todos CCs são indicações políticas, passa pela reflexão de que sociedade queremos construir. Não basta dizer que somos contra violência e muitas vezes premiar um agressor, dando oportunidade de emprego, sabendo que a mulher que sofre violência deixa de trabalhar ou o trauma é tão grande que não consegue voltar ao trabalho. Parece desigual passar a mão na cabeça de agressor _ defende Denise.
Ela ressalta que o contraponto de a mulher ser obrigada a deixar emprego devido à condição de violência sofrida é ainda mais discrepante se considerado que muitas vezes a vítima percebe o agressor em posição profissional privilegiada:
— A gente sabe que, claro, algumas pessoas dizem que a vítima precisa de pensão do marido, mas a mulher não se sente amparada pelo poder público vendo agressor com cargo público, sendo bem pago, por mais que possa exercer seu trabalho, não deixa de passar pela cabeça dela "eu estou machucada, perdi emprego e agora vejo ele bem".
Outro projeto da temática de autoria de Denise Pessôa, promulgado pelo presidente da Câmara, Flavio Cassina, institui a Política Contra o Machismo nas Escolas, em agosto deste ano.
A PROCURADORIA ESPECIAL DA MULHER
:: Criada a partir de projeto de resolução da ex-vereadora Ana Corso (PT), em novembro de 2017
:: Comandando por Denise Pessôa, eleita procuradora especial da mulher, desde março de 2018, quando o grupo iniciou oficialmente as atividades
:: Desde então, mais de 20 ações foram realizadas, em especial palestras em escolas e empresas e busca por oportunidades profissionais a vítimas de violência doméstica
:: Campanhas e projetos: "Nossas Vidas Importam", palestras sobre combate à violência contra o público feminino; projeto que cria "Semana Municipal de Incentivo ao Empreendedorismo Feminino Jovem"; criação do "Selo Local Amigo da Amamentação", distinção a estabelecimento comercial da cidade que contribua com ações a favor da valorização da amamentação; "Grito de Socorro Por Elas", apitaço como gesto simbólico pela vida das mulheres.
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