Quase 15 toneladas de garrafas plásticas misturadas a papeis, resíduos eletrônicos e até veneno estão acumuladas desde 2013 nas dependências da Reciclagem Vila Esperança, em Farroupilha. O lixo tem contaminado o lençol freático da região e servido para aumentar o risco de proliferação do mosquito Aedes aegypti na Serra. A cooperativa alega que o material pertence à Sul Pet Plásticos Ltda. e foi deixado provisoriamente no local - fato negado pela empresa. A briga foi parar na Justiça.
Para tentar resolver o impasse, o vereador Rudmar Élbio da Silva (PSB), então secretário municipal de Meio Ambiente, teria usado o cargo para propor um acordo que livraria a Reciclagem Vila Esperança de uma multa de R$ 63,8 mil. Antes de se licenciar da função e retornar à Câmara, ele solicitou a Júlio César Pereira, dono da cooperativa, que retirasse ações que tinha na Justiça contra a Sul Pet.
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O encontro, que ocorreu no dia 16 de março, deu-se na residência de Júlio, que gravou a conversa e forneceu o áudio ao Pioneiro, alegando ser vítima de suborno. Uma fonte ligada ao Ministério Público informou que a situação pode configurar ato de improbidade administrativa. Confira o diálogo abaixo:
Ao tomar conhecimento da denúncia, o prefeito de Farroupilha, Claiton Gonçalves (PDT), garantiu que abrirá uma sindicância para investigar a conduta do seu ex-secretário. Ele afirmou que não compactua "com nenhum tipo de ação como esta" e que orienta os funcionários do Executivo a desenvolverem um trabalho técnico:
- Provavelmente foi um ato de cunho pessoal, que não condiz com o Poder Público. A punição, se houver, será como a sindicância determinar. Eu jamais solicitei algo do tipo para ele.
Uma polêmica montanha de lixo
Com potencial agressivo ao solo, a montanha de lixo teria sido levada pela Sul Pet à Reciclagem Vila Esperança, de acordo com Júlio, porque não havia autorização para remoção a um aterro sanitário. Ele argumenta que o acordo foi verbal e que as empresas mantinham relação há alguns anos com contratações de serviços.
Como não teria efetuado o trabalho combinado na ocasião, a Sul Pet foi acionada judicialmente pela reciclagem, que exigiu indenização de R$ 300 mil. Porém, a juíza Claudia Bampi, em fevereiro de 2015, determinou, em decisão de primeira instância - confirmada em março pelo Tribunal de Justiça do Estado -, que não era possível atribuir a posse do lixo à Sul Pet.
Acúmulo de dejetos chega a quase 15 toneladas (Crédito: Roni Rigon/Agência RBS)
Um parecer técnico do Ministério Público confirmou que a área "recebe resíduos sólidos da Codeca (Companhia de Desenvolvimento de Caxias do Sul) e Sul Pet" e que a Reciclagem Vila Esperança estava desrespeitando uma série de normas ambientais. A Sul Pet sustenta que o antigo parceiro comercial está agindo de "má-fé" para induzir a Justiça em "erro para obter vantagem que ela própria sabe ser indevida", que não procurou Rudmar Élbio da Silva para solicitar favores e que não pode tirar os dejetos porque não são de sua responsabilidade.
Enquanto o impasse permanece, uma equipe de vereadores de Farroupilha e da Vigilância Epidemiológica da cidade foram ao local na última quinta-feira para analisar possíveis focos do mosquito Aedes aegypti. Questionado pessoalmente sobre o áudio, o vereador do PSB admitiu a conversa, mas se negou a escutar e rechaçou ter oferecido o perdão da multa a Júlio César Pereira.
Contrapontos
Júlio César Pereira, dono da Reciclagem Vila Esperança
"Esse material ficou aqui e nós entramos na Justiça para que eles tirassem. A montoeira de lixo está cheia d'água e já tem as larvas do mosquito (Aedes aegypti). Ele (Rudmar Élbio da Silva) veio, pegou as larvas e disse que o material tinha que sair com urgência. Ele tinha que ter feito a coisa correta: me aplicar a multa e retirar isso que está contaminando o solo."
Direção da Sul Pet
"Ao contrário do que fora alegado pelo sr. Júlio César Pereira, não foi solicitado pela empresa Sul Pet o simples depósito de materiais pelo prazo de seis meses, e sim, estabelecida uma relação comercial, na qual a Reciclagem Vila Esperança realizou serviços de segregação de materiais com a posterior revenda de materiais selecionados para a Sul Pet. Ao final, a Sul Pet não mais operou com a Reciclagem, que continuou recebendo materiais de outras empresas, não podendo se precisar ou identificar a origem dos resíduos. Não há qualquer providência a ser adotada quanto à retirada de materiais. A Sul Pet mantém rigoroso controle de pragas e insetos em suas dependências e não pode ser responsabilizada por conduta inapropriada ou irregularidades cometidas por terceiros."
Rudmar Élbio da Silva, ex-secretário do Meio Ambiente de Farroupilha
"Foi dado um prazo de 40 dias para elas (empresas) retirarem o lixo. Eles não cumpriram. Aí, o processo seguiu em frente. A gente não vai se omitir em cumprir a lei. (Sobre o áudio) Não tive conhecimento, não farei manifestação sobre isso."
Mikael Campeol, atual secretário do Meio Ambiente de Farroupilha
"Houve um relatório de vistoria feito pelo fiscal (da prefeitura). Vai ser procedida a notificação. Para nós não interessa de quem é o material. Ele deve ser removido. O dano ambiental está lá, estamos cientes, e a área terá de ser recuperada. (A punição) depende do volume e da abrangência que isso afetou."