A bancada do PT na Câmara de Vereadores protocolou ontem um projeto de decreto legislativo para tentar sustar um decreto da prefeitura que declara de utilidade pública um terreno vizinho ao Sistema Marrecas. Os petistas questionam o fato de a prefeitura, a pedido do Samae, ter demonstrado interesse em desapropriar uma área próxima à barragem, mesmo após a obra da represa estar concluída.
Líder da bancada do PT no Legislativo, Rodrigo Beltrão diz que estranhou o interesse pelo terreno somente agora, sendo que as demais desapropriações foram em 2011. Um dia antes, na tribuna do Legislativo, ele apresentou o decreto de utilidade pública para a área, que tem 569 mil m² (o correspondente a 56,9 hectares). O documento de utilidade pública é datado de 2 de abril de 2014, e foi assinado pelo então prefeito em exercício, Gustavo Toigo (PDT), presidente da Câmara de Vereadores, mas que substituía o titular, Alceu Barbosa Velho (PDT), que estava em férias.
A justificativa, publicada pela prefeitura, é de que é uma área rural "de campo e mato, contígua à área que abrange o Sistema Marrecas, por ser necessária aos programas e condicionantes ambientais do referido Sistema". O terreno pertence ao empresário Paulo Antônio Spanholi, que é membro da Diretoria Social da Comissão Organizadora da Festa da Uva 2014 - Spanholi chegou a ser convidado pelo prefeito para assumir a presidência da Festa da Uva, mas declinou do convite para se dedicar a questões profissionais.
Beltrão também mostrou, na Câmara, o documento de registro do imóvel, datado de 15 de fevereiro de 2013. O mesmo documento mostra que o imóvel custou R$ 270 mil, arrematado em leilão há cerca de oito anos - antes da construção da barragem. Hoje, conforme o mesmo documento, o imóvel tem valor fiscal de R$ 683 mil, com base no Imposto sobre a transmissão de Bens Imóveis, o que corresponde ao valor de mercado. Apesar de o leilão ter sido há oito anos, o imóvel só foi registrado agora em virtude de embargos judiciais de concorrentes no pregão, explica Flavio Dimas Franzoi, advogado do empresário Paulo Spanholi.
O decreto legislativo requerido por Beltrão serve para interromper atos normativos do Poder Executivo que "exorbitem do poder regulamentar", segundo o Regimento Interno da Câmara. Após a proposta, a Mesa Diretora deverá oficiar a prefeitura para que preste os esclarecimentos que julgar necessário, em cinco dias.
Quando a prefeitura responder ao pedido da Câmara, com a respectiva justificativa para o decreto de utilidade pública, a Comissão de Constituição, Justiça e Legislação vai elaborar um parecer, e o projeto vai a votação no plenário.
- Estou questionando por que desapropriar agora uma área para uma obra que já está pronta, e as desapropriações já aconteceram há três anos. Só gostaria que as coisas fossem esclarecidas - ressalta Beltrão, que é relator de um projeto de decreto legislativo que concede o título de cidadão caxiense para Spanholi, com posição favorável de Beltrão.
Samae diz que precisa preservar o entorno
O pedido para que a área fosse transformada de interesse público, para futura aquisição, foi feito pelo Samae. O diretor-presidente da autarquia municipal, Édio Elói Frizzo (PSB), disse que o terreno é importante para que o entorno da barragem tenha um cinturão verde de preservação ambiental. Frizzo salienta que a área está situada a cerca de 200 metros da lagoa, por isso é estratégica.
Questionado se os 400 hectares onde já há uma área de preservação permanente no entorno não são suficientes, Frizzo diz que aquilo era a compensação ambiental para a obra, mas que o Samae está permanentemente interessado em áreas no entorno das bacias hidrográficas, para garantir a preservação da região. Sobre o fato de adquirir apenas esta área agora, mesmo depois da obra pronta, ele justifica que a autarquia está permanentemente de olho em áreas no entorno das bacias, e que outros terrenos podem ser decretados de utilidade pública no futuro, caso seja necessário. Reitera que trata-se de um terreno estratégico, por ser próximo ao lago.
- O Samae entende que é uma área importante para a proteção do entorno, e é o caso mais urgente por estar próxima da barragem - acrescenta o diretor.
O vereador Mauro Pereira (PMDB), que é da base governista na Câmara, argumenta que pelo terreno de propriedade de Paulo Spanholi passa grande parte da rede elétrica para o Sistema Marrecas, e por isso foi declarado de utilidade pública.
Já Frizzo diz que esse é um dos motivos, mas que o principal continua sendo a preservação ambiental no entorno.
Imóvel foi adquirido em leilão
Flavio Dimas Franzoi, advogado de defesa de Paulo Spanholi, proprietário do terreno, diz que o imóvel foi arrematado em leilão há oito anos, mas que seu cliente só pôde registrar o imóvel agora por causa de inúmeros embargos judiciais de terceiros, que também tentavam adquirir a área.
Garante que a área está sendo utilizada pelo empresário, que tem criação de gado no local, e que Spanholi já investiu em benfeitorias bem mais do que o valor de mercado.
- Não tem como contestar um decreto de utilidade pública. O Estado é o senhor dos direitos da posse. A única coisa que se pode discutir é o valor do imóvel, quando for feita a oferta para desapropriação, no futuro - comenta Franzoi.
O defensor critica o fato de ter se criado uma suspeita sobre seu cliente somente porque ele faz parte da diretoria da Festa da Uva. Disse que Spanholi trabalha voluntariamente e nunca ocupou um cargo de confiança remunerado na prefeitura.