A Polícia Civil indiciou por homicídio duplamente qualificado quatro suspeitos de envolvimento no desaparecimento do caminhoneiro Luciano Boeira Melos, 27 anos. Os indiciados são a mulher com quem ele tinha um relacionamento extraconjugal, o marido, o pai e o cunhado dela. Eles estão presos no Presídio Estadual de Vacaria. Para o delegado responsável pelo caso, Gustavo Costa do Amaral, Luciano foi morto porque o marido descobriu a traição da mulher. Os qualificadores do homicídio são o motivo fútil e a emboscada para a qual o caminhoneiro foi atraído no dia 26 de julho.
— A amante marcou encontro, fingindo que iria fugir com a vítima e ele foi executado pelo grupo — afirma o delegado, que concluiu o inquérito nesta quinta-feira (28).
Mesmo que Luciano não tenha sido encontrado, uma combinação de álibis inventados, ameaças de morte e imagens de câmeras de segurança, além do próprio desaparecimento do caminhoneiro há mais de dois meses, sustentam a tese que indicia os envolvidos.
— Ele (Luciano) foi ameaçado de morte, foi atraído para um lugar, foi filmado entrando na estrada (de Caraúno) e de lá não saiu. Não existe possibilidade de ele ter voltado pela estrada sem ter passado pela câmera, não existe caminho. Não há nenhum sinal de vida dele desde então. Sem acesso a WhatsApp, sem telefone, sem movimentação bancária, sem reconhecimento por populares, além da moto ter sido desovada. Ademais, todos os álibis dos suspeitos são falsos — afirma Amaral.
As câmeras mencionadas pelo delegado, que registraram o caminhoneiro no dia 26, são do pomar de uma empresa, que fica na localidade de Caraúno, onde a mulher mora com o marido e os dois filhos. Por volta das 19h daquele dia, a única moto que passou pela via durante todo o dia 26 é vista seguindo caminho no sentido da casa do casal. Por ter sido a única moto registrada pela câmera no local e pelo horário ser próximo das últimas mensagens enviadas por Luciano à família dizendo que estaria indo encontrar com a mulher, a polícia concluiu que era, de fato, o caminhoneiro nas imagens.
Em depoimento, a mulher afirmou que esteve com o caminhoneiro no dia 26 a cerca de 300 metros do ponto das câmeras de segurança do pomar. Entretanto, não é possível saber se houve o encontro ou se Luciano foi morto logo após passar pelas câmeras. No último contato com a família, o caminhoneiro avisou que estava a caminho do encontro com a mulher.
Álibis inventados e ameaças de morte
Conforme o delegado, os indiciados combinaram as histórias que contariam para a polícia e inventaram álibis no decorrer do dia 26. Isso ocorreu tanto durante o dia quanto depois do horário que o caminhoneiro aparece nas imagens das câmeras de segurança. As mensagens com essas combinações foram apagadas dos celulares dos suspeitos e recuperadas durante a investigação. As mesmas histórias foram contadas pelo casal à reportagem do Pioneiro no dia 4 de agosto.
— É impossível que os suspeitos fossem prever o desaparecimento do Luciano para ter que combinar álibis no dia seguinte. Os álibis foram combinados no dia do desaparecimento. Os suspeitos não tinham como prever que a polícia ia chamá-los, a não ser que já soubesse que ele ia desaparecer — conta Amaral.
Os álibis inventados contavam que os indiciados teriam passado a noite do dia 26 de julho consertando um carro na garagem de casa. Entretanto, segundo o delegado, provas foram coletadas mostrando que nenhum carro chegou a ser consertado.
— Encontramos mensagens demonstrando que eles combinaram isso no depoimento. Testemunhas confirmaram que eles combinaram depoimento. Dados de conexões de wi-fi e 4G mostram que eles não estavam na garagem de casa naqueles horários — pontua o delegado.
Além disso, o pai e o marido da mulher enviaram ameaças de morte para Luciano no dia em que ele foi visto pela última vez. Naquele mesmo dia, às 12h19min, ele contou sobre as ameaças para o irmão Lucas Silva, que compartilhou com a reportagem do Pioneiro o registro da conversa.
Conclusão do inquérito e prisões dos suspeitos
Conforme Amaral, as chances de encontrar o caminhoneiro são remotas, principalmente, porque os quatro indiciados optaram pelo direito de permanecerem em silêncio sobre o caso desde o início. Entretanto, a polícia analisa outras possibilidades que podem indicar o local onde o caminhoneiro está. Essas possibilidades, conforme o delegado, são mantidas sob sigilo.
A mulher, o marido, o pai e o cunhado dela estão presos preventivamente no Presídio Estadual de Vacaria desde o dia 17 de agosto. Com a conclusão do inquérito, o caso deve ser analisado pelo Ministério Público (MP) para dar início a um processo criminal.
Os advogados de defesa já apresentaram recursos para que houvesse a revogação da prisão, que foram rejeitados pelo Poder Judiciário. A reportagem do Pioneiro tentou contatar o advogado de defesa que representa a mulher, o marido e o cunhado dela, mas não teve retorno até a publicação desta matéria. O advogado que representa o pai da mulher informou que, na próxima segunda-feira (2), vai se aprofundar sobre o inquérito para apresentar novos recursos.
Relembre o caso
Na quarta-feira, 26 de julho, Luciano teria arrumado a casa onde mora. A residência mista, de concreto e madeira, fica ao lado da casa da mãe, Elizete Boeira, 45 anos. Com a faxina, que fez tanto dentro, quanto fora do local, o caminhoneiro parecia estar esperando alguém. Conforme a família, um comerciante revelou que, naquele mesmo dia, ele teria comprado lençol e fronhas de travesseiro novos e feito questão que os itens fossem entregues naquela quarta.
No fim do dia, o caminhoneiro teria pedido para a mãe preparar o jantar e já havia guardado a moto na garagem. Enquanto Elizete dobrava roupas e aguardava o jantar ficar pronto, ouviu o filho saindo de moto, sem avisar para onde ia. A mãe diz ter sentido um aperto no peito na mesma hora e começado a enviar mensagens e fazer ligações para o filho, pedindo que ele voltasse para casa.
Segundo Elizete, que recebeu a reportagem do Pioneiro no dia 4 de agosto, ele "saiu para ir ali e já voltar, não saiu com a intenção de não dormir em casa, deixou tudo ligado". Às 19h40min o caminhoneiro enviou uma mensagem para a mãe dizendo que tinha ido na cidade. Para o irmão Lucas Silva, Luciano revelou ter ido encontrar com a mulher. Esses foram os últimos contatos feitos com a família.
Segundo a Polícia Civil, depois de Luciano ser morto, os indiciados teriam deixado a moto do caminhoneiro na localidade de Casa Branca, a cerca de 30 quilômetros do ponto onde Luciano havia se encontrado com a mulher — a moto estava sob uma ponte.
Além dos celulares, armas de fogo dos indiciados foram periciadas, mas nada foi encontrado. Supostos vestígios de sangue em três veículos também passaram por perícia, mas, conforme o delegado, nada foi comprovado pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP).