Com 383 roubos de veículos, 2020 foi o ano com o menor número desse tipo de crime em Caxias do Sul desde 2002. Antes, a marca pertencia a 2003, que teve 446 roubos de veículos. É também o quarto ano consecutivo de queda desse delito. São 591 roubos a menos na comparação com 2016, ou seja, uma redução de 60% em quatro anos. Os roubos de carro são uma prioridade do combate policial pelo alto risco de se tornarem um latrocínio (roubo com morte).
A reação aos roubos de veículos iniciou justamente após o ano mais violento da história de Caxias do Sul. A crise das finanças estaduais em 2016 levou ao parcelamento de salários de servidores e corte das horas extras de policiais. O resultado foi uma explosão nos índices criminais por todo Estado, com a maior cidade da Serra terminando com 150 assassinatos e e 974 roubos de carro. Sem reforço no número de policiais (que permanece estimado em metade da tropa necessária para a cidade), a solução foi viabilizar uma maior integração entre Brigada Militar (BM) e Polícia Civil e aprimorar a inteligência policial, principalmente em relação ao mapeamento de crimes por hora e local em que acontecem, informação disponibilizada automaticamente pela ferramenta Avante.
O passo seguinte foi priorizar a investigação de quadrilhas especializadas, missão da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco). Em 2020, a equipe de policiais liderada pelo delegado Luciano Pereira efetuou 180 prisões relacionadas a furtos e roubos de veículos. Em outubro do ano passado, por exemplo, a Operação Perene cumpriu 38 ordens judiciais e prendeu 18 investigados em cinco bairros da cidade e no Litoral Norte. A investigação mapeou a função de cada integrante do grupo criminoso, desde quem roubava os automóveis, adulterava placas e escondia os veículos, até aqueles que ofereciam apoio logístico para os crimes.
O resultado da operação foi imediato, com 18 veículos roubados em novembro — o menor número em 2020. Para comparação, a média do ano foi de 32 carros roubados por mês. Cabe ressaltar que, segundo a investigação, o grupo alvo da Operação Perene era especializado no roubo de caminhonetes a diesel, que eram enviadas para outras cidades e até para fora do Brasil.
— Nossa investigação busca a organização criminosa, o que é mais complexa. A atuação delas é como uma empresa, com funções específicas que buscamos identificar. Não é apenas aquele ladrão que faz o roubo propriamente dito, há também um gerente, um financiador, aquele comparsa que consegue as armas, os que fazem as clonagens depois dos carros roubados e os que enviam esses veículos para um destino de venda. O que queremos desarticular é esta estrutura — explica o delegado Pereira.
O chefe da Draco afirma que os números de roubos de veículos só não são ainda menores devido ao fácil acesso que os presos têm a celulares nas cadeias. Desta forma, eles demoram um tempo, mas conseguem reorganizar esquemas criminosos com novos comparsas (ou até os mesmos que recebem a liberdade provisória dos presídios). Esse fato ficou novamente comprovado na Operação Perene.
— O líder chegou a ser transferido de presídio, mas continuou coordenando (o esquema) por celular. Necessitamos que o sistema prisional tenha bloqueadores de celulares. Caso não haja medidas para restringir este acesso a celulares, o que conseguimos é tirar este grupo do meio social, mas eles continuam a agir lá de dentro. Precisamos cortar este contato, aí teremos uma redução ainda maior não só destes roubos de veículo, mas também tráfico de drogas e homicídios — salienta o delegado Pereira.
Denúncias e troca de informações aceleram investigações
Sobre estas investigações contra o crime organizado, o chefe da Draco destaca a importância da parceria com policiais militares. Os brigadianos estão sempre nas ruas e colhem muitas informações que facilitam a atuação da Polícia Civil.
— Hoje, essa troca de informações é imediata. Há várias denúncias que só são feitas para a BM, que nos repassa. Assim chegam nomes, endereços e outros indícios que permitem fazer ações mais pontuais. É como se a investigação começasse já na metade do caminho — descreve o delegado Pereira.
A parceria também é exaltada pelo comando do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM). A BM monitora os bairros com mais índices de roubos para distribuir a tropa onde poderão evitar mais crimes. Uma informação importante para os PMs em patrulhamento é qual a rota de fuga está sendo utilizada pelos criminosos, o que permite fazer prisões logos após os crimes.
— (Roubo de veículo) é um crime muito cíclico e de difícil prevenção pelo tamanho da frota (na cidade). Fazemos o mapeamento dos horários e locais, mas são as prisões que mostram os efeitos (nos indicadores). Quando acontece a captura de envolvidos neste crime organizado, a queda nos números de crime é imediata. Por isso, é fundamental a troca de informações entre os órgãos de segurança e a investigação da Polícia Civil para desmantelar estas quadrilhas — ressalta o tenente-coronel Jorge Emerson Ribas.
Para Polícia Civil e BM, a maioria dos roubos de veículos acontece por encomenda e não mais por oportunidade com antigamente. O fenômeno é visto nos mapas de crimes e debatidos nas reuniões do programa RS Seguro, que reúne lideranças policiais dos 23 municípios gaúchos mais violentos.
— Pelas investigações, os roubos são encomendados principalmente quando envolvem caminhonetes e carros de luxo. É algo que é constatado em todo o Estado. Antes, existiam bairros e áreas onde os roubos eram mais comuns. Agora, os crimes estão espalhados pela cidade. O que indica que o alvo é escolhido e é feito um pré-monitoramento do veículo antes do crime — relata o delegado Pereira.