Com um homicídio no bairro Desvio Rizzo, Caxias do Sul alcançou a triste marca de 100 assassinatos em 2016. O aumento da violência não surpreende as autoridades policiais. O delegado Rodrigo Kegler Duarte apontava esta tendência desde o primeiro semestre. Porém, o titular da Delegacia de Homicídios e Desaparecidos (DHD) afirma que é complicado definir as razões deste crescimento.
– Não há um motivo específico. O delito de homicídio pode ser derivado das mais variadas causas e o clima de instabilidade, seja política ou econômica, resulta no aumento da prática de crimes, inclusive os homicídios – comenta.
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AS CAUSAS
Tráfico de drogas
Os especialistas em segurança pública e autoridades policiais são unânimes em apontar a droga como principal motivador da criminalidade. A principal investigação da Delegacia de Homicídios e Desaparecidos (DHD) no ano passado mapeou o conflito entre grupos rivais pelo controle do bairro Euzébio Beltrão de Queiróz, conhecido como Vila do Cemitério. No total, a Operação Sepultura relacionou oito homicídios ao conflito.
Porém, o delegado Rodrigo Duarte, titular da DHD, afirma que a maioria das vítimas do tráfico neste ano não estão envolvidas no conflito entre facções, a exemplo do que vem ocorrendo em Porto Alegre.
– A maioria são de usuários em dívida ou aquele que é colocado pelo traficante como revendedor e não repassa o valor. Geralmente, acaba em homicídio. Há outra pequena parte que envolve disputa de território, quando um determinado traficante tem o domínio de certa área e outro traficante menor tenta vender na região. Costumam resolver a situação com crimes contra a vida.
Vida criminosa
Segundo levantamento da Polícia Civil, 54 dos mortos neste ano tinham antecedentes criminais. Boa parte dos assassinatos foi motivada por disputas que começam nas casas prisionais. A violência reproduzida pelo sistema carcerário já havia sido alertada pelo promotor João Carlos de Azevedo Fraga e pela juíza Milene Dal Bó como motivo para a interdição do Instituto Penal de Caxias do Sul, que abriga o regime semiaberto, em agosto. A necessidade de uma reforma na casa e a falta de agentes penitenciários foram determinantes para a decisão.
– Entre 80% e 90% das vítimas e dos autores de homicídios possuem passagens na polícia. Muitos são egressos do sistema penitenciário. Quando cumprem penas, essas pessoas costumam se aliar a outros por sobrevivência e por uma situação melhor lá dentro. Quando saem, estão em dívida. Muitas dessas dívidas são pagas com homicídios. E há os crimes por vingança, quando um familiar faz justiça com as próprias mãos ou por um aliado que foi morto – relata o chefe da DHD.
Roubos com morte
O latrocínio continua assustando. Dos sete casos registrados desse ano, cinco foram solucionados com autores presos pela Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas (Defrec). A investigação da morte de Fernando Giovani Maculan, 17, esfaqueado durante um roubo a pedestre no bairro Lourdes, ainda é investigado na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), mas se aproxima de uma solução.
O único caso em aberto é a morte de Rafael Elly Giacomet Secco, 45 anos. Ele foi encontrado baleado dentro de sua Saveiro, no bairro Cristo Redentor. O caso foi registrado como homicídio, pois celular e pertences pessoais da vítima foram encontrados. Porém, novas provas apontam para uma tentativa de roubo a veículo e o caso foi repassado à Defrec. A suspeita é que o empresário tenha sido abordado por assaltantes próximo a garagem de casa e foi baleado. Ferido, Secco arrancou o carro para fugir, mas só conseguiu rodar apenas alguns metros.
Violência de gênero
A violência de gênero persiste: a cidade teve dois feminicídios até agora. Um deles chamou a atenção por ocorrer na tarde de um domingo no bairro Cinquentenário. Em 25 de junho, a Brigada Militar foi acionada por uma briga de casal na Rua Zulmira Soares. Os policiais encontraram Maicon Modelski, 28 anos, em frente a uma moradia e com uma arma na mão. Ele confessou ter matado Simone Beatris Braga da Silva, 39, dentro da casa.
Em maio, a viúva Isabel Cristina Nunes, 46, foi encontrada sem vida num matagal, nua e com ferimentos na cabeça e no rosto. Dois meses depois, a polícia prendeu o autor do crime, que seria um ex-namorado de Nunes. Ele negou envolvimento.
Banalidade
A passionalidade embalou muitos crimes. Douglas Michael Vingert Adams, 22 anos, foi morto em 10 de abril por um homem que reclamou do som alto de um carro. Adams havia ido ao bairro Jardim Eldorado para auxiliar a montagem de um roupeiro. Ele e o irmão descarregavam as ferramentas de um veículo em frente ao prédio onde reside o amigo. Após reclamar na janela pelo som alto do carro, o vizinho desceu e esfaqueou Adams.
Em 18 de setembro, Érica da Silva dos Santos, 20, foi morta a tiros em frente a uma casa noturna na Avenida São Leopoldo. De acordo com a investigação da Polícia Civil, os disparos foram feitos por jovens que haviam sido expulsos da festa naquela noite e tinham como alvo os seguranças da casa. Outras quatro pessoas foram feridas pelos tiros.
O único caso registrado no bairro De Zorzi neste ano foi passional. João Elissandro Nunes de Abreu, 32, foi baleado dentro de um bar na Rua Vilmar Souza dos Passos. Sua companheira testemunhou o crime e afirmou que o atirador era seu ex-marido, que não se conformava com a separação. Olímpio Eto Pinto Fernandes, 53, foi preso em flagrante e admitiu o crime.
Adolescentes assassinados
A adolescência nunca esteve tão fragilizada em Caxias do Sul. Doze vítimas em 2016 foram rapazes e moças com idades entre 12 e 17 anos. O crime mais recente envolveu Erica Fernandes de Oliveira, 16, golpeada na cabeça em um matagal no bairro São Cristóvão. Duas semanas antes, Lucas Antunes de Andrade, 14, foi morto com um tiro no peito quando pilotava uma motocicleta no bairro Montes Claros. Ao lado de outros 10 casos, essas mortes superam os números de todo o ano passado, quando foram assassinados oito adolescentes.
Metade dos homicídios de adolescentes em Caxias do Sul teria relação com o tráfico de drogas e acerto de contas entre grupos criminosos. Nos demais, o motivo é variado. Ciúmes é a principal linha de investigação sobre os assassinatos dos primos Vitor Gois Neves, 14, e Kelvin Arceno Vieira, 15, executados às margens de uma estrada de chão próximo a barragem da Maestra. Kelvin recebia ameaças via rede social do ex-companheiro de sua namorada.
Filipe Ramos da Silva, 16, pode ter sido morto por engano na Rua das Arapongas, bairro Vila Ipê, por tripulantes de um Chevette branco. O adolescente, que não tinha passagens pela polícia, esperava o pai retirar o carro da garagem quando foi baleado. Eles iriam até Carlos Barbosa buscar roupas para uma prima.