Os atendimentos prestados pela Defensoria Pública na Serra dobraram no segundo mês completo de medidas contra o coronavírus. Foram 8,4 mil consultas em maio, que ocasionaram quase 4 mil peticionamentos. A maior procura foi por ações para fornecimento de medicamentos. O aumento é relacionado ao número de pessoas que teve a renda reduzida diante das restrições para evitar o contágio da covid-19. Desde o início do combate à pandemia, a Defensoria tem trabalhado de forma remota e ampliado as possibilidades de atendimento à população por telefone e meios digitais.
O crescimento na Serra seguiu a tendência vista em todo o Estado, que contabilizou mais de 69 mil atendimentos no mês passado. A instituição percebe dois motivos que explicam o aumento na procura pelos serviços. O primeiro é a adaptação da Defensoria Pública à nova realidade do trabalho remoto, com os servidores e a população aprendendo a utilizar as ferramentas e tecnologias que facilitam o atendimento. Em Caxias do Sul, a orientação é dada pelo telefone (54) 3228.2298.
— A Defensoria não parou em nenhum momento. Tivemos que nos reinventar e foi tudo muito rapidamente. Encontramos meios para que as pessoas possam acessar, talvez até mais facilmente do que antes. Antes, não tínhamos tantas formas remotas de atendimento. Acredito até que encontramos mecanismos que vem para ficar — pondera Aline Langner Dal Ri, defensora pública regional de Caxias do Sul.
A sede da instituição permanece fechada, decisão que acabou reforçada pela classificação de bandeira vermelha da semana passada, mas foram ampliados os ramais para permitir um maior número de atendimentos pelos servidores que estão em home office. As situações são resolvidas com cada cidadão, com envio de documentos pela internet ou mensagem de telefone. Apenas em último caso, quando a pessoa não tem nenhum acesso remoto, uma equipe de plantão realiza o atendimento presencial.
— Não houve prejuízo para a população. A orientação acontece da mesma forma. Foi muito intensa a demanda que chegou, mas nos organizamos e temos que dar conta. Talvez, Caxias do Sul seja a primeira comarca a estabelecer (o modelo remoto). O número de atendimentos em maio foi estrondoso — destaca Aline.
O segundo fator que pode explicar o maior número de atendimentos seria o aumento do desemprego e a diminuição da renda das famílias, o que gera situações como superendividamento e um desamparo geral. Por legislação, a Defensoria Pública presta serviços gratuitos a pessoas hipossuficientes financeiramente, ou seja, aquelas tem renda familiar mensal igual ou inferior a três salários mínimos nacionais.
— Quando temos uma crise de saúde como essa que vivemos, associada à crise econômica, o reflexo na Defensoria é imediato. Já estamos projetando que esse aumento vai ser uma tendência para os próximos meses — afirma Rafaela Consalter, subdefensora Pública-Geral para Assuntos Institucionais.
"São mais pessoas com menos condições financeiras", aponta defensora regional
O levantamento da Defensoria Pública aponta que foram 1.575 novos assistidos entre os dias 18 de março e 9 de junho. A área que teve a maior crescimento foi na Vara de Família, que triplicou o número de atendimento: de 624 em abril para 1.949 em maio. A maior demanda por auxílio jurídico, contudo, continua sendo para conseguir remédios.
— O fornecimento (de medicamentos) é um trabalho que normalmente tem demanda alta. Na pandemia, o que aconteceu é só de mais pessoas não conseguirem comprar. São mais pessoas com menos condições financeiras. É um trabalho que sempre foi elevado e já existe um fluxo que funciona. Há um caminho (de orientação) para a pessoa conseguir estes medicamentos e, caso em 20 dias não seja fornecido, já pedimos o bloqueio na conta pública. Efetivamente, as pessoas têm acesso aos medicamentos — explica a defensora Aline.
Sobre o aumento dos pedidos de separação, a Defensoria admite que parece ser um reflexo da pandemia. Na opinião da defensora regional, o fato de as pessoas estarem mais em casa exacerbou os conflitos e legou ao fim de alguns relacionamentos, o que também é um fato na disputa de guardas de crianças. Na questão de ações de alimentos, o entendimento é que seja um reflexo da questão econômica.
— Muitos pais e mães estavam pagando regularmente a pensão, mas perderam a renda e tiveram dificuldades. No início da pandemia, que foi praticamente um lockdown, muitos não conseguiram aquela renda que normalmente obtinham e não alcançaram o valor necessário para a pensão. Por isso, os guardiões das crianças buscaram a Defensoria. Há também questões em que havia um acordo (informal) entre os pais, que agora não foram cumpridos por efeito da pandemia.
É importante notar que o Fórum também está fechado em razão da pandemia e os prazos estão suspensos. O Poder Judiciário está trabalhando em home office, mas a tramitação dos processos acaba sendo mais lenta — principalmente nas áreas em que ainda não foram instaurados processos eletrônicos. Todavia, a Defensoria Pública confirma que as demandas urgentes estão sendo atendidas em tempo hábil.
NOVOS ASSISTIDOS NA PANDEMIA
Março*: 121
Abril: 312
Maio: 863
Junho*: 279
Total: 1.575
ATENDIMENTOS NA PANDEMIA
Março*: 1.542
Abril: 4.103
Maio: 8.464
Junho*: 2.400
Total: 16..509
PRINCIPAIS ATENDIMENTOS NA PANDEMIA
Fornecimento de Medicamentos: 10.446
Alimentos: 1.725
Casamento: 1.166
Guarda de criança: 559
Vaga em pré-escola: 489
Fonte: relatório de atuação entre os dias 18 de março e 9 de junho das Defensorias Públicas Regionais de Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Farroupilha, Garibaldi, Veranópolis, São Francisco de Paula, Nova Prata, Gramado, Vacaria, Flores da Cunha, Canela, Bom Jesus e Nova Petrópolis.
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