Pouco policiamento, sinal de celular e de internet precários, problemas com a telefonia fixa, longa distância entre moradias e falta de critério na hora de contratar trabalhadores para colheita. Essas são as fragilidades que há anos expõem os moradores de áreas rurais de Caxias do Sul a criminosos. O debate sobre a insegurança no interior da cidade, desta vez, pode tomar outros rumos com a criação de grupos de trabalho nas comunidades. A iniciativa é promovida pelas comissões de Agricultura, Agroindústria, Pecuária e Cooperativismo (CAAPC) e Temporária Especial para o Enfrentamento da Violência da Câmara de Vereadores.
Formados por moradores dos distritos caxienses, vereadores e representantes dos órgãos de segurança pública, os grupos têm trocado experiência com bairros da área urbana como Colina Sorriso e Cinquentenário, que criaram mecanismos próprios como monitoramento por câmeras de vídeo e grupo no WhatsApp para se proteger e trabalhar em conjunto com o policiamento comunitário.
Entre as iniciativas apresentadas nos grupos de trabalho, está o projeto de coordenadas de geolocalização das residências da zona rural. A iniciativa facilita o acesso da polícia, dos bombeiros e de ambulâncias às moradias em localidades muito afastadas e prejudicadas pela falta de sinalização e iluminação (ver mais abaixo). A discussão sobre a insegurança no interior foi retomada em novembro do ano em audiência pública em Fazenda Souza. Neste ano, houve encontro em Vila Oliva e Vila Cristina. O próximo debate deve ocorrer em Ana Rech, em data a ser definida.
Para o capitão da 2ª Companhia de Policiamento Militar, capitão Marcelo Constante, que está respondendo também pela 1ª Companhia, o ponto que prejudica o trabalho da polícia é a distância, por isso, a união entre a corporação e a comunidade é essencial:
— Temos repassado orientações aos moradores do interior e apresentado exemplos de bairros onde o policiamento comunitário e as ações dos moradores andam em conjunto para combater a criminalidade. No Colina Sorriso e Cinquentenário, por exemplo, essa união faz com que a Brigada preste um serviço melhor e mais voltados aos problemas de cada bairro. No interior é diferente, uma residência muito distante da outra, então sugerimos que a comunidade das áreas rurais se organizarem, conheçam bem a região e os vizinhos mais próximos e fiquem atentos, por exemplo, a um carro ou a uma pessoa suspeita e repassem à policia — orienta Constante.
"Despertar o senso comunitário faz a diferença"
A posição da presidente da Comissão Temporária Especial para o Enfrentamento da Violência, vereadora Paula Ioris (PSDB), vai ao encontro do posicionamento da Brigada Militar: não basta só o policiamento, é preciso até mesmo uma mudança de comportamento dos moradores. Para ela, muitos agricultores contratam safristas que não conhecem, mantêm dinheiro guardado em casa e não comunicam roubos e furtos à polícia. Paula ressalta que que as demandas são antigas, e por isso, precisam de um debate profundo para buscar soluções, e isso passa, pelo envolvimento e união da comunidade:
_ Não estamos indo nas comunidades pra prometer nada, e nem pra falar que tem uma solução fácil, mas sim para mostrar como a população pode se engajar, inclusive, com mudanças de comportamento que possam deixar eles menos frágeis. Tem que ter mais policiais, tem, mas despertar o senso comunitário faz a diferença _ destaca a parlamentar.
BRECHAS A SEREM COMBATIDAS
Confira as fragilidades que tornam a zona rural de Caxias do Sul insegura:
:: Comportamento: muitas pessoas ainda guardam dinheiro em casa e não checam os antecedentes criminais ou buscam referência de trabalhadores temporários contratados para a colheita.
:: Telefonia deficiente: esse é um dos maiores entraves das comunidades rurais. A precariedade do sinal móvel dificulta as chamadas para serviços de urgência e até mesmo a comunicação entre vizinhos. Há problemas também com a telefonia fixa.
:: Grande extensão territorial: a área rural de Caxias do Sul é muito grande, o que complica o policiamento e implica na demora do socorro que vem da área urbana. Além disso, a distância entre as propriedades dificulta o relacionamento e a ajuda entre vizinhos.
:: Baixo efetivo policial: seria necessário um plantão 24 horas permanente nas sedes dos distritos, o que não ocorre. Em comunidades que contam com policiamento comunitário, os servidores da BM saem de folga e não são substituídos. Nessas ocasiões, os distritos dependem dos PMs que atuam na área urbana.
Ferramenta para facilitar socorro
A distância entre as propriedades rurais, a falta de comunicação e a angústia de esperar pela chegada de uma ambulância ou da Brigada Militar é uma realidade enfrentada por muitas famílias. Para atender uma emergência na Quarta Légua em Galópolis, uma equipe da polícia ou de socorro só consegue chegar mais rápido e não se perde porque a combinação é deixar morador na sede, em um ponto conhecido, para esperar e guiar o resgate até a residência. O topógrafo Jair Strapasson, 46 anos, já passou por uma situação como essa ao ter um veículo furtado. Ele conta que é difícil explicar o endereço de onde mora, o que dificulta o acesso dos socorristas e facilita a fuga de assaltantes, por exemplo. Integrante do Conselho de Segurança de Galópolis, Strapasson idealizou o projeto de coordenadas de geolocalização das residências da zona rural. Na prática, ele mapeou e cadastrou toda a região onde mora usando a geolocalização por satélite. O mapeamento levou um ano e seis meses para ser concluída, e funciona com GPS e o número da coordenada da residência, que pode ser facilmente obtido no Google Maps:
— Fiz o levantamento porque conheço a região, então é só buscar a residência no Google Maps e coletar a coordenada. O próximo passo é desenvolver uma agenda para entregar às coordenadas aos moradores e isso irá facilitar o acesso de serviços básicos que precisamos aqui no interior. Vai diminuir o tempo de resposta porque os órgãos de segurança e o Samu tem GPS nos veículos. Não precisa de investimento algum, vai inclusive, diminuir custos de combustível.
O topógrafo diz que basta conversar com as autoridades para tirar a ideia do papel:
— Temos a ferramenta em mãos e ela não é usada. Claro que é o começo, temos que alinhar com a Brigada Militar e já contatamos o Samu para ver se tem a possibilidade de usarmos essa localização com as coordenadas. Com a Brigada já testamos e funcionou: joga a coordenada e traça a rota do ponto em que eles estão até a minha residência, por exemplo. A Brigada até usa, em buscas aéreas, mas não da maneira como estamos propondo.
Strapasson destaca que está acompanhando os encontros da Câmara de Vereadores para explicar como a ferramenta funciona e engajar as demais comunidades a mapearem as regiões. Para ele, se todos usarem o sistema na área rural, a tendência é ampliar a segurança dos moradores.
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