Por falta de fiscalização, a maior casa prisional da Serra está rendendo muito dinheiro para grupos criminosos. O esquema na Penitenciária Industrial de Caxias do Sul (Pics) envolve extorsão, tráfico de drogas e o controle de setores que deveriam estar nas mãos do Estado. A farra impossibilita qualquer tipo de ressocialização e ganhou mais força devido a um acordo informal entre os presos e a direção regional da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe).
Para que os apenados não causem problemas, agentes têm feito vistas grossas em relação às irregularidades. A intenção é fazer com que o presídio aparente normalidade, quando, na verdade, tornou-se fachada para o fortalecimento de grupos criminosos.
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Mas esqueça aquela visão de presos agindo de forma velada. Segundo agentes penitenciários e brigadianos, as negociatas na Pics são escancaradas. Os servidores presenciam diariamente o consumo de drogas variadas, tanto nas galerias quanto no pátio durante as visitas. Cordas de lençóis (chamadas de jiboias) são vistas com frequência transportando roupas, tênis, bonés e joias entre as janelas das celas.
O esquema é tão aberto que os presos circulam com notas de R$ 50 e R$ 100 e não tem hora para acontecer.Esse acordo, que é denunciado por agentes penitenciários e policiais militares responsáveis pela guarda externa, seria a explicação para a penitenciária não receber uma revista geral desde março de 2011. Naquela última grande ação, foram apreendidas 53 armas artesanais, 47 celulares, 267 papelotes de cocaína e 1.086 pedras de crack. De lá para cá, não houve mais pente-fino para encontrar objetos ilícitos ou detectar problemas estruturais. Em contrapartida, os detentos não fizeram rebeliões, algo que era corriqueiro anos atrás.
– É uma vergonha. Tudo é vendido. Tudo eles fazem dinheiro. Não é só a droga. Um telefone é vendido por até R$ 2 mil. Na primeira galeria, que está incontrolável, gira em torno de R$ 40 mil por mês. São quase R$ 500 mil por ano – calcula um agente penitenciário que prefere não ser identificado.
O dinheiro que alimenta o grande comércio na Pics entra de forma legal. Cada visita tem o direito de levar R$ 150 por semana para um apenado. A estimativa dos agentes penitenciários é de que quase R$ 1 milhão tenha entrado na Pics no ano passado. Em tese, esse montante deveria utilizado na cantina, onde são vendidos lanches. Na realidade, boa parte do dinheiro serve para movimentar o esquema de extorsão: o preso que não é respeitado entre os demais precisa pagar taxas para não sofrer agressões ou ser morto, problema já admitido pela juíza Milene Rodrigues Fróes Dal Bó, responsável pelos processos de apenados nos dois presídios e no albergue de Caxias do Sul.
– Quem cai lá dentro precisa ter dinheiro até para dormir em uma cama. O negócio é organizado. Tem um cara para vender e um companheiro logo atrás com um caderno para anotar. A cobrança é feita pelos chefes de galeria (que é chamada de prefeitura). Os dias de visita (quarta-feira e domingo) são os dias da cobrança. Quem não paga em dia, recebe um "aviso" que é uma agressão leve. Depois começam as ameaças – relata um policial que atua nos muros da Pics.