Mais do que o alicerce de uma sociedade, a educação é a chave para um futuro em constante desenvolvimento, na opinião do professor António Sampaio da Nóvoa. Mas, assim como ocorre em outras áreas, o processo educacional passa por evoluções significativas. Para falar sobre o novo modelo de escola, projetado para ser realidade em 20 anos, e sobre o que é preciso para construir uma educação sólida, o reitor honorário da Universidade de Lisboa esteve em Caxias do Sul nesta semana. Na Faculdade Murialdo, palestrou principalmente a professores, público ao qual dedica boa parte de seus estudos, sendo autor-referência de obras na área da formação de docentes.
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Um dos intelectuais de maior circulação internacional no debate pedagógico atual, Nóvoa, aos 61 anos, também é doutor em Ciências da Educação e já visitou o Brasil inúmeras vezes. Ele acredita tanto na educação como peça essencial para a formação de uma sociedade que a levou como principal bandeira durante sua candidatura à presidência de Portugal neste ano. Ficou em segundo lugar, mas afirma que não desistiu de acreditar na evolução da população por meio do estudo.
Confira trechos da entrevista:
Pioneiro: O senhor veio a Caxias para falar sobre "Educação e educadores: viver o presente, construir o futuro". Por que esse assunto?
António Sampaio da Nóvoa: Porque ainda temos muitos projetos que precisam ser colocados em prática para que a educação evolua. Tem muita coisa que é dita há 100 anos, mas que não foi colocada em prática. Hoje, nem todas as crianças estão na escola e ainda não são todas as crianças que estão na escola e que aprendem. São coisas infinitamente mais simples do que chegar na lua, por exemplo. Não estou dizendo que são questões fáceis de resolver, mas temos que perceber que a educação do futuro é muito diferente da que a que temos hoje. A estrutura das escolas, o trabalho do professor, tudo isso precisa e será diferente.
O senhor diz que a escola vai mudar muito nos próximos 20 ou 30 anos. Que o modelo escolar fixo, fechado na sala, com um professor para um grupo de alunos, vai mudar. É essa diferença no ensino?
Sim. A escola do futuro não tem a mesma imagem dessa de agora, com uma sala com quadro negro, e 30 alunos sentados em cadeiras. A imagem da escola do século 21 é mais parecida com o ambiente de uma biblioteca: com três crianças trabalhando em um lado, cinco de outro, e um professor circulando para orientá-las, acompanhar os estudos. Esse novo tipo de escola será capaz de cumprir o que se quer hoje: que o colégio seja um lugar onde estão todas as crianças e que todas elas aprendam enquanto estiverem ali.
Esse conceito ainda parece distante... hoje estamos longe do ideal em educação?
Muito, infelizmente, mas já avançamos. Hoje muitas crianças estão na escola, muitos saíram da rua para ir para à escola, mas ainda não conseguimos fazer com que todas aprendam. Por que algumas aprendem a falar, mas nem todas aprendem a tabuada? Se tivéssemos uma escola mais inclusiva, seria diferente. Só vamos ter certeza de que todos vão aprender se respeitarmos a individualidade de cada criança. Nem todos aprendem da mesma maneira. Temos que trabalhar diferente com cada uma.
Existe uma semelhança entre o jeito que a educação é tratada no Brasil e em Portugal?
Os problemas da educação são iguais em todo o mundo, a diferença é que existem países que investiram mais em educação. Portugal investiu bastante, nossos professores são muito qualificados. O Brasil avançou nos últimos 20 anos, mas não fez tantos investimentos. Ainda há muito o que fazer. Os salários dos professores ainda são baixos e os níveis de formação dos docentes também. A falta de investimento a longo prazo torna os problemas do Brasil mais difíceis.
O que, então, deveria ser feito a curto prazo no Brasil?
O Brasil precisa desesperadamente de um compromisso forte com a educação, que todos peguem juntos para melhorar a educação. E esse compromisso tem que estar nas famílias, na política, nas universidades.