Apesar de a presença de moradores de rua na área central de Caxias do Sul não ser novidade, o cruzamento entre as ruas Garibaldi e a Ernesto Alves vem chamando a atenção. Uma espécie de comunidade, com 15 moradores de rua, passou a viver naquele trecho. Eles se instalaram há cerca de três meses e não pretendem sair do local.
– Ali tem o Postão, onde eles podem pedir dinheiro, tem segurança, o restaurante popular e o prato solidário às 14h30min, que é de graça. Ou seja, tem vários atrativos para que eles permaneçam por ali – diz Júlio Cezar Chaves, diretor do Pop Rua, ao explicar a a aglomeração histórica naquele ponto. As marquises de um prédio na esquina servem como abrigo para a chuva e a cerca de um terreno vazio facilita para que eles instalem uma espécie de barraca ao longo do dia. Sem banheiros à disposição, os conteineres de lixo são usados pelos moradores de rua sem qualquer cerimônia.
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O fato de permanecerem durante boa parte do dia, ingerindo bebidas alcoólicas e usando drogas está preocupando os moradores do entorno, que reclamam pela falta de segurança.
– Algumas pessoas do prédio onde moro já sofreram assaltos. Eles assaltam, ficam dois dias sumidos e depois reaparecem. Coagem as pessoas pedindo dinheiro, fumam crack a qualquer hora. Outro dia, o zelador disse que havia um casal transando na frente do nosso prédio – relata a moradora Franciele Bellini.
E os transtornos vão além. Brigas também são costumeiras na região. Na madrugada da última terça-feira, os moradores contam que dois moradores de rua foram esfaqueados.
Histórico
O problema com moradores de rua em Caxias do Sul se arrasta há anos e a quantidade de pessoas em situação vulnerável oscila bastante. Em junho deste ano eram 233 moradores de rua, segundo o Ministério do Desenvolvimento Social. Hoje são 240. Porém, o levantamento do Pop Rua aponta que há 190. Esta diferença se dá ao fato de eles serem itinerantes e alguns não estarem mais nas ruas. Fixos, de fato, seriam 60, segundo o Pop Rua.
A ajuda está sendo oferecida
O Centro Pop de Rua, unidade de média complexidade ligada à FAS, oferece ajuda constante aos moradores de rua. Segundo o diretor Júlio Cezar Chaves, o grupo que está na rua Garibaldi recebe o convite para deixar a rua diariamente. Entretanto, o Pop de Rua não pode fazer mais que isto. Aqueles que aceitam ajuda, são encaminhados para um centro de acolhimento, que pode ser a Casa de Passagem Miguel dos Santos, a Casa São Francisco ou o Albergue Municipal. Nestes estabelecimentos, eles passam por um período de reabilitação que pode durar até três meses.
A maioria destes moradores de rua são de fora de Caxias. Só na Garibaldi, há cinco que vieram de Porto Alegre. E todos são itinerantes: alguns retornam para casa por um tempo mas, devido ao consumo de drogas, acabam voltando para as ruas. A tendência é que, no verão, o grupo na Garibaldi se disperse, já que o movimento maior de pessoas no Litoral costuma atraí-los para lá.
'Estou na rua porque eu quero', diz um dos moradores
A reportagem abordou alguns moradores de rua na Garibaldi na última segunda-feira à noite. Havia cinco deitados embaixo de uma marquise. Com eles, havia colchões velhos, cobertores, travesseiros e algumas garrafas de refrigerante. Inicialmente, todos se negaram a conversar. Aos poucos, começaram a falar. Questionados sobre o motivo de estarem vivendo na rua, um deles, chamado de "baiano" pelos demais, respondeu que todos eram alcoólatras e justificou:
– Estou na rua porque eu quero. Não tenho vontade de sair.
O mais lúcido era um homem que aparentava ter 30 anos e tinha cabelos compridos. Ele recusou a falar seu nome. Contou apenas ter chegado do Paraná há dois anos. Segundo ele, existem dificuldades para quem está na rua:
– Tem muita opressão, preconceito, porque todo mundo acha que somos vagabundos. Os vigilantes batem em nós, muitas vezes. Mas fome a gente não passa, na medida do possível.
Sobre buscar uma casa de acolhimento, ele alegou que todas estão superlotadas. Além disso, existiria um outro problema para saírem das ruas.
– Lá (no Albergue) pode ficar três dias, mas tem que procurar um emprego. Só que aqui ninguém tem profissão. Para encontrar emprego, tem que ter qualificação e ninguém tem – afirmou o morador de rua.