Há quem diga que quem sofre abusos pelo companheiro, com quem muitas vezes divide a casa e a própria vida, não se recupera do trauma. Tratamentos podem auxiliar a amenizar a dor, mas é difícil esquecer o que aconteceu. Maristela Selong, 42 anos, hoje consegue falar sobre os 18 anos em que foi agredida pelo ex-marido, com quem teve dois filhos. Física e psicologicamente, sofreu sem conseguir buscar ajuda. Escondia o olho roxo dos vizinhos e mascarava a dor até para a mãe, que nunca soube que ela apanhava. Maristela só começou a dar a volta por cima quando foi internada com problemas de saúde, há seis anos, após emagrecer 20 quilos. A rápida perda de peso, acredita, foi resultado do sofrimento a que era submetida dentro de casa.
– Vivi 18 anos com um monstro. No hospital, o médico disse: "ou tu reage, ou morre". Cheguei em casa e pedi a separação. Meu ex-marido apontou um revólver para mim e disse que, então, eu não seria de mais ninguém. Ela atirou e consegui escapar. O tiro está lá ainda. Me dei conta de tudo que passava e resolvi dar um rumo novo para minha vida. Por inúmeras vezes, tive o revólver engatilhado na minha garganta. Estou viva por Deus. Nunca vou me recuperar. Dói falar, dói lembrar – revela.
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Depois do susto com o tiro, Maristela procurou a Delegacia para a Mulher e conseguiu uma medida protetiva. Mas afirma que nunca se sentiu protegida, mesmo recebendo suporte da Brigada Militar em vários momentos:
– Meu ex-marido foi tirado de casa, mas me sentia encurralada. Ele voltou para casa um dia, meses depois, e me ameaçou novamente. Fui morar em outra cidade, com medo que acontecesse o pior. A lei não te protege totalmente. Tinha a medida protetiva e continuava com medo. Não dá para gritar ao mundo que as mulheres têm uma lei, a gente continua vulnerável.
Há pouco mais de quatro anos, Maristela namora com Jair Boeira, 49. Ela conta que o início do relacionamento foi difícil, principalmente porque ela estava receosa com a reaproximação de um homem.
– Quando me separei, achei que não seria capaz de fazer mais nada na vida, de tanto que ele me chamava de "zero à esquerda". Comecei a costurar e achei um grande amor. Hoje, sei que casal é para andar lado a lado. A gente se acomoda naquela vida de agressões, mas um dia o barco precisa virar para vermos que há uma vida para ser vivida. Sou feliz novamente agora – garante.
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