A simplicidade em produzir tijolos reserva encantadoras e curiosas lembranças na vida do empresário Lodovino Galafassi, 81 anos, um dos poucos oleiros que ainda resiste na região de Caxias do Sul. Para quem imagina que os rústicos galpões favorecem um ritual alienado da realidade engana-se ao envolver-se num bate-papo com mestre Galafassi. Instalada em Farroupilha, no limite com Caxias do Sul, nas proximidades do Hotel Samuara, a olaria é uma referência de qualidade, reconhecida pelos construtores há 52 anos.
A experiência no ramo faz dele um autêntico mestre no assunto. A escolha da terra, modelagem do tijolos, secagem natural e cozimento em fornos requer muita sensibilidade combinada com as variáveis climáticas, coisas que Galafassi entende bem. Assim que os tijolos estão prontos para ir aos fornos, há o cuidado de se elevar a temperatura gradualmente, ensina o mestre. À noite, operários permanecem vigilantes, cuidando do fogo acesso. O processo demanda 48 horas, quando a temperatura chega a 900 graus. A partir daí, o lote de tijolos está prontos para ser resfriado. A olaria produz unidades de três, seis e 14 furos. Galafassi enfatiza que trabalha de sol a sol. É tarefa árdua, com percalços.
No início de junho, seis mil tijolos foram inutilizados pela forte geada. O frio intenso fez com que a umidade fosse bruscamente arrancada do tijolo em descanso nas prateleiras, formando uma crosta de gelo. Este efeito, torna o material seco demais, fácil de se esfarelar. O volume deteriorado representou meio dia de trabalho e prejuízo com energia elétrica. Foi um problema, mas nada que não desanimou o mestre.
Nos primórdios, Galafassi fazia a venda, a entrega e cobrança. Além disso, trabalhava no preparo da terra e no cuidado com os fornos. Hoje, o negócio está sob a administração do filho Gilmar, 56. O mestre afirma que nunca tirou férias. Sente-se orgulhoso de ter auxiliado nas edificações de centenas de casas e prédios. No entanto, mostra uma preocupação com o destino de sua olaria. Há uma dificuldade de encontrar mão de obra específica. No ano passado, foram deixados de produzir 300 mil peças.
Mesmo oferecendo moradias na imediação do trabalho, desempregados resistem e buscam ocupações em funções que exigem esforço físico mínimo. O preço do produto também não é dos melhores: uma unidade custa cerca de R$ 0,35. Na época, quando iniciou no ramo, ele conta que havia cerca de 40 empreendimentos do gênero na região de Farroupilha. A maioria já extinguiu as atividades. Galafassi não. Teve persistência. E enquanto tiver forças, resistirá.
Mestre ajudou a construir prédios históricos
A história de Galafassi no ramo da construção civil começou na década de 1950, na Olaria de Américo Tessari. Ele emociona-se ao relatar que produziu tijolos para edificar o Hotel Samuara e o Colégio Cabrini ( atual Campus 8 da UCS). Localizada na Linha Palmeiro, a olaria tinha como cotistas seu pai Arziro Galafassi, Fúlvio Oliva, Pedro Molon, Dario Granja Santana, Julio Menegazzi, Onélio Sgorla, Mário Didoné, Guido Horn, entre outros.
Por volta de 1957, mudou-se para a agricultura, onde dedicou-se ao cultivo de videiras, do qual era sócio da Cooperativa de Forqueta. No entanto, ele abdicou da lida rural com os prejuízos provocados por três chuvas de pedras e geadas. Mas teve uma ideia: constatou que propriedade reunia matéria-prima de qualidade e decidiu montar sua olaria. A experiência adquirida com Américo Tessari, e depois na Olaria Santana, foi fundamental para encorajar a construção de sua fábrica de tijolos. Ele também recorda que o Brasil entrou no regime militar em 31 de março de 1964. E foi neste dia histórico que inaugurou sua fábrica. Se para alguns brasileiros a ditadura militar causou inquietações e divergências políticas, para Galafassi foi um período de oportunidades e intenso trabalho. Houve, de fato, um propósito de se implantar um modelo de conforto na habitação urbana.
Desde então, Galafassi e o irmão Nelson procuraram investir em equipamentos para qualificar a produção e otimizar recursos. Uma escavadeira substituiu pás. A movimentação dos tijolos passou a utilizar prateleiras em trilhos. No mercado, conquistou fortes clientes na década de 1960. A emblemática Madezatti comprava tijolos para serem utilizados nos alicerces e banheiros de casas pré-fabricadas. Idorly Zatti, diretor da Madezatti, foi quem realizou as primeiras compras. Já na década de 1970, abasteceu a Construtora Tedesco, que construiu 23 prédios.