Apenas três bairros de Caxias do Sul concentram um quarto dos 70 assassinatos neste ano: Vila Ipê, Reolon e Planalto. Juntas, as três comunidades acumulam 18 mortes violentas, a maioria relacionada a disputas entre traficantes de drogas. Para as autoridades policiais, a constatação não é uma surpresa, pois os três bairros possuem histórico de violência. Para os líderes comunitários, porém, os números causam espanto.
O Reolon é o bairro que registrou os dois assassinatos mais recentes entre a noite de quinta-feira e a manhã de sexta-feira. Pessoas não identificadas executaram Deverson Carlos Souza, 29 anos, com um tiro de espingarda calibre 12, por volta das 22h30min, na Rua Angelin Francisco Spiandorello. Na manhã seguinte, Luis Cesar dos Santos, 47, foi encontrado morto numa cama de uma moradia da Rua Airton Rodrigues da Costa. Ele levou quatro tiros de revólver no abdômen. A relação entre os casos não está descartada. Com esses dois crimes, a comunidade já soma seis assassinatos neste ano.
O Planalto também acompanha esse crescimento _ são cinco casos no ano. O Vila Ipê lidera o ranking da violência, com outras sete mortes. Os três bairros guardam uma semelhança: não há testemunhas dispostas a falar. O medo dos moradores trava a investigação e apenas um caso está resolvido.
– A comunidade não costuma colaborar com a polícia. Por isso, são as investigações (nestes bairros) são mais difíceis e levam bastante tempo. Estas execuções relacionadas ao tráfico de drogas tem um prognóstico ruim de esclarecimento. Mesmo assim, sempre ficamos no aguardo de alguma denúncia que possa nos levar a um traficante e, por meio de uma investigação de tráfico, resolver um ou mais homicídios – afirma o delegado Rodrigo Duarte, titular da Delegacia de Homicídios e Desaparecidos (DHD).
Planalto
– Noite de 25 de abril - criminosos invadiram uma casa na Rua Natal Idalino Fadanelli e executaram Osmar Domingos Farias, 62 anos.z
– Tarde de 29 de junho - Claiton Menezes da Silva, 38, foi encontrado morto com dois tiros na Rua Fenice Pezzi Arioli.
–Noite de 30 de junho - Endil da Silva Rosa, 26, foi assassinado com dois tiros na cabeça na Rua Natal Idalino Fadanelli.
– Madrugada de 17 de julho - Um homem ainda não identificado foi encontrado com marcas de tiro no rosto numa casa na Rua Domingos Tronca. Ao lado do corpo, a polícia identificou pequenas porções de crack no local, que seria um ponto de consumo.
– Noite de 19 de julho - Edson Machado da Cruz, 35 anos, foi morto a tiros na Rua Francisco Boniatti. Um jovem de 19 anos foi identificado como autor do crime.
Reolon
– Madrugada de 1º de janeiro - Ademir Ireno Monteiro, 45, estava na frente de casa, na Rua Sady Antunes Souza, quando foi executado a tiros.
– Noite de 8 de abril - Marcos Antônio Bareta, 45, foi baleado na Avenida Martim Francisco Spiandorello.
– Noite de 1º de maio - Felipe Santos Oliveira, 18, foi encontrado com três tiros no rosto na Rua Luiza Pistori Mari.
– Manhã de 30 de junho - após desembarcar de um Peugeot e caminhar para um matagal com um conhecido, Robin Braga Schneider, 25, foi executado com três tiros na cabeça e no peito. O local do crime, próximo ao Arroio Tega, fica no limite com o loteamento Vale da Esperança
– Noite de 21 de julho - Deverson Carlos Souza, 29, foi morto com um tiro de espingarda Rua Angelin Francisco Spiandorello. Um suspeito do crime está identificado.
– Manhã de 22 de julho - Luis Cesar dos Santos é encontrado sem vida numa casa na Rua Airton Rodrigues da Costa.
Vila Ipê
– Tarde de 30 de março - William de Souza, 24, foi executado a tiros quando passava de motocicleta em frente ao posto de saúde do bairro.
– Manhã de 1º de abril - Gilmar Nunes da Silva, 24, pilotava uma motocicleta quando foi baleado na Rua dos Canários. O suspeito é um adolescente.z tarde de 19 de abril - Rodolfo Fernandes Costa, 30, foi morto a tiros e facadas na Rua dos Pardais. Um homem assumiu o crime.
– Noite de 2 de maio - Fabrício Fogaça Homem, 30, foi assassinado na Rua Dos Carpinteiros. O crime pode ter relação com desavenças.
– Madrugada de 13 de junho - Adriana Albuquerque Couto, 31, morreu com quatro tiros na cabeça. Ela era moradora de rua e dependente química.
– Noite de 28 de junho - Márcia Beatriz Poerner, 40, foi morta na Rua dos Pardais com um tiro na cabeça. Ao lado do corpo, havia dois pinos de crack com ela.
– Tarde de 10 de julho - Filipe Ramos da Silva, 16, estava com um grupo de amigos na Rua das Arapongas e foi morto por ocupantes de um Chevette.
Montes Claros
O Montes Claros é outro bairro que se tornou notório pelo elevado número de assassinatos nos últimos meses. Sete pessoas foram assassinadas entre agosto de 2015 e fevereiro de 2016. A maioria das mortes foi provocada por desavenças entre grupos rivais no tráfico de drogas.
'É algo difícil de entender'
Para os moradores do Reolon, é difícil entender o motivo de tantas mortes na comunidade. O presidente da associação do bairro, Normelio Antônio Zorzi, lamenta o fato de o bairro ser referência para fatos tristes.
_ Esta violência é algo que nos perguntamos bastante. Quando parece que está tudo tranquilo, aparece uma noite como esta que teve duas mortes. É algo difícil de entender e que assusta os moradores. Hoje (sexta-feira) foi um dia em que ninguém se sentia seguro. Mas, nós que moramos aqui, temos que enfrentar. Eu moro há 20 anos, criei meus quatro filhos e nunca tive problemas – comenta.
Apesar do tráfico impulsionar a violência em qualquer comunidade, a polícia não estabeleceu uma relação do comércio de droga com os assassinatos na comunidade.
– Nestes casos, diferentemente de outras regiões, não temos um mapeamento claro da relação com o tráfico – afirma o delegado Rodrigo Duarte.
Ao contrário do Reolon, a droga está evidente nos crimes do Planalto e do Vila Ipê , seja pela apreensão de entorpecentes na cena dos crimes ou no histórico das vítimas.
– O que existe são pequenos traficantes que, para ganhar comércio, invadem o território de outro. Assim, surgem confrontos que podem acabar em mortes. Por outro lado, há usuários que pegam uma grande quantidade de droga com o traficante para vender. Só que ele acaba vendendo tudo e ficando com o dinheiro ou consumindo toda a droga. Então, o traficante, para fins de exemplo, acaba executando este sujeito – relata o chefe da DHD.
Morador do Planalto há 43 anos e uma das lideranças da comunidade, Edison Borges afirma que o problema está abalando a estrutura do bairro.
– São jovens que estão sendo eliminados. Em muitos casos, são pessoas conhecidas e de famílias boas, mas que se perderam neste mundo da droga – lamenta.