Em tempos de muita chuva ocasionada pelas mudanças climáticas e com a umidade característica da Serra, sobretudo no inverno, produtores da região que utilizam uma técnica chamada plasticultura estão conseguindo reduzir as perdas nas plantações provocadas pelas intempéries. São sistemas de proteção com o uso do plástico, no alto da plantação ou até mesmo na terra, que ajudam a minimizar os danos em diferentes culturas.
Em decorrência da chuva do mês de maio, a região registrou mais de R$ 485 milhões de prejuízos no setor, que ainda estão sendo contabilizados nos municípios atingidos. O cenário de perdas, entretanto, não foi tão expressivo para produtores que contam com os hectares de plantio protegidos.
Em Monte Bérico, a cerca de 10 quilômetros do centro de Caxias do Sul, a propriedade do empresário Charles Venturin precisou expandir os atrativos para visitantes quando, em meio à pandemia da covid-19, o espaço aberto por entre a vegetação e as "uvas cobertas" começaram a atrair moradores que buscavam cenários além dos locais de isolamento social.
— Criamos esse espaço garden porque nós vendíamos uva, mas quando as pessoas começaram a vir comprar, elas viram a plasticultura e começaram a chamar de uva coberta. Aí essa curiosidade da tal uva coberta começou a se espalhar e muitos começaram a vir comprar a nossa uva. Eles nem nos chamavam de Venturin, eles chamavam a gente de uva coberta (risos). Aí começamos a abrir para as pessoas e perguntavam se vendíamos vinho, então começamos a oferecer sucos, vinhos, espumantes. Quando vimos, estávamos com tábuas de frios também e o negócio foi aumentando para receber o público, mas tudo começou com a tal uva coberta — conta Venturin.
A partir do aumento de visitantes, a propriedade começou a se adequar. Mesas, bancos, um deque coberto de frente para um pequeno lago e até mesmo um pedalinho de cisne são alguns dos itens que compõem a paisagem atual. A fama das "uvas cobertas" atraiu olhares de empresários e visitantes de cidades do Nordeste.
— Começamos a receber pessoas do Nordeste, que ficaram interessadas na nossa tecnologia, mas na verdade não é tão tecnológica, mas faz uma diferença enorme. Hoje a gente vende metade da nossa produção aqui no garden e o restante para a Ceasa, que distribui para algumas cidades da Serra. Não temos uma grande produção, não temos grandes pedidos, a nossa produção é mais familiar e artesanal, mas é de qualidade — garante o empresário.
O uso da plasticultura na propriedade começou a ser implementado em 1996, em apenas uma pequena parte de plantação, como teste. Atualmente, os cerca de 30 mil metros quadrados de plantio coberto pela estrutura de proteção, rendem em média cem toneladas de uva. O local cultiva uvas para vinho, como bordeaux, lorena e isabel, além de uvas de mesa.
Cultivo coberto
Não são apenas uvas que podem ser cultivadas sob a cobertura de plástico. Com materiais como madeira ou metal, que servem de base para a proteção, as estufas podem ser montadas de diferentes tamanhos, fornecendo praticidade para os produtores, que podem optar pelo formato mais viável para as propriedades.
De acordo com o empresário Ademir Franco, dono da Sabiá Coberturas Agrícolas, existem inúmeras possibilidades oferecidas pelas estufas. A partir do cultivo coberto, diferentes benefícios são vivenciados pelos produtores, como o aceleramento da produção e, por consequência, a colheita antecipada.
— A plasticultura é indicada para toda a linhas de frutas, como uva, morango, tomate, mirtilo, framboesa, pitaya, amora, assim como a linha de folhosas, como o alface, a rúcula, radite, tempero verde, entre outros. Com essa proteção da plasticultura, é possível aumentar o ciclo das plantações, fazendo com que elas produzam mais rápido. Dentro das estufas é possível adiantar em até 10 dias uma colheita de alface, por exemplo, então existe esse aceleramento, porque é trabalhado com o metabolismo da planta acelerado — conta Franco.
A partir da aceleração no desenvolvimento das safras, sob a proteção das estruturas plásticas, as plantas absorvem uma quantidade ideal de luz solar e calor, essenciais para o crescimento rápido e saudável. Esse ambiente controlado também estende a temporada de cultivo, permitindo múltiplas colheitas ao longo do ano e aumentando significativamente a produtividade por unidade de área.
— Ela trabalha com o metabolismo da planta normal, natural, ela não trabalha com estresse, então não é necessário o uso de adubo, assim como também não é necessário o uso de produtos químicos para que a planta chegue no resultado final. Ela se desenvolve de forma natural e sem sofrer estresse — explica Franco.
Microclima
Debaixo da estrutura de plástico, protegidas do contato direto do sol, granizo, vento, assim como da geada e da chuva, as plantas se desenvolvem em um microclima próprio. A partir disso, condições ideais são proporcionadas para o desenvolvimento das plantas. Esse ambiente controlado regula fatores como temperatura, umidade e luminosidade, essenciais para maximizar a produção agrícola em todas as estações do ano.
— Como embaixo da lona tem um microclima todo diferente, a gente teve que reaprender a trabalhar com a uva, porque a gente eliminou alguns problemas e alguns se criaram. Mas no meio de tudo isso a gente só teve benefícios, como uma uva de melhor qualidade, melhor padrão de baga, de cacho de uva e uvas mais doces. É um grande investimento para cobrir 30 mil hectares, mas é um investimento que acaba nos dando retorno e que com certeza vale a pena para não termos prejuízos — conta o empresário Venturin.
Com o microclima e a proteção do cultivo, há uma redução significativa, e muitas vezes eliminação, do uso de agrotóxicos nas propriedades. Com a criação de um microambiente estável, as plantas cultivadas sob plástico são naturalmente protegidas contra pragas e doenças.
— A planta ao ar livre corre riscos como a umidade, por exemplo, e por consequência a podridão. Quando não tem essa umidade para dar fungos e bactérias nessa planta, não tem motivo para que ela seja tratada, ou seja, não tem motivo para colocar defensivos químicos na planta ou ainda o uso pode ser reduzido — explica Franco.
Safra protegida
Além dos benefícios de aceleração no desenvolvimento do plantio, a propriedade de Angela Pizzinatto Romansin, 38 anos, e Jobson Antonio Benedetti, 44, no Desvio Machado, no interior de Farroupilha, não registrou perdas expressivas durante o período de chuva devido à proteção da safra nos hectares que estavam cobertos pela plasticultura.
— Eu acho que a solução para a agricultura e o cultivo de hortaliças, principalmente na Serra, é a plasticultura. É um investimento alto, mas, por exemplo, com todas as adversidades do excesso de chuva, o que a gente tinha de plantio sem a proteção foi perdido cerca de 80% da lavoura por causa da chuva e o que ficou não conseguimos aproveitar quase nada. Mas o que estava plantado na estufa protegida, não tivemos praticamente nada de perdas — conta Angela.
A área coberta na propriedade é de 4 mil metros quadrados, enquanto que a área sem proteção tem em torno de 2 mil metros. No local, fundado em meados de 2003, são cultivadas hortaliças como alfaces, brócolis, repolho, beterraba, morango e tomate. Além das estufas altas, o plantio no chão também é coberto pela plasticultura. Segundo a agricultora, a proteção do plantio no solo é para evitar ervas daninhas.
— Percebemos que trabalhar com a plasticultura vale muito a pena, porque, quando acontece alguma coisa como a chuva ou granizo, a gente tem poucas perdas. Quando isso acontece, e acaba destruindo plantações ao ar livre, como a nossa área descoberta, os produtos têm um valor agregado. Então, a gente consegue ganhar um pouco mais pelo que não foi destruído e suprir o que foi perdido — afirma a agricultora.
Tempo de duração
A técnica agrícola tem diferentes dimensões e uma durabilidade variável. Os filmes plásticos utilizados na plasticultura são projetados para durar um período que pode chegar a oito anos. De maneira geral, o plástico que cobre as estufas deve ser trocado após o período de uso recomendado para garantir a eficácia da técnica.
— Como temos difusores de luzes aditivos, por mais que o plástico acabe ficando sujo ao longo dos anos, a claridade vai continuar passando e chegando na quantidade que a planta precisa. Então, até o quarto, quinto ano, não precisa, por exemplo, fazer a lavagem deste material. O plástico bloqueia os raios que queimam e liberam só os raios de luz. É recomendado fazer a troca do plástico quando ele é rasgado, quando é atingido por algum fator climático ou quando ele atinge o prazo de durabilidade, para que a plasticultura em si continue tendo os benefícios para as plantações — explica Ademir Franco.
Com o uso da plasticultura nas propriedades, é possível observar o controle eficiente de ervas daninhas, a redução da evaporação da água do solo e a proteção contra intempéries climáticas extremas, proporcionando um ambiente de cultivo mais estável e previsível para os agricultores.
A proteção é uma ferramenta que pode aumentar a produtividade agrícola de forma responsável e sustentável. Com manejo correto e a substituição oportuna dos filmes plásticos, é possível ter resultados positivos em safras que podem ser novamente atingidas por outros fenômenos climáticos ao longo dos próximos anos.