Fortalecer a relevância histórica, cultural e as crenças da população negra nas escolas, além de apoiar a retomada do Carnaval com desfiles de escolas de samba e incentivar a criação de um fundo municipal estão entre as pautas da nova gestão do Conselho Municipal da Comunidade Negra (Comune) de Caxias do Sul. À frente da entidade estará a advogada Michele Xavier, 44 anos, que assume oficialmente nesta segunda-feira (13), após cerimônia na prefeitura. Ela substitui Antônio Jorge da Cunha, que liderou o conselho nos últimos anos e, agora, permanece como vice-presidente.
Próximo de completar 20 anos, o Comune foi criado por meio de lei em 18 de agosto de 2004 e é um órgão de assessoramento e fiscalização, cujo objetivo é formular diretrizes e promover atividades que visem a defesa dos direitos da comunidade negra e a eliminação das discriminações. Também está sob as atribuições do conselho assessorar o Executivo e desenvolver estudos, debates e pesquisas relativas à comunidade negra. São 18 integrantes, sendo nove deles do governo municipal e nove da sociedade civil.
— O Comune tem o papel de fiscalizar as políticas públicas e também fomentar, mostrando para o poder público o que está faltando, o que precisa melhorar — aponta Michele, que integra o conselho há cerca de dois anos.
No mês em que se celebra o Dia da Consciência Negra, Michele reforça que a discussão sobre as questões raciais não pode se restringir a um curto período do ano e deve ser fortalecida principalmente nas escolas, local que ela caracteriza como a "base" da sociedade.
— Toda pauta inclusiva precisa ser abordada todos os dias. Quando eu ensino religião, por exemplo, eu tenho que abordar todos os tipos, não a minha religião apenas ou a minha visão. Quando eu falo em história dentro da escola, eu tenho que contar tudo e não uma visão eurocêntrica. Aqui no Brasil, ensinamos que Santos Dumont é o pai da aviação, mas nos Estados Unidos eles dizem que são os irmãos Wright porque é bom para eles, é conveniente. Então, vemos que a história é contada sobre perspectivas. O problema é que a perspectiva negra nunca é apontada, a gente só conhece o povo negro, a história negra, sobre duas perspectivas, que é a da escravidão e a do Egito. Não temos outras abordagens — opina a advogada.
Quem é a nova presidente do Comune
Natural de São Gabriel, Michele se mudou para a Serra em busca de oportunidades de trabalho. Trabalhou com limpeza e na área estética antes de ingressar no curso de Direito na Universidade de Caxias do Sul (UCS). Foi nessa época que começou a se envolver com os movimentos estudantis, participando do Diretórios Acadêmico (DA) e do Diretório Central dos Estudantes (DCE), e também se interessou pelo feminismo. Michele é pós-graduada em direito das mulheres e direito antidiscriminatório.
A invisibilidade da mulher na sociedade, potencializada quando se trata da parcela negra deste público, é um dos temas que a advogada acredita que precisa evoluir, não só em Caxias do Sul, como em todo país.
— As mulheres precisam entender o quanto são força de trabalho, mesmo aquela mulher que está em casa cuidando dos filhos. Aliás, esse movimento de cuidar viabiliza todo o capital, todo o resto — acredita Michele, que completa:
— A mulher é invisibilizada e a mulher negra é ainda mais. Ela é a base de toda a pirâmide (social) e, com certeza, carrega todo todo mundo nas costas, porque está nos piores empregos, recebendo salários menores e pagando mais impostos.
Em abril deste ano, pelo Comune, a advogada começou a atender gratuitamente casos de racismo, gordofobia, violência doméstica, assédio sexual ou moral contra mulheres negras e intolerância religiosa. O serviço continua sendo oferecido. Informações podem ser obtidas pelo WhatsApp (54) 99988-8746.