A construção do aeroporto de Vila Oliva, em Caxias do Sul, promete ser um marco na história da cidade não apenas pelo volume financeiro exigido ou pelo tamanho do empreendimento. Tirar o complexo do papel também vai exigir ações cuidadosas do ponto de vista ambiental para garantir as obras e a operação com o mínimo impacto no ar, no solo, nos recursos hídricos e no próprio funcionamento do aeroporto.
A grandiosidade do trabalho — o maior projeto de construção de um aeroporto do zero na Secretaria de Aviação Civil do Ministério de Portos e Aeroportos — ajuda a explicar o tempo necessário para cumprir todos os trâmites que antecedem o início da movimentação das máquinas. Após a inclusão do terminal no Programa de Desenvolvimento da Aviação Regional do governo federal, o primeiro passo concreto, em 2012, foi elaborado o anteprojeto, entregue em 2016. O passo seguinte foi a realização do maior Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima) já realizado para um empreendimento na história de Caxias. Durante dois anos, a partir de 2018, técnicos da empresa caxiense Garden Projetos vasculharam a área de quase 443 hectares para identificar características de fauna, de flora, do solo e de recursos hídricos, entre outros dados.
Esses estudos basearam a emissão da licença ambiental prévia, que determinava regras para a elaboração do projeto de construção, e da licença de instalação, emitida em setembro pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) e que efetivamente autoriza o início das obras a partir de condicionantes de preservação.
Um dos pontos principais a serem observados para tirar a infraestrutura do papel diz respeito à remoção de árvores. Serão pelo menos 30.279 que precisam dar espaço ao aeroporto e que serão cortadas ou transplantadas — caso das espécies ameaçadas de extinção. Essa remoção, contudo, precisará vir acompanhada de compensação ambiental que, em parte, será realizada na própria área do empreendimento, já o aeroporto propriamente dito ocupará uma área de 226 hectares.
Conforme o diretor da Garden, Elton Leonardo Boldo, essa compensação ocorre gravando áreas de mata como floresta a ser preservada e também na recuperação de áreas degradadas. Esses espaços precisam ter as mesmas características da área que receberá as obras e o ideal é que fiquem em uma região próxima.
— Quando se tem um empreendimento de 400 hectares é um desafio porque são muitas questões envolvidas. Na nossa região, o mais impactante é o corte da vegetação. Nossa sorte é que a área (do aeroporto) é de lavoura, então em boa parte já não havia mais árvores. Pelo que poderia ser, de acordo com o tamanho do aeroporto, o número de árvores que precisam ser cortadas é até baixo — avalia Boldo.
Para a compensação, devem ser replantadas quase 17 mil mudas e demarcada área de preservação de quase 81 hectares. Uma área de vegetação nas proximidades da futura cabeceira norte da pista, dentro do terreno do aeroporto, já está reservada para preservação. Uma outra área é avaliada entre prefeitura e Estado. O município propõe a recuperação na área de Palanquinhos, em Criúva, enquanto o estado sugere uma área de preservação em Tainhas. Somente a compensação está estimada em R$ 1 milhão, segundo a secretária do Planejamento, Margarete Bender.
— Tem que ser um parque já cadastrado em âmbito de interesse nacional e estadual. Hoje o Palanquinhos é um parque bastante procurado a fins de turismo — avalia a secretária.
Fauna e recursos hídricos monitorados
Mexer com a vegetação impacta diretamente na fauna, que precisa ser constantemente monitorada. A recomendação da licença de instalação é que os animais sejam afugentados de forma natural para áreas próximas, mas, quando não for possível, deve ocorrer a realocação. Isso envolve inclusive peixes que vivem em banhados. As áreas de acúmulo de água terão que ser drenadas e aterradas para evitar a atração de aves, o que pode gerar risco à operação dos aviões.
— Isso envolve inclusive regiões do entorno, mas todos os banhados identificados acabam ficando dentro da área do aeroporto — observa Boldo.
Arroios e nascentes também precisam ser preservados e monitorados para evitar contaminação da água e lençóis freáticos. O Eia/Rima identificou seis nascentes dentro da área de construção. São pequenos canais que abastecem a bacia do arroio Piaí e não podem sofrer contaminação nem mesmo durante as obras, sob risco de impactar também o solo e os lençóis freáticos. A solução, nesses casos, é realizar uma espécie de "canalização" da nascente.
— Se escava, protege e se faz com a água que hoje está em cima da terra continue por baixo do solo. Eu preciso manter ela contribuindo com o lençol freático, mas tem que monitorar — explica Boldo.
Essas condições exigem, por exemplo, cuidados no manejo de combustíveis e necessidade de implantação de uma unidade de tratamento de efluentes já durante a construção. Além disso, a existência de um abrigo subterrâneo que pode ser de antigos povos indígenas na região de Vila Oliva demanda uma atenção especial para questões arqueológicas, embora os estudos não tenham encontrado nenhum vestígio na área do empreendimento.
Programas de preservação
Diante de tantos cuidados necessários, a estimativa é de que uma equipe de pelo menos cinco a sete profissionais se dedique exclusivamente às questões ambientais durante a construção do aeroporto. Eles serão responsáveis por coordenar 31 programas de preservação, dos quais boa parte será mantido depois que o aeroporto começar a funcionar.
São medidas que permitem conciliar a demanda por equipamento como um aeroporto com o ecossistema do entorno. E que envolvem apenas o aeroporto em si, sem considerar as vias de acesso, que terão licenciamento próprio.
— O impacto ambiental ocorre em todas as etapas, o que muda é o momento em que ele ocorre. Tem tudo para se ter uma obra tranquila, sem causar um impacto muito grande, porque impacto sempre há — finaliza Elton Boldo.
As 31 ações
- Programa de Auditoria Ambiental (PAA)
- Programa Ambiental de Construção (PAC)
- Programa de Gestão e Supervisão Ambiental (PGSA)
- Programa de Prevenção, Controle e Monitoramento de Processos Erosivos (PPCMPE)
- Programa de Controle e Monitoramento Geotécnico (PCMG)
- Programa de Gerenciamento de Áreas de Preservação Permanente e Áreas Ambientalmente Sensíveis (PGAPP)
- Programa de Intervenção, Supressão e Manejo Florestal (PISMF)
- Programa de Plantio Compensatório/ Reposição Florestal Obrigatória (PRFO)
- Programa de Compensação Ambiental (PCA)
- Projeto de Transplante Florestal e Monitoramento Vegetal (PTFMV)
- Programa de Realocação e Resgate de Flora (PRRF)
- Programa de Controle de Alterações nos Ecossistemas Terrestres (PCAET)
- Programa de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD)
- Programa de Paisagismo e Arborização (PPA)
- Programa de Educação Ambiental (PEA), incluindo aspectos de Educação Ambiental para usuários dos serviços do aeroporto no Programa de Educação Ambiental
- Programa de Proteção e Mitigação de Impactos a Fauna (PPMFI)
- Programa de Monitoramento da Fauna Terrestre e Bioindicadores (PMFTB) - Monitoramento de Rodovia
- Programa de Controle de Alterações nos Ecossistemas Terrestres (PCAET)
- Programa de Recuperação e Monitoramento de Passivos Ambientais (PRMPA)
- Programa de Comunicação Social (PCS), com inclusão de informações sobre o funcionamento do empreendimento, mudanças nas vias de acesso, órgãos fiscalizadores responsáveis, e criar um canal de contato para informações, sugestões e reclamações da comunidade
- Programa de Melhorias da Infraestrutura Viária de Acesso (PMIVA), incluindo ações de atenção e cuidado com a circulação de veículos nas vias de acesso ao aeroporto também durante a construção do empreendimento
- Projeto de Sinalização de Segurança Viária e Ambiental (PSSVA)
- Programa de Gerenciamento de Resíduos Sólidos e Efluentes (PGRSE)
- Plano de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC)
- Programa de Monitoramento da Qualidade da Água, Nível do Lençol Freático e Contaminação do Solo (PMQAS)
- Programa de Monitoramento de Emissão de Gases (PMEG)
- Programa de Levantamento, Monitoramento e Acompanhamento Arqueológico (PLMAA)
- Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR)
- Programa de Prevenção e Controle de Acidentes com Substâncias Perigosas (PPCASP)
- Plano de Ação de Emergências (PAE)
- Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO)