Uma estrutura digna em qualquer escola garante, em primeiro lugar, segurança à comunidade escolar e estimula os jovens à permanência nos estudos. Quem diz isso, entende do assunto: as diretoras de três escolas estaduais de Caxias do Sul que estão com problemas estruturais nos muros.
O Colégio Estadual Imigrante sofre com a queda do muro há quase cinco anos, enquanto alunos têm acesso restrito à quadra esportiva por risco de queda. Já o Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza convive há quase três anos com a angústia de uma estrutura que, cada dia mais, cede, expondo alunos e pedestres. A última a sofrer com o problema foi a Escola José Generosi, que teve a queda do muro da fachada no último dia 16, fazendo com que a direção mudasse toda a rotina escolar.
Quase cinco anos de espera
Quem passa pela Rua Professor Jerônimo Ferreira Porto, entre as ruas Antonio Degasperi e Professora Emília da Silva Bandeira, no bairro Bela Vista, tem receio de cruzar pela calçada do muro do Colégio Imigrante. Em fevereiro de 2019, a estrutura caiu e, desde então, um grande buraco, onde também desliza terra, é motivo de preocupação diária para a diretora da escola, Simone Comerlato.
Em julho deste ano, a situação parecia começar a se encaminhar, com o início da obra, pela empresa Inovare Design de Móveis, Construtora, Comércio e Serviços Diversos Ltda. Entretanto, agosto chegou e ninguém foi mais visto no local.
— Eles iniciaram as obras no dia 13 de julho, trabalharam o mês de julho, mais ou menos, e depois, em agosto e setembro, parou a obra, não tinha mais ninguém. Agora em outubro eles vieram ali pelo dia 10, trabalharam uns dois dias e não trabalharam mais. Simplesmente não tem mais ninguém na obra. Aliás, tem uma pessoa, um rapaz, que eu conversei quinta-feira (dia 19) e ele me disse que está aguardando a empresa chegar com as máquinas, com o material para fazer — relata a diretora.
O impasse com o muro impede que os alunos usufruam de uma quadra esportiva, que fica próxima à estrutura, impedindo, além da prática de esportes, de melhor acomodar os 1,3 mil alunos da instituição. Há também o grupo de escoteiros Baden Powell, que utilizava o espaço desde 1985, com pessoas de seis a 21 anos, que também não podem usar mais a quadra.
A reportagem esteve no local na segunda-feira (23), último dia do prazo dado pelo Ministério Público — que acompanha o caso desde o início — para que a empresa retornasse. A 4ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), também na segunda, notificou a empresa. À tarde, foi registrada uma movimentação no local. Segundo um funcionário, a empresa está com dificuldades para contratar mão de obra.
"Quem é que vai responder se acontecer uma tragédia?"
Quem utiliza a parada de ônibus da esquina da Avenida Júlio de Castilhos com a Rua Professora Maria D'Ávila Pinto, no bairro Cinquentenário, não sabe o perigo que corre, segundo a diretora do Cristóvão de Mendoza, Raquel Grazziotin. A calçada apresenta risco até para quem está em circulação. Basta olhar para cima para ver que, o que um dia foi uma rachadura, hoje é uma estrutura cedendo e projetada para a frente.
— O muro começou a apresentar problemas estruturais no fim de 2020. No início de 2021 foi solicitada a retirada das árvores. O Estado diz que teve uma empresa que se candidatou para a licitação, chegou a vir na escola, e no outro dia a CRE disse que não poderia ser mais ela porque faltava uma documentação. Eles alegam que a demora é pela questão da apresentação da documentação. Semana passada ainda questionei a CRE, que me disse que não havia novidade — desabafa a diretora.
O Cristóvão chegou a ser notificado pela Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU), através de uma denúncia da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), sobre a situação. A diretora conta que assinou o documento, mas que sua via ficou com a CRE. Raquel também afirma que, logo em seguida, a prefeitura chegou a colocar cavaletes para sinalizar pedestres sobre o risco. Entretanto, eles foram roubados logo em seguida.
— Ele (o muro) é bem perigoso. Com toda a chuva, ele já abriu bem mais do que era. Era uma fresta pequena, agora é bem maior, foi comentado até de colocar tapumes, mas ninguém me procurou para isso. Quem é que vai responder se acontecer uma tragédia? — questiona a diretora.
Como muitas outras escolas estaduais, além do muro, a Cristóvão de Mendoza está desde 2009 na fila para pequenos reparos, que hoje tornaram-se grandes obras. É o caso do auditório, o maior da cidade, que está fechado desde 2013, após a Lei Kiss, e se deteriora com o tempo, assim como o ginásio, que também precisa de reforma há anos.
Mais um muro que cai
Enquanto o Imigrante e o Cristóvão de Mendoza aguardam há anos pela reconstrução de seus muros em Caxias, a fila pela mesma demanda acabou aumentando neste mês. Na semana passada, o muro da José Generosi, em Forqueta, caiu. Conforme a diretora, Suzana Nilson de Barros, a estrutura teve uma movimentação em 2019, quando a instituição comunicou o fato ao Estado.
— Foi por volta das 18h, meia-hora depois da saída dos alunos. Estava a funcionária da limpeza e a nossa vice. Quando caiu o muro de vez, a gente solicitou uma vistoria, porque não sabemos qual era a extensão do estrago — começa a contar Suzana.
O que era ruim, acabou piorando. Além da queda da estrutura, existe a necessidade de realocar a caixa de entrada de luz, que ficava próxima ao muro. Engenheiros civil e elétrico interditaram parte da escola por risco de incêndio. O local, onde funciona a parte administrativa e a direção da escola, é de madeira e foi construída há 80 anos, de acordo com a diretora. As instalações também precisaram ser realocadas, como a sala dos professores, que atualmente está no laboratório de ciência.
— Foi verificado que a instalação elétrica do prédio não era a mais adequada. A interdição não foi consequência direta do desabamento do muro, mas com a vistoria, ele (o engenheiro elétrico) disse que qualquer dia ia pegar fogo — informa Suzana.
Enquanto a interdição e a queda do muro não têm perspectiva de solução, a obra para a nova caixa de luz, classificada como emergencial pela CRE, deve ocorrer nos próximos dias, segundo informado à diretora. Sobre o muro, os alunos são impedidos de irem ao parquinho da escola e a instituição tem adotado alternativas de saída para evitar movimentação próximo à estrutura desabada, na fachada da escola.
— Estamos reforçando os cuidados, né? De forma emergencial para que os alunos não passem mais lá pela frente. A gente faz sempre um questionamento: tu tem segurança num Tribunal de Justiça, em um presídio, mas dentro das escolas estaduais tu não tem essa garantia — declara a diretora.
Ações na Justiça
Tanto as situações do Imigrante quanto do Cristóvão estão com ações judicializadas. Conforme a promotora do Ministério Público, responsável pela Promotoria Regional da Educação, Simone Martini, trata-se de um problema estrutural da Secretaria Estadual da Educação (Seduc) devido aos processos burocráticos.
— Não é nem falta de vontade do Estado, a burocracia é tanta que só mexendo nessa estrutura para agilizar os processos. Qual é a proposta de alteração dessa estrutura que não vai para frente? — analisa Simone.
Em relação às multas determinadas ao Estado pelo não cumprimento das demandas, Simone diz que a própria Justiça não consegue configurar se há, de fato, descumprimento, pois o governo justifica que as empresas licitadas abandonam e retomam as obras. A promotora destaca que, no processo, toda a obra de reforma do Cristóvão deveria ter ficado pronta no início deste ano. De acordo com a promotora, o programa Mediar, do Ministério Público, está tentando intervir na situação. No caso do Imigrante, a liminar colocou como pena R$ 1 mil por dia, limitada a 30 dias, mas que ainda não está valendo.
O que diz o Estado
- Cristóvão de Mendoza: "Atualmente está em contratação da empresa para reconstrução do muro de contenção e Reforma do auditório e ginásio; plano de prevenção e proteção de combate a incêndio PPCI e reforma elétrica do auditório. Ocorrerá também a reforma dos blocos A, B e C e ampliação/construção de refeitório". Não foram informados os prazos.
- José Generosi: "Será removido o muro existente junto a Rua José Guerra, no trecho que vai do portão até a esquina com a Rua Severino Generosi. Serão removidos e recolocados sobre a cortina de concreto a ser executada os alambrados e gradis metálicos existentes. Parte da pavimentação interna ao pátio será previamente removida e refeita para permitir a remoção de terra necessária à execução da base da cortina. Essa demanda está em validação e, após, serão enviadas para a seleção de empresas". Não foram informados os prazos.
- Colégio Imigrante: "A empresa após reunião acordou em retomas os serviços e não parar até a conclusão. Esta semana retomaram os serviços. Estamos monitorando diariamente".
Nesta quarta-feira (25), o governo do Estado se manifestou, por meio de uma nota conjunta das secretarias de Obras, Educação e Governança, afirmando que todas as obras em escolas públicas devem ser feitas seguindo as normas da Lei de Licitações e que vem fazendo melhorias nos fluxos de contratação de obras escolares, com menos etapas e entraves burocráticos.