A Associação Farroupilhense de Produtores de Vinhos, Espumantes, Sucos e Derivados (Afavin) é contra o uso do inseticida fipronil em parreiras. A prática pode estar relacionada com a morte de abelhas registrada recentemente em ao menos duas propriedades de Farroupilha. Em setembro, dois apicultores encontraram milhares de abelhas mortas no interior do município.
O ingrediente ativo fipronil, que está muito associado à mortandade de abelhas, foi proibido no Rio Grande do Sul para aplicação na modalidade aérea. Contudo, segundo o governo do Estado, ele ainda é autorizado para tratamento de sementes e para controle de formigas cortadeiras. Ou seja, pode ser usado diretamente nas plantas.
Nestes dois casos mais recentes há suspeita de crime ambiental, com o uso irregular do inseticida, com pulverização para o controle das formigas, especialmente, nos parreiras de uva. O diretor Técnico da Afavin, João Carlos Taffarel, aponta que alguns produtores abusam do uso do fipronil nas aplicações aéreas, sendo que este tipo de utilização é proibido. Taffarel ressalta que os órgãos fiscalizadores devem investigar no entorno das propriedades onde as abelhas morreram:
— Da parte técnica da Afavin, no nosso entendimento, o uso indiscriminado de inseticidas, primeiro proibidos e segundo sem controle, é uma prática que nós não compactuamos de forma alguma, devido ao grande efeito e estrago que ocasiona, além da morte de outros insetos, a contaminação dos mananciais de águas superficiais — ressalta ele.
O caso é investigado pela Polícia Civil e também foi levado ao conhecimento da secretaria do Meio Ambiente de Farroupilha em busca de respostas. A Federação Apícola do Estado do Rio Grande do Sul também garante que irá acionar o Ministério Público (MP) para apurar a situação. Até o momento, o MP não tem conhecimento oficial do assunto.
Especialista afirma que o inseticida fipronil não é recomendado para uso na fruticultura
O pesquisador em entomologia (estudo dos insetos) da Embrapa Uva e Vinho, Marcos Botton, não acompanhou o caso de Farroupilha pessoalmente, mas confirma que o produto é um dos causadores de morte de abelhas. Ele também reitera que não há autorização de uso do fipronil pulverizado. Além disso, o especialista frisa que o inseticida não é recomendado para uso na fruticultura.
— Se você procurar o rótulo da bula do fipronil em pulverização foliar, não há nenhuma indicação de uso dele na fruticultura, em nenhuma planta frutífera. O que existe é uma formulação em grânulos, que é na verdade uma isca para formigas cortadeiras que você utiliza na forma de isca tóxica. Aí sim há uma recomendação genérica de uso de fipronil na forma de iscas tóxicas. Essa formulação dificilmente vai ter algum efeito secundário sobre abelhas.
Como proteger as abelhas
Coordenadora Executiva do Observatório de Abelhas do Brasil (projeto Mapa/Embrapa Meio Ambiente), a bióloga e doutora em zoologia, Betina Blochtein, afirma que para se confirmar a causa da intoxicação é necessária uma avaliação feita por técnicos da Inspetoria Veterinária e a análise da presença de agrotóxicos no material coletado. Mesmo assim, ela explica que o quadro de intoxicação aguda é característico de contato com agrotóxico, principalmente inseticidas.
— Esse cenário com as abelhas mortas, em massa, dentro e em frente as colmeias é típico de intoxicação por agrotóxicos, principalmente inseticidas. Não há outra causa conhecida, pelo menos até o momento, que pode provocar um quadro como este.
Ela orienta como os apicultores podem proteger as colmeias:
— Eles devem cadastrar as abelhas na Inspetoria Veterinária do seu município, para facilitar o atendimento em caso de mortandade. Outra medida é informar os agricultores vizinhos sobre a presença de abelhas na área e sobre os riscos do uso de inseticidas
Já o pesquisador em entomologia (estudo dos insetos) da Embrapa Uva e Vinho, Marcos Botton, aponta que, se as abelhas morreram em função do uso de inseticidas, o manejo das formigas em parreirais próximos precisa ser modificado. Ele ressalta que a melhor época é após a colheita das videiras, entre março ou abril, por ser uma época em que as formigas têm menos quantidade de alimento e aceitam mais facilmente as iscas tóxicas.
Conforme ele, outro aspecto é se os produtores conseguem identificar os ninhos das formigas cortadeiras para que apliquem os produtos diretamente no ninho, e não em pulverização foliar.
— Tem que melhorar esse manejo das formigas cortadeiras. A gente sabe que não é uma prática fácil, dá um pouco mais de trabalho, mas assim, em último caso, praticamente a gente não fala em aplicações foliais de inseticidas para o controle de formigas cortadeiras — destaca Botton.
Relembre o caso
Morador de Caxias do Sul, Francisco Guilherme Perotti, 73 anos, cria abelhas na localidade de São Roque, em Farroupilha. Ele perdeu mais de 30 caixas de insetos em setembro deste ano. Ainda abalado, ele relata que chegou na propriedade do cunhado onde está a produção e, em 17 de setembro, mais da metade das abelhas haviam morrido.
Outro agricultor, Oneide Gandolfi, 63, mora na Linha São Miguel, no interior de Farroupilha, e somente neste ano já perdeu mais de 50 colmeias. Ele salienta que percebeu as mortes em agosto, sendo que em setembro elas se intensificaram. O produtor também acredita que as abelhas foram atingidas por veneno, usado ilegalmente para matar formigas. Em cada caixa, há cerca de 5 mil abelhas. Ou seja, cerca de 250 mil insetos morreram apenas na propriedade dele.