Maior barragem e principal obra de saneamento já feita em Caxias do Sul, o Sistema Marrecas é feito de superlativos. São 215 hectares de área alagada no distrito de Vila Seca, onde 33 bilhões de litros de água são contidos por uma barragem de 60 metros de altura e 300 metros de largura, cuja construção demandou 1,1 milhão de toneladas de concreto. Em contraste com números tão expressivos, o monitoramento da barragem se utiliza de métodos minuciosos para medir milimétricas movimentações na estrutura, a fim de dar a certeza de que tudo corre bem com o sistema que leva água a milhares de famílias caxienses.
No início da semana, cruzamos os portões de acesso às galerias onde estão instalados equipamentos que dão o diagnóstico completo da barragem. São túneis que permitem caminhar por dentro da estrutura, fundamentais para verificar se a pressão exercida do enorme volume de água está provocando algum deslocamento na estrutura de concreto, se alguma fissura foi aberta ou se a vazão de água está dentro do volume previsto. Extensômetros e medidores triortogonais de juntas, por exemplo, são equipamentos cujas funções se complementam, uma vez que o surgimento de um número discrepante numa medição pode ser entendido como nada além de um erro na própria medição - se nenhuma outra leitura acusar o mesmo problema.
Por dentro da barragem também há escadas que levam até uma saída por onde se pode chegar aos degraus de concreto que formam a parte externa da barragem, ao longo dos seus 60 metros de altura. Estes degraus contêm canaletas que ajudam a espalhar parte da água que passa pelo vertedouro, onde se forma uma espécie de cascata para jorrar a água excedente no reservatório. De tempos em tempos é preciso fazer a limpeza das canaletas e também verificar o surgimento de possíveis rachaduras.
Não há servidores que trabalhem de forma permanente nestes túneis, onde as medições presenciais são feitas a cada três meses, em média. Boa parte dos dados colhidos pelos sistemas de monitoramento pode ser conferida por um aplicativo instalado no celular dos servidores do Serviço Autônomo Municipal de Águas e Esgoto, o Samae, órgão responsável pelos sistemas de barramento da cidade.
— Por conta da localização mais próxima da área urbana, o sistema Dal Bó é o que demanda cuidados mais recorrentes, pelo impacto que um eventual alagamento provocaria junto a famílias que residem no perímetro — destaca o engenheiro civil e superintendente de Planejamento e Obras do Samae, Gerson Panarotto, que conduziu a visita à barragem.
Custeado com a ajuda de recursos do PAC do governo de Dilma Rousseff, e inaugurado em 2012 durante a gestão do prefeito José Ivo Sartori, a barragem no arroio Marrecas teve seus primeiros estudos feitos ainda na década de 1960. Naquela época já se previa que, em 50 anos, o crescimento demográfico demandaria um novo manancial para dar conta de abastecer a população. Não apenas a previsão se confirmou, como o aumento obrigou a acelerar a construção da barragem, que serviu principalmente para aliviar os demais sistemas em funcionamento, como as bacias do Faxinal, Dal Bó, Maestra e Samuara.
Com o início da operação do Marrecas, em 2014, o Samae estima que apenas daqui a 20 anos Caxias possa precisar de um novo manancial, e para isso já se avalia três possíveis locais para se fazer a próxima barragem. A região de Criúva, onde passa o rio Sepultura, desponta como a mais provável. Uma outra possibilidade seria a região da Mulada, porém a distância maior da cidade demandaria um custo maior para o bombeamento da água até a Estação de Tratamento. Os primeiros estudos, já em andamento, porém ainda em fase embrionária, são de impacto ambiental e de propriedades na região. São os dois principais fatores para viabilizar a construção de uma barragem, do ponto de vista da responsabilidade ecológica e econômica.
— A diminuição do ritmo de crescimento demográfico verificada no último Censo do IBGE nos dá uma tranquilidade maior de manter a estimativa ou até acreditar que ganharemos mais alguns anos até que haja a necessidade de ter um novo sistema. Dessa forma os estudos podem ser feitos com mais tempo e tranquilidade — aponta Panarotto.
A fim de garantir ainda mais proteção para as barragens da cidade, a equipe técnica do Samae trabalha desde 2021 no desenvolvimento do Plano de Segurança de Barragens, que atende a uma legislação nacional e está em fase de conclusão. O investimento por parte da autarquia ultrapassou R$ 860 mil e contemplou todas as 10 barragens do município, inclusive três que estão desativadas.
Tal qual se faz em simulações de incêndio, para elaborar o plano foram realizados estudos de ruptura hipotética, modelagem da onda ocasionada pela ruptura, definição de procedimentos de monitoramento e definição de procedimentos em caso de risco de rompimento, dentre outros. Rompimentos de barragem, afinal, podem provocar graves danos ambientais, como os que ocorreram em Mariana e Brumadinho, ambos em Minas Gerais. De acordo com estudos recentes, cerca de 200 barragens convivem com risco de rompimento, sendo que um milhão de pessoas vivem próximas a estas áreas e convivem com o medo de desastres.
— A cultura do monitoramento das barragens é algo que não havia antigamente, mas que hoje está muito presente e se faz necessária. Todas as vistorias pelas quais passamos apontam que as barragens de Caxias foram muito bem feitas, inclusive a empresa paulista contratada para executar o nosso Plano de Segurança — atesta Gerson Panarotto.
A BARRAGEM
Início dos estudos: 1966
Início da obra: 2006
Custo: R$ 250 milhões
Capacidade: 33 bilhões de litros de água
Vazão: 900 litros de água corrente por segundo
Extensão: 835 metros (400 metros de terra e o restante em concreto)
Área alagada: 215 hectares
População beneficiada: 250 mil pessoas, atendendo aos bairros das zonas Norte e Nordeste de Caxias do Sul
- Inaugurado em dezembro de 2012, o Sistema de Abastecimento de Água Marrecas é composto por barragem, estação de bombeamento de água bruta, estação de tratamento de água, adutora de água tratada e reservatório de chegada.
- Para compensação ambiental, foi adquirida uma área de 400 hectares de mata no entorno e foi feito o plantio de cerca de 30 mil mudas nativas.