O juiz Carlos Eduardo Lima Pinto, da Vara Judicial da Comarca de São Francisco de Paula, anulou uma portaria emitida pelo governo do Estado que embasou o edital de concessão do Parque Estadual do Tainhas, na Serra, para a iniciativa privada. O despacho foi publicado na terça-feira (13) e torna sem efeito a portaria nº 52 de 30 de março de 2022 que alterava o plano de manejo do parque estadual na Serra. A decisão pode impactar no leilão, realizado em agosto e homologado na semana passada, que passaria a gestão do local para uma empresa do Rio de Janeiro.
A ação na justiça foi movida em agosto por Celso Ferrareze, proprietário de uma área rural em São Francisco de Paula, que alega que o terreno particular foi inserido a partir do plano de manejo dentro do parque do Tainhas e, portanto, de responsabilidade do Estado. A área abrigava um camping, mas que está desativado. A interrupção ocorreu porque há uma outra ação na Justiça que questiona quem é o proprietário do espaço.
Para conceder o espaço para a iniciativa privada, o governo do Rio Grande do Sul publicou uma portaria que alterou o plano de manejo do local, que é um documento técnico que estabelece o zoneamento e as normas que norteiam o uso do espaço. O proprietário afirmou, no processo, que a alteração lhe causou prejuízos porque a portaria limitou o uso da sua propriedade, ou seja, incluiu a área no pacote. Conforme o plano de manejo previsto na portaria em discussão, a área do camping está em uma zona conflitante, mas que deveria ser recuperada.
No despacho, o juiz reconheceu que não houve, por parte do Estado, a realização de estudos necessários para a alteração do plano de manejo no local. Ainda conforme a decisão, Pinto destaca que “está suficientemente comprovado que as alterações no plano de manejo foram feitas às pressas e sem aprofundado embasamento técnico, lesando fatalmente a propriedade do autor”.
A ação pedia, além da anulação da portaria, a nulidade do leilão que concedeu o parque à iniciativa privada. Entretanto, o despacho do juiz reconhece apenas a suspensão dos efeitos da portaria nº 52 e não específica o edital de concessão. O advogado Monir Ferranti, que representa Ferrareze, vai pedir novamente que o leilão que concedeu o espaço seja anulado. O escritório de advocacia afirmou que comunicou o consórcio Novo Caracol, liderado pela Iter Parques, vencedor do leilão, para que não assine o contrato com o Estado devido ao impasse. O consórcio nega o recebimento do comunicado.
— A decisão deixa claro que o processo (edital de concessão) foi feito à revelia, de forma célere e sem a observância de requisitos legais, que o Judiciário resolveu suspender a portaria. Precisou uma provocação nossa porque violava o direito de propriedade do nosso cliente — afirma.
A assessoria de imprensa do consórcio Novo Caracol informou que não recebeu notificação sobre a ação em questão e ressaltou que só poderá se posicionar a respeito depois de conseguir analisar todo o processo.
Estado diz que área não integra a concessão
A área alvo da disputa é uma ilha do Rio Tainhas onde funcionou até o ano passado o camping Passo da Ilha. Conforme o secretário executivo da Secretaria de Parcerias do Estado, Marcelo Spilki, o Piratini pede a reintegração de posse da área na Justiça a partir do entendimento de que ilhas fluviais são, por essência, propriedade do Estado.
A desocupação da área ocorreu quando o Estado ingressou com um pedido de liminar para acelerar uma definição a respeito do processo. A decisão acabou negada, mas ainda assim o responsável encerrou as atividades do camping na ilha.
— Ele tem uma área anexa e juntou parte da área ao parque. O que o Rio Grande do Sul alega é que aquilo é uma ilha fluvial, do Estado. Isso está na Constituição. Não só existe a reintegração de posse como houve várias fiscalizações por danos ao meio ambiente. Os banheiros não tinham canalização de esgoto e as construções tinham risco de incêndio em área de preservação — observa Spilki.
O secretário também contesta a decisão judicial por mencionar que o Estado teve negada a reintegração de posse; a negativa foi apenas de uma liminar para acelerar os trâmites. Além disso, segundo ele, como a questão judicial não estava resolvida, o Estado optou por não incluir a ilha na área concedida. Por conta disso, o entendimento é de que a suspensão da portaria que estabelece o plano de manejo não interfira no repasse do parque à iniciativa privada.
— Claro que existe uma discussão jurídica, mas me parece que isso não tranca de forma nenhuma o processo para assinatura do contrato — destaca.
Com relação ao plano de manejo em si, o secretário afirma que os estudos ocorreram de forma paralela aos trâmites de concessão com o objetivo de atualizar as regras de uso. O processo contou com reuniões, participação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, reuniões e discussões com o conselho do parque.
— Tudo está documentado. Temos convicção de que tudo que foi feito ali seguiu a legislação. Se tivesse sido dada oportunidade para o Estado se manifestar antes, a liminar não teria sido dada — acredita Spilki.
O Estado prepara recurso para contestar a decisão referente ao plano de manejo. Já com relação à ilha, não se descarta incluí-la na área concedida caso no futuro a Justiça decida que ela de fato pertence ao Estado. Para isso, porém, seriam necessários estudos para reequilíbrio de contrato.
As concessões
Com extensão de mais de seis mil hectares, o território do Parque do Tainhas está distribuído nos municípios de Jaquirana, São Francisco de Paula e Cambará do Sul. O espaço faz parte, com o Parque Estadual do Caracol, em Canela, das primeiras áreas administradas pelo Estado a serem concedidas para a iniciativa privada. Na última sexta-feira (8), o leilão realizado em agosto foi homologado pelo Estado.
O consórcio Novo Caracol, liderado pela Iter Parques, será o novo administrador dos dois locais na Serra. É a mesma empresa responsável pelo bondinho do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro. O aval publicado na sexta-feira deu início ao prazo de 60 dias para assinatura do contrato.