Além dos parques e eventos temáticos, a turística Gramado, na Serra, quer ser lembrada também pelo pioneirismo ao desestimular a distribuição gratuita de sacolas plásticas para os clientes em supermercados e demais estabelecimentos comerciais. Um projeto de lei aprovado nesta semana pela Câmara de Vereadores de Gramado prevê que supermercados e demais estabelecimentos incentivem e substituam o uso de sacolas plásticas, incluindo as versões biodegradáveis, por sacolas reutilizáveis, sacos e sacolas de papel. Se aprovada pelo prefeito Nestor Tissot (PP), a proposta passa a vigorar a partir de 8 de dezembro deste ano.
A proposta de desestimular o uso das sacolas em Gramado começou a ser discutida em 2020. Na época, os vereadores aprovaram o projeto de lei que previa a proibição à distribuição de sacolas plásticas em estabelecimentos comerciais, mas permitia as versões biodegradáveis do acessório. Essa lei, de autoria dos vereadores Renan Sartori (MDB) e Professor Daniel (PT), entraria em vigor um ano e meio após sancionada pelo Executivo, período considerado necessário para adaptação dos comerciantes e para que a prefeitura realizasse campanhas educativas com a comunidade para incentivar o uso de sacolas retornáveis.
Esse prazo encerrou em junho do ano passado, mas foi prorrogado em 12 meses devido à pandemia, período que se encerraria agora, na metade de 2022. Entretanto, uma modificação de autoria dos autores do projeto aprovada nesta semana pelo Legislativo de Gramado determinava também a proibição das sacolas biodegradáveis, o que não estava previsto no texto original, aprovado em 2020. Além da alteração no texto, a nova lei prevê que as regras entram em vigor a partir de 8 de dezembro deste ano, estendendo o prazo para adaptação dos comerciantes e moradores do município da Serra.
Um dos autores da proposta, vereador Renan Sartori, justificou que a proposta busca reduzir o impacto do plástico no meio ambiente e estimular uma mudança de comportamento na comunidade para que priorize sacolas retornáveis e não a sacola plástica. Ainda segundo ele, outras cidades adotaram medida semelhante e que esse regramento será cada vez mais difundido em outros municípios do país nos próximos anos.
Ainda em abril, os vereadores autores da proposta, juntamente com a Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Gramado, promoveram uma reunião com as entidades da região na Câmara para abordar algumas dúvidas em relação à lei. Na ocasião, a principal demanda apontada foi em relação ao plástico biodegradável, o qual também é muito nocivo e poluente à natureza:
— Quando chegamos perto da aplicação da lei, na metade deste ano, começamos um novo debate com a comunidade. Ouvimos sindicatos, supermercados e prefeitura. Sabemos que é polêmica e gera uma mudança de hábito, o que acaba sendo conflituoso. A partir do debate, entendemos que poderíamos melhorar a lei para que ela, quando aplicada fosse, se tornasse mais útil ainda e incluísse também as sacolas biodegradáveis, que estavam permitidas segundo a lei aprovada em 2020 — explica o parlamentar.
Com menos plástico circulando, segundo Sartori, menos lixo é produzido na cidade.
— O interesse em propor essa lei foi o nosso engajamento com o meio ambiente. A gente entende que somos protagonistas de uma agenda que, automaticamente, vai chegar em mais cidades e em níveis federais. Existem compromissos adotados com a Organização das Nações Unidas (ONU) que prevê, até 2030, diminuir o uso do plástico e reduzir a produção de lixo — afirma.
O projeto proíbe a distribuição gratuita de sacolas, mas permite que o estabelecimento comercialize esse acessório. O descumprimento desta lei, caso aprovada, poderá provocar multa de R$ 1 mil por infração ao estabelecimento. Nos casos de reincidência, o valor da multa será aplicado em dobro. A partir da terceira notificação por infração, o alvará de licença do estabelecimento poderá ser cassado.
"Lei para que repensem seus atos", afirma secretária do Meio Ambiente
Em entrevista nesta quarta-feira (3) ao programa Gaúcha Hoje, da Gaúcha Serra, a secretária-adjunta do Meio Ambiente de Gramado, Cristine Steffens, disse que as sacolas biodegradáveis também prejudicam a natureza quando descartadas de maneira incorreta. Por isso, o Executivo entendia, desde as primeiras discussões da lei, que fosse necessário proibir o uso de qualquer tipo de sacola plástica.
— A ideia dessa lei é, justamente, fazer com que as pessoas repensem os seus atos, repensem sobre a importância de estar utilizando outro tipo de sacola e não mais essa que é usada tradicionalmente em supermercados. A reciclagem dessa sacola é difícil porque ela acaba se misturando com o lixo orgânico e, para a reciclagem, acaba ficando mais complexa e difícil de fazer acontecer. É reduzir o consumo e incentivar que as pessoas já levem consigo — explica.
Ela afirma ainda que o município implementará um programa de conscientização, principalmente nas escolas da cidade. Um desafio, segundo ela, é provocar os turistas que chegam a Gramado a também se adaptarem ao regramento.
— Estamos alinhando com algumas entidades para a criação de um programa voltado para esse turista. Para que os hotéis avisem, em seus canais, dessa nova postura do município de Gramado. Essa lei é uma das ferramentas que temos para conseguir melhorar a nossa questão de separação do lixo e outros pontos de sustentabilidade, porque somos vitrine para o país inteiro — avalia.
Ouça a entrevista completa da secretária clicando no player abaixo:
Moradores são favoráveis e procuram alternativas
Como a proposta de proibir o uso de sacolas plásticas nos supermercados é discutida há pelo menos dois anos na cidade, quem mora em Gramado tem procurado se adaptar ao jeito de transportar as mercadorias no caminho entre a casa e o supermercado.
Vindos de Brasília e moradores da Serra há dois meses, o casal Susane Santos e Daniel de Assis usam um carrinho de mão, forrado com tecido, para transportar as compras. Segundo eles, na capital federal, o uso de sacolas retornáveis é estimulado em supermercados.
— Estávamos acostumados a ter o nosso próprio meio de levar as compras para casa quando morávamos em Brasília. Não usamos sacolas plásticas há bastante tempo e colocamos os produtos dentro do carrinho, que é muito prático e entra bastante coisas — afirma ele, que trabalha como assistente administrativo.
Susane entende que a medida reduz a produção de lixo.
— Acho muito importante pensar no meio ambiente e concordo com essa lei. Muitas vezes acabamos pegando mais do que precisa e jogando no lixo.
A artesã Lurdes Pimmel costuma usar uma sacola retornável para as compras da casa. Nesta quarta (3), quando saía de um supermercado de Gramado, ela carregava uma única sacola plástica.
— É porque estou levando carne e, se colocar na sacola de pano, vai molhar. Só por isso. Mas sempre tenho comigo a minha sacola, que é grande, e bastante prática — ensina ela, que relembrou que, no passado, era comum os supermercados usarem apenas sacos de papel como opção para o cliente levar as compras.
Adeptas de caixas de papelão como substitutas das sacolas plásticas, as irmãs Marili Maria Lovato, 54 anos, e Marília Cavichion, 34, também observam benefícios ao optar por este modo de transportar as compras.
— A caixa é melhor, cabe mais coisas e se ajusta melhor no carro — afirma Marília.
Para Marili, cuidar do meio ambiente é uma questão de saúde.
— Está na hora das pessoas se conscientizarem porque precisamos ter atenção ao meio ambiente. A qualidade de vida passa por isso — opina.
Na visão da corretora de imóveis Sinara Schmidt, a proibição da distribuição gratuita de sacolas plásticas é positiva, mas precisa de adaptação da comunidade.
— Acredito que vai ajudar muito, mas vai levar um tempo até o povo se adaptar. No início pode dificultar para a pessoa que saiu de casa, resolveu passar no mercado e está sem a sua sacola — afirma ela.
Proprietário de mercado vê economia nos custos e Sindilojas quer debater
Há 13 anos administrando um supermercado e uma fruteira no bairro Dutra, em Gramado, o comerciante José Paulo de Oliveira vê com bons olhos a medida de proibir a distribuição gratuita de sacolas plásticas aos clientes em compras. Ele gasta, mensalmente, cerca de R$ 10 mil para adquirir milhares de sacolas para os clientes. Com a medida, será possível economizar.
— Algumas pessoas chegam com as suas sacolas, mas são poucas. Tenho alertado que, daqui a pouco, o que é uma exceção vai ter que virar regra. A lei vai fazer com que todos se acostumem. O mais difícil é mudar a mentalidade, mas precisamos ajudar o meio ambiente — afirma.
Por meio de nota, o presidente do Sindilojas Hortênsias, Guido Thiele, afirma que o uso das sacolas plásticas é significativo no comércio varejista, uma vez que o empreendedor busca ter à disposição um produto que tenha bom custo-benefício para ser resistente e acondicionar o produto. Em contrapartida, as sacolas de papel tem um valor mais elevado, segundo ele.
Ainda conforme Thiele, assim como as sacolas, garrafas pets e copos plásticos também são exemplos que afetam o meio ambiente se descartados de forma incorreta.
— Enquanto não tivermos uma educação efetiva quanto à questão da responsabilidade do consumo e da economia, usando e jogando fora, não darmos valor e importância e não devolvermos para a reciclagem, apenas estaremos elevando custos, trocando de material e problema. A minha liberdade termina quando inicia a do próximo. Enquanto nos preocupamos em encontrar culpados e fazer leis para impor costumes ou normas, dificilmente vamos conseguir o engajamento da comunidade — avalia.
Para ele, a questão ambiental é importante, mas que deveria haver uma maior discussão quanto à proposta junto às partes envolvidas.