Uma descoberta com colaboração internacional e tendo Caxias do Sul como cenário principal. No final da década de 1970, um fungo foi encontrado nas paredes de madeira do setor de parasitologia do Bloco A da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e isolado pelos professores Juan Carrau e Rute Terezinha da Silva Ribeiro. Décadas depois, uma nova pesquisa realizada na UCS, que contou com cientistas da Holanda e da Coreia do Sul, descobriu que esse microrganismo é de uma nova espécie. Agora, ela leva o nome da universidade, Penicillium UCSENSE, como celebrado na última quinta-feira (28), em cerimônia na instituição.
— A relevância está no fato de ser uma espécie nova, nunca antes catalogada, e que recebe o nome vinculado à universidade. É o apogeu de mais de 40 anos de pesquisa no campo da biotecnologia — celebra o pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da UCS, Everaldo Cescon.
A descoberta também é simbólica porque, no ano que vem, o programa de pós-graduação em biotecnologia da UCS completa 30 anos. É o programa de pós mais antigo da universidade.
Durante as quatro décadas, o fungo, encontrado dentro de uma larva que estava nas paredes do Bloco A, ganhou pelo menos duas classificações, de Penicillium sp e Penicillium echinulatum. Essa história mudou em 2017, quando o professor da Universidade Estadual da Bahia, Alexandre Rafael Lenz, que nasceu em Lajeado e começou a graduação em ciência da computação em 2001 em Caxias, iniciou o doutorado voltado para a biodiversidade. Orientado pelos professores Aldo Dilon e Sheila de Avila e Silva, Lenz fez uma pesquisa de bioinformática com as sequências de DNA deste fungo.
— Este fungo vive em simbiose (ou seja, está ligado) com um inseto, mas existem parentes deste fungo que têm vida livre — explica o professor Dilon.
Nesta história com roteiro internacional, Lenz estava em um doutorado “sanduíche” (quando o pesquisador estuda parte da tese no Exterior) no México. A pandemia começou e o professor ficou nove meses na região de Cancún. A cerimônia realizada na UCS também marcou a primeira vez que Lenz retornou para Caxias desde 2017, quando iniciou o estudo do Penicillium UCSENSE. O pesquisador se mostrou bastante emocionado ao explicar a descoberta.
— Tentei fazer um resgate de um sonho, que foi trabalhar com natureza, biodiversidade e preservação. A minha ideia é trabalhar com fungos, com o objetivo de melhorar o planeta — conta Lenz, sobre a motivação, além de também ter sido incentivado pela proximidade da família.
O gaúcho também é coordenador do grupo de pesquisa de bioinformática e biologia computacional na universidade baiana. Lá, há estudos sobre fungos que ajudam, por exemplo, na degradação de plástico e limpeza de material tóxico.
Como explica o doutor em biotecnologia, a pesquisa em genômica está em uma área relativamente jovem. Para realizar o estudo, programas de computador que não existiam na UCS foram instalados e até um computador novo foi comprado para a configuração deles.
— Depois que conseguimos identificar os genes, identificamos que o material genético do fungo não era o que estava classificado antes. Essas análises levaram a identificação da nova espécie — descreve o pesquisador.
Com a descoberta, Lenz contou com a colaboração do pesquisador holandês Jos Houbraken para a identificação. Houbraken atua na universidade de Utrecht, referência mundial na identificação e estudos sobre fungos. Em seguida, as informações foram repassadas para pesquisadores sul-coreanos, uma vez que seis linhagens da mesma espécie foram encontradas no país asiático.
Utilização para produção de etanol
Há pesquisas que envolvem o Penicillium UCSENSE e avaliam a possibilidade do fungo ser utilizado na produção do etanol de segunda geração. O objetivo inicial do estudo de Lenz era entender melhor o material genético do fungo para que pesquisadores identificassem a melhor forma de usar o microrganismo na produção do biocombustível.
As pesquisas sobre a utilidade do fungo continuam. Hoje, a UCS estuda a atuação das enzimas do fungo na degradação do bagaço e palha da cana-de-açúcar e do capim-elefante.
— O que sabemos e viemos estudando é que ele tem uma importante função na decomposição de celulose e celulase. Nós extraímos, hoje, apenas o álcool de primeira geração e sabemos que é possível extrair o álcool de segunda geração se conseguirmos decompor essa celulase — explica o pró-reitor da UCS, Everaldo Cescon.