Estudantes, professores e funcionários da Escola Estadual Dante Marcucci, em Caxias do Sul, se preparam para encarar uma nova rotina a partir do ano que vem. É que a escola, cujo prédio atual no bairro Marechal Floriano foi inaugurado em 1969 com recursos do governo federal, encerrará as atividades até o próximo dia 23 para dar lugar a uma unidade do Colégio Tiradentes, mantido pela Brigada Militar (BM).
Os cerca de 220 estudantes matriculados no Ensino Fundamental, se famílias desejarem, serão automaticamente atendidos pelo Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza, localizado a poucos metros da escola estadual. Os demais terão vaga garantida em outras instituições, segundo a Secretaria Estadual da Educação (Seduc).
Embora os colégios estejam próximos fisicamente, há uma relação construída entre comunidade-escola que deixará saudades. O fim da Escola Dante Marcucci entristece muitas das gerações que compartilharam o dia a dia sob o mesmo teto — embora os estudantes tenham assistência garantida em outros colégios, o sentimento de finitude é compartilhado entre a comunidade.
A auxiliar de produção Sandra Avellameda dos Santos, 32 anos, é mãe de dois alunos da Dante Marcucci, Bruna, 8 anos, e Lucas, 15. Ela conta que foi pega de surpresa com a notícia.
— O Lucas estuda ali desde a primeira série, não esperava que isso fosse acontecer, eles estão bem tristes. Para ser sincera, eu não gostei, porque temos uma relação boa com os professores e com a direção. Eu sei que se acontece algo, eles me ligam, sabem onde trabalho. Agora, na outra escola é maior, tem que começar todo um vínculo novo. É uma mudança grande — afirma.
A notícia do fechamento da Dante Marcucci também repercutiu entre as comunidades que rodeiam a escola. A presidente da associação de moradores do bairro (Amob) Euzébio Beltrão de Queiróz, Miriam Jesus Machado, comenta que os estudantes da região são distribuídos em diversas instituições. Mesmo assim, ela afirma que ficou entristecida pelo fim da escola.
— Sempre tivemos um bom relacionamento com a diretoria, um contato direto quando algum aluno faltava, não comparecia mais. Eles nos contatavam para saber o endereço ou entender o que estava acontecendo com a criança. Então, quando é esse tipo de relação, que existia uma empatia dos dois lados, é triste quando se termina o ciclo — lamenta a representante do Euzébio.
A vice-diretora da Escola Dante Marcucci, Caroline Moojen Corso, corrobora com a opinião de Miriam. Ela destaca o vínculo criado com as famílias ao longo dos anos — a escola foi entregue à comunidade em 1969, na gestão do prefeito Victório Trez.
— Tem todo um sentimento afetivo, pois há pais de alunos que estudaram aqui. O Cristóvão é uma ótima escola, mas é diferente. O Dante é uma escola 'pequenininha', até o nono ano, com poucos professores. Nós conhecemos as famílias e o contexto de cada aluno — pontua a vice-diretora.
A segunda casa da professora Maria Regina
Além dos estudantes, que terão que se adaptar a um novo ambiente de ensino, com outros professores e colegas, quem também terá que mudar a rotina é a professora Maria Regina Gabrielli, 56 anos. Há 12 anos, a Dante Marcucci é a segunda casa dela, sendo a docente mais antiga, atualmente, na instituição.
— Criamos um vínculo grande. Eu sempre gostei de trabalhar aqui pelas crianças, principalmente, que me cativam. Até dizia para minhas colegas que se tivesse que sair, eu não sei o que faria. Mas hoje já penso diferente. Até porque eu gosto de trabalhar com crianças — ressalta Maria Regina, que diz não saber oficialmente onde lecionará em 2022.
Para ela, os dois últimos anos foram os mais desafiadores na rotina escolar diante das mudanças ocasionadas pela pandemia. Dos 20 alunos da chamada, apenas oito estão indo presencialmente.
— A gente viu que as crianças se afastaram, dá impressão que elas não têm o mesmo carinho e vontade de voltar na aula. Foi difícil resgatá-las — comenta a professora do quarto ano.
Além de Maria Regina, outros 24 servidores (19 professores e cinco funcionários da secretaria, merenda e limpeza) serão realocados a partir do próximo ano letivo. A Seduc informou, via assessoria de imprensa, que "os professores que atuam na escola Dante Marcucci poderão permanecer no Colégio Tiradentes, caso tenham interesse e carga horária. Os demais seguirão para o Cristóvão de Mendoza para atender justamente a demanda dos alunos que estão sendo encaminhados da Dante Marcucci, sem nenhum prejuízo para suas atividades".
Corrida contra o tempo para iniciar ano letivo
Conforme o coronel Alexandre Brite, comandante do Comando Regional de Polícia Ostensiva da Serra (CRPO Serra), agora está sendo travada um corrida contra o tempo para garantir que o Colégio Tiradentes posso funcionar até março. Ele diz que a expectativa é lançar ainda em janeiro o processo seletivo, com prova intelectual e exame físico, para os interessados.
Parte das vagas estimadas para abertura da instituição serão direcionadas para quem passar pela seleção e outra parte será destinada a filhos de policiais militares da região. Todas as vagas são para três turmas de primeiro ano do Ensino Médio — o colégio mantido pela BM, em convênio com a Seduc, atende somente alunos da última etapa da educação básica.
— É um desafio grande, pois a ideia é que funcione já no ano que vem. Vamos ter que buscar algumas coisas de administração e estrutura para que consigamos operar no primeiro semestre. Pretendemos iniciar o ciclo de aulas já entre fevereiro e março. Ainda não está certo, mas serão de 70 a 90 vagas — explica Brites.
O comandante destaca o nível educacional dos jovens formados pelo Colégio Tiradentes:
— Eu sou egresso do colégio. O que posso dizer é que o forte da instituição é a questão da hierarquia, do respeito às pessoas, aos mais velhos, respeito aos símbolos, representação de valores, tudo isso que está incluso na rotina que nós, militares, executamos. Os professores vão ter alunos dedicados e com compromisso com o aprendizado. Temos vários exemplos de jovens que se destacam em concursos nacionais e conseguem vagas em universidades federais— detalha.
ENTENDA
:: A instalação de um Colégio Tiradentes na maior cidade da Serra é uma possibilidade desde 2010, quando a governadora Yeda Crusius (PSDB) autorizou a abertura.
:: A tradicional instituição tem unidades na Capital, Passo Fundo, Santa Maria, São Gabriel, Santo Ângelo e Ijuí. O projeto de Caxias do Sul, contudo, travou na escolha de um endereço e foi esquecido com o tempo.
:: A possibilidade de instalação em Caxias foi revivida pelo vereador Alexandre Bortoluz (PP). A iniciativa ganhou força em agosto e foi bem-recebida pela BM e Seduc.
:: A instituição ocupará o prédio da Escola Estadual Dante Marcucci, que encerrará suas atividades até o próximo dia 23. Os alunos terão vaga garantida em outras instituições, incluindo o Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza.
:: A BM é responsável pela parte administrativa do Colégio Tiradentes, com um oficial diretor e outros PMs na equipe. A parte pedagógica é da 4ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE). São atendidos somente alunos dos três anos do Ensino Médio.
:: Segundo o comandante do CRPO, mais informações sobre o processo seletivo que garantirá vaga no colégio serão informadas no site oficial da BM e nas redes sociais do CRPO, bem como via imprensa. A expectativa é que as provas possam ocorrer ainda no mês de janeiro.