Restabelecer o sistema respiratório de pacientes após o contágio por covid-19 tem sido um dos principais desafios desde que a pandemia se instalou. Por conta disso, a procura por profissionais que atuam nesta área tem aumentado significativamente e, mais do que isso, se refletido em filas de espera por fisioterapia específica no Sistema Único de Saúde (SUS). Somente em um dos espaços que presta esse tipo de serviço de forma gratuita — o Centro Integrado de Saúde do Centro Universitário FSG, em Caxias do Sul — a média de pacientes recebidos para reabilitação pulmonar é de 64 a cada mês.
Antes da pandemia, o formato de atendimento nem existia porque era mais comum apenas dentro de hospitais. Por isso, a equipe atuava mais em reabilitação motora, que segue em vigor. De acordo com a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), há cerca de mil pessoas no aguardo para o início de algum tipo de tratamento de fisioterapia do município.
Por conta da demanda represada, a pasta vai abrir uma Clínica de Fisioterapia junto ao prédio do Centro Especializado em Saúde (CES), localizado na Rua Sinimbu, 2.231, no Centro. Uma reforma já ocorre nas dependências e deverá ficar pronta na metade de setembro. O prazo poderá ser modificado se houver demora para a compra de equipamentos, o que será feito por meio de licitação, como explica a secretária de Saúde Daniele Meneguzzi:
— A abertura (da clínica) já estava no nosso planejamento. Desde o início do governo identificamos essa necessidade. Neste momento, no enfrentamento da pandemia, temos diversos pacientes com sequelas pós-covid. Em um segundo momento esperamos que tudo isso passe e então possamos oferecer outras funcionalidades focadas. Por exemplo, em distúrbios osteomusculares e a própria respiratória, já que nossa cidade tem muitas pessoas com problemas devido ao nosso clima — diz.
Mesmo com a futura clínica, a secretária entende que as parcerias seguirão em vigor e até serão ampliadas. Esses convênios entre a prefeitura e clínicas particulares, além da FSG, somaram de janeiro a maio deste ano 45 mil sessões de fisioterapia realizadas.
— Temos um déficit no número de atendimentos porque essas parcerias não dão conta de atender a todos os pacientes. Mas elas serão ampliadas. Temos a Universidade de Caxias do Sul (UCS), que poderá nos ofertar serviços nesse setor e, por isso, temos um convênio em fase de desenvolvimento — adianta.
Fisioterapeutas que já atuam no município em Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e no CES serão realocados para o espaço. Desta forma, o investimento dos cofres municipais será de cerca de R$ 70 mil entre obras e compra de equipamentos para a nova clínica. Por enquanto, o número estimado de pacientes que poderão ser recebidos ainda é avaliado.
No Centro da FSG, localizado na Rua Marechal Floriano, 1.229, uma das coordenadoras do programa de reabilitação, a fisioterapeuta e professora universitária Danusa Rossi, 39, salienta que o trabalho é realizado por estudantes da graduação do curso, com acompanhamento contínuo das docentes nas quartas e sextas-feiras.
— A parte respiratória é uma das sequelas que mais se sobressai nos pacientes. Muitas vezes eles não conseguem levantar de uma cama por falta de ar. Estamos com uma demanda bem grande e de pacientes bem acometidos. Por isso, damos prioridade a pacientes que realmente estão com comprometimento — afirma.
"Sou um verdadeiro milagre", diz paciente que teve 90% do pulmão comprometido
Uma das sobreviventes do coronavírus que mais aproveitou os atendimentos ofertados pela parceria entre o município e a FSG foi Veroni Colombo, 53. Moradora de São Virgílio da 6ª Légua, interior de Caxias, ela frequentava o espaço duas vezes por semana após passar por um "verdadeiro milagre", como ela relata ao descrever a sua recuperação após contrair covid-19.
Segundo a dona de casa, seu caso já não motivava esperanças médicas. Os profissionais passaram a desacreditar na melhora do seu quadro de saúde. Veroni ficou 40 dias internada no Hospital Virvi Ramos neste ano sendo que, em 18 deles, ela estava entubada dentro de uma UTI. Na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), Veroni passou duas vezes por paradas respiratória e cardíaca. Foi reanimada com o uso de adrenalina e choques elétricos. Apesar de o comprometimento dos pulmões ter chegado a 90%, nem tudo foi ruim. No dia do seu aniversário, em 3 de abril, ela acordou da sedação e surpreendeu-se com a presença das duas filhas e do marido no leito hospitalar.
— O médico liberou a visita porque achava que eu não me recuperaria mais. No prontuário constava que eu possivelmente evoluiria para óbito. Uma das médicas disse para a minha filha que eu não amanheceria — lembra.
Depois desse episódio, Veroni passou a apresentar melhoras, até que teve alta hospitalar. Mesmo assim, ela ainda precisava enfrentar a falta de autonomia motora, resultado das sequelas da doença. Ela precisava de ajuda para se alimentar e teve que usar fraldas. Em 23 de abril, começou a participar do trabalho ofertado pelo Centro Integrado de Saúde da FSG.
— As gurias (fisioterapeutas) tinham planejado acompanhamento de seis meses para mim, mas em três eu me liberei. Além da ajuda no local, elas auxiliavam nos tipos de exercício que eu precisava fazer em casa. Um professor de Educação Física me ajudou e aí eu completava com mais exercícios em outras três vezes na semana. Hoje estou ótima. Na última tomografia que fiz (do pulmão) não achavam que eu tivesse passado por covid — conta, entusiasmada.
Apesar da história vitoriosa de Veroni, ela faz um importante alerta:
— Fisicamente estou ótima, mas esqueci do mental. Atualmente preciso de ajuda com esta parte porque adquiri síndrome do pânico. Eu sempre digo: as pessoas precisam ter algo superior, algo espiritual porque sem isso a gente não consegue viver direito. Eu tive uma rede de pessoas que rezaram constantemente por mim e isso foi essencial — conclui.