Foi no susto da economia que a ficha caiu. Quando as portas de empresas se fecharam de forma compulsória, no final de março, a população viu não só sua rotina interrompida de modo abrupto, mas também, através do desconforto do silêncio das ruas desertas, compartilhou de um mesmo sentimento de apreensão. Foi a economia, no entanto, a propulsora (ou o pretexto) de uma série de movimentos de inssurreição que desataram uma então ensaiada união social em prol de um bem comum. A partir do fechamento de fábricas, lojas, restaurantes e até mesmo do pequeno negócio do bairro, cada dia seguinte contava (e conta) como um dia a menos na segurança financeira de famílias e empresários.
Quase que como um movimento instintivo diante das incertezas, as demissões logo se iniciaram, menos de um mês após as restrições. Em Caxias, o primeiro mês cheio da pandemia, abril, resultou em 12.087 desligamentos de trabalhadores e o fechamento de 8.280 postos de trabalho, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, o Caged, levantamento divulgado mensalmente pelo Ministério da Economia. Do ponto de vista das empresas, abril representou recuo de 24,8% (e desempenho 29% inferior ao mesmo mês de 2019), enquanto em maio a queda da receita foi de 26,3%, segundo a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC).
O impacto imediato e crescente e a incerteza da estabilidade na contenção da contaminação fizeram surgir um novo bordão no repertório do vocabulário da pandemia. “Economia deve andar de mãos dadas com a saúde” virou mantra. O movimento, embalado por pressão social, fez as restrições governamentais arrefecerem a ponto de definirem critérios institucionais para liberação ou limitação de atividades econômicas.
E foi semana após semana que gaúchos aguardaram, “engatilhados”, cada qual na sua percepções, o anúncio de classificação de bandeiras pelo governador Eduardo Leite (PSDB).
Atualmente, aos trancos e barrancos, empresas se adaptaram à nova realidade. O reflexo já está na economia, que apresenta relativa estabilidade, embora os prejuízos ainda estejam longe de qualquer perspectiva de recuperação.
De janeiro a novembro, Caxias do Sul registrou 54.719 demissões e 51.404 demissões, acumulando saldo de 3.315 vagas de emprego fechadas. O número negativo, mas indica uma recuperação no confronto de índices: de março a novembro, o município registrou fechamento de 5.975 postos de trabalho, ou seja, já restabeleceu parte das perdas registradas no período mais crítico, o mencionado abril, quando 5.281 foram encerrados.
No fim, talvez o novo normal seja somente uma forma de encarar a realidade com menos expectativa. Um ano que começou na expectativa de recuperação plena se encerra com um sentimento de que, do ponto de vista econômico (estritamente), poderia ser pior e de que o fundo do poço já foi atingido, lá em abril.
A única convicção unânime que pode ser extraída até o momento é de que a volatilidade do sistema econômico pode, sim, adaptar-se ao mais fundo dos poços e escalá-lo por si mesmo, na desesperança do surgimento de uma corda ou de um impulso salvador. Adaptação foi a palavra, adaptação do pensamento, das expectativas e das formas de trabalho. Neste ano, o caxiense trabalhou de casa, entendeu na prática o que representa a tão polêmica Reforma Trabalhista, resgatou a compreensão da importância da agricultura e da produção de alimentos. O caxiense também readaptou em suas convicções da comum expressão de que “o que importa é a saúde” e adicionou a economia nas suas prioridades. Com isso, tenta se convencer de que ambas as coisas são aliadas. Se são, de fato, transferiu essa responsabilidade para o Estado decidir.
Para ler ouvindo
El Condor Pasa, na versão de Yangos