Qual o valor de um abraço? Deixando de lado a conversão monetária, inaplicável neste caso, pode-se dizer, então, que o valor de um abraço é inestimável. Algo que sempre esteve ao alcance de todos e que, em tempos de distanciamento social, mostra-se ainda mais valoroso pela falta que provoca em quem não está perto de amigos ou familiares. Ainda antes da pandemia mostrar a importância do ato de carinho, o setor de oncologia do Hospital Geral contava com o recurso, oferecido por um grupo voluntário aos pacientes em tratamento contra o câncer. Uma das voluntárias é a aposentada Clebes Bonho, 69, que celebra uma década de reconfortantes abraços entregues. A comemoração tem motivo: todos os abraços que ela recebeu em troca.
— Identificada com o crachá, eu sempre me apresentei e pedi se a pessoa gostaria de receber um abraço. Nunca recusaram. Depois disso, começa a conversa e muitos sentem-se à vontade em dividir suas histórias, em um momento que é bastante desafiador para eles. A cada encontro que tive, fui percebendo o quanto essas pessoas lutam, são guerreiras; eu chegava a ficar com vergonha de mim porque percebia que os meus problemas não eram nada, eram apenas preocupações. A gente concentra nosso pensamento em muita coisa que não vale a pena, o voluntariado me abriu o olhar para a vida — relata Clebes, cheia de saudades da atividade, suspensa desde março em função da pandemia.
Mesmo de casa, ela encontrou formas de continuar colaborando com as necessidades dos pacientes. Recentemente mobilizou familiares e amigos para captação de materiais de higiene destinados ao Hospital Geral
A iniciativa voluntária sempre fez parte de sua vida, na dedicação à família, como dona de casa, e na vontade de participar de projetos tão logo fosse possível. Ela conta que a oportunidade apareceu em 2010, na Universidade de Caxias do Sul, quando frequentava as atividades oferecidas ao público de terceira idade. O convite da docência atraiu Clebes e outros frequentadores, sendo que poucos mantiveram-se na atividade por tanto tempo quanto ela.
— Por incrível que pareça eu comecei na oncologia infantil. Depois de seis anos, passei a circular também em meio aos pacientes do tratamento adulto. Algumas pessoas desistiram, isso é normal, ninguém é de ferro. O hospital é um ambiente que promove a saúde, mas que tem a doença em primeiro plano e precisamos lidar com isso. Quando estou lá dentro, tento entregar o meu melhor — conta Clebes, que anos antes havia perdido o marido e um irmão para o câncer, experiências que, de certa forma, a prepararam para o desafio.
Ao completar 10 anos de voluntariado, colecionando histórias que marcaram sua vida, ela afirma que pretende continuar oferecendo o que tiver de melhor às pessoas, nas diversas formas pelas quais se pode ajudar alguém: seja com abraços, conversas ou doação de materiais.
— Tudo nesse mundo se move — ou deveria se pautar — pelo amor e pela empatia, se colocar no lugar do outro. Não faço nada extraordinário; é só ter amor, boa vontade, e tempo, claro. Qualquer um consegue e é maravilhoso — garante.
Voluntariado ganha adeptos na pandemia
Enquanto ações que incluíam contato físico, como os estimados abraços do Hospital Geral, foram suspensas desde o início da pandemia, as situações de vulnerabilidade agravadas pela crise e outras necessidades emergentes do momento têm motivado a adesão de cada vez mais pessoas ao serviço voluntário.
— Não dá para postergar: existe uma demanda de ajuda humanitária a ser atendida por todo o tecido social. O cenário de crise, na verdade, só reforça a essência do voluntariado — afirma José Alfredo Nahas, superintendente da ONG Parceiros Voluntários, presente em 23 municípios gaúchos e na cidade de São Paulo.
Desde o início da pandemia, uma série de iniciativas solidárias têm sido articuladas em prol de quem necessita. O movimento fez com que muitas pessoas procurassem a Parceiros Voluntários para colaborarem com ações intermediadas pela rede.
— Tivemos um crescimento no número de voluntários. Principalmente em ações emergenciais, como a formação de grupos para realizarem doação de alimentos e cuidado a pessoas em situação de vulnerabilidade social. As ações regulares e que eram feitas de forma presencial nas organizações sociais, devido à pandemia, infelizmente tiveram que ser reduzidas. Contudo, diante do contexto alarmante que vivemos quanto sociedade, é preciso reconhecer e valorizar as inúmeras pessoas que têm se apresentado como voluntárias — destaca o superintendente.
Na unidade de Bento Gonçalves, Jhuly Ketlyn Ziliotto, 27, foi uma das novas voluntárias. Há cerca de três meses, a publicitária colabora com a separação e classificação de roupas para doação, que ocorre nas dependências da Ação Social São Roque. A atividade, que sempre foi executada por um grupo de pessoas da terceira idade, agora conta com voluntários para que os idosos possam permanecer afastados e seguros.
— Vejo isso como uma troca saudável. A experiência está me ensinando o quanto é significante usar do meu tempo para servir ao outro. É uma fase de autodescoberta, do potencial humano e da sensibilidade que todos nós temos —afirma Jhuly, que encara a atividade como uma oportunidade de colaborar com o entorno e evoluir pessoalmente.
A possibilidade de participar do projeto surgiu a partir do convite feito por uma amiga, contemplando uma vontade que já se manifestava em sua vida.
— Eu acolhi o chamado e pretendo, a partir de agora ampliar minha atuação nesse contexto, disponibilizando as minhas habilidades para as causas sociais. A partir do momento que manifestamos a vontade de evoluir, as possibilidades para que isso se torne real simplesmente surgem. E se importar com quem está ao nosso redor faz parte dessa consciência que devemos atingir, afinal, somos todos um — completa a voluntária.
UMA DATA PARA ENGAJAR
Esta sexta-feira, dia 28, é marcada pela celebração ao Dia Nacional do Voluntariado. Mais do que comemorativa, sobretudo no período de crise mundial enfrentado, a data pode motivar ainda mais engajamento à causa, diretamente relacionada à solidariedade.
— É um marco para nos levar a uma tomada de consciência, definir quais os valores que buscamos como sociedade e de nos lembrarmos não apenas do outro, mas também de nós mesmos — afirma Daniel Santoro, presidente do conselho de administração da Parceiros Voluntários, que está sempre aberta a novos "parceiros".
As cidades e projetos de atuação da ONG podem ser conferidos no site parceirosvoluntarios.org.br. Além disso, ações religiosas, comunitárias ou mesmo realizadas em parceria com o setor de assistência social das prefeituras costumam aceitar voluntários dispostos a colaborar com diferentes atividades.