Um aparelho criado no Brasil na década de 1950, e que acabou caindo em desuso nos final dos anos 1980, ressurge agora como possibilidade de reforço no atendimento a pacientes do novo coronavírus. O Mini Ventilador 600, mais conhecido como Takaokinha ou cebolinha, é a inspiração do projeto Breath4Life, da aceleradora de startups do Hospital Albert Einstein, de São Paulo.
O protótipo é uma recriação do produto desenvolvido pelo médico anestesiologista Kentaro Takaoka — daí o apelido —, para impressão 3D e usinagem. O grupo de voluntários, formado por mais de 50 pessoas de todo o país, entre eles um médico de Bento Gonçalves, quer oferecer à comunidade global um aparelho simples que auxilie no combate à pandemia da covid-19.
Felipe Rech Borges, médico anestesiologista do Hospital Tacchini, explica que a grande vantagem do modelo é sua praticidade: é pequeno e não necessita de energia elétrica para funcionar. Utiliza a pressão do próprio oxigênio para entrar em movimento impulsionando o ar para dentro e para fora dos pulmões.
— Ele é portátil e cabe dentro do bolso. É um quadrado de 90 por 90 e sete de altura. Pesa 200 gramas. Você coloca dentro da bolsa. E só precisa de oxigênio, é 100% mecânico — diz.
A nova versão do Takaokinha não serve para casos de maior gravidade, mas é uma alternativa viável para locais onde não há respiradores suficientes para casos emergenciais, no transporte de pacientes no cenário intra e extra hospitalar e nos casos de necessidade de mais um leito para ventilação, além de servir no uso em atendimento pré-hospitalar por unidades especializadas, em salas de exames em hospitais – onde não cabem equipamentos modernos e grandes.
Em fase de testes, o ventilador deve ser lançado no dia 27, quando os arquivos para fabricação do aparelho estarão disponíveis no site do projeto para que qualquer pessoa o execute.
— Quanto mais equipamentos, melhor, porque vai suprir a demanda de algum lugar — empolga-se Borges.
RECORDAÇÃO
Iniciativa das startups incubadas no Albert Einstein, coordenadas pelos médicos Luis Fernando Michaelis e Diógenes de Oliveira Silva, o projeto contou com o empréstimo do Takaokinha de museus e universidades. Colecionador de itens médicos, Borges também pode contribuir com os dois exemplares que guarda na garagem de sua casa em Bento.
O médico, que já participava de outros projetos com Diógenes, se integrou ao Breath4Life e auxilia tirando dúvidas dos engenheiros que trabalham no desenvolvimento do novo Takaokinha. Embora trabalhe para que o aparelho funcione, ele confessa que seu desejo é que não seja necessário o uso:
— Se conseguirmos salvar uma pessoa, já vamos estar felizes. Mas nosso objetivo é que não seja usado, que ninguém precise. Gostaríamos que não fosse preciso.
CURIOSIDADES
> O antigo Takaokinha foi utilizado pela primeira vez em um ser humano em 1955 — foram quatro anos de testes em animais até ficar pronto.
> Reconhecido mundialmente, o equipamento é um ventilador portátil, pneumático e pressométrico e funciona com componentes mecânicos e não eletrônicos, sendo acionado automaticamente pelo próprio fluxo de oxigênio fornecido ao paciente.
> O Takaokinha deixou de ser usado porque a indústria de ventiladores para respiração artificial foi obrigada a seguir a tendência dos pacientes: cada dia mais complexos em seus problemas de saúde e também nos processos ventilatórios.
> Foram criados modelos de ventiladores e ventilação mais complexos e robustos, que possibilitam de maneira rápida, simples e confiável a regulagem do modo ventilatório, tempo inspiratório e expiratório, pausa inspiratória, recrutamento alveolar intermitente e pressão expiratória positiva final.
> O Takaoka serviu de inspiração porque é portátil, não necessita de energia elétrica e, feito em impressão 3D, pode chegar a qualquer lugar do Brasil e do mundo, tendo como tempo necessário para seu funcionamento apenas a impressão, união das peças e uma fonte de oxigênio disponível.
> O Breath4Life não é uma cópia idêntica do Takaoka, pois usa modelagem, design 3D e materiais que não existiam na década de 1950. O desenho também foi modernizado.
A UTILIZAÇÃO
> Em pacientes que começam a apresentar necessidade de apoio artificial respiratório invasivo sobre pressão positiva (intubados). Neste cenário, se incluem pacientes sadios (previamente hígidos) que deterioram rapidamente a função pulmonar, necessitando ventilação mecânica e não tenham respiradores microprocessados à disposição.
> Em pacientes já acometidos por disfunções ventilatórias, necessitando de ventilação mecânica, porém ainda sem um respirador considerado ideal.
> Em locais sem recursos financeiros para aquisições imediatas ou de médio prazo de ventiladores microprocessados.
> Em locais remotos e de difícil acesso para transporte de pacientes com necessidade de suporte ventilatório ou sustentação de ventilação controlada.
> Para transporte de pacientes sob ventilação controlada intra e extra hospitalar.
> Para uso por Serviços de Atendimento Médico de Urgência (Samu), pois ocupam pouco espaço no interior das ambulâncias e, normalmente, são utilizados por um curto espaço de tempo (entre a cena do resgate do paciente e o hospital referência).
> Em salas e leitos de hospitais convencionais ou temporários sem espaço adequado para um aparelho de tamanho habitual.
> Em clínicas de procedimentos de baixa complexidade, onde, na grande maioria, são procedimentos com anestesia local, mas que deve possuir um aparelho portátil, simples e barato para possíveis intercorrências.
> Como dispositivo substituto ao máscara-balão (AMBU) em casos de reanimação cardiorrespiratória: tanto intra quanto extrahospitalar (atendimento em shoppings, estádios de futebol, grandes reuniões de público).
> Em pacientes na fase inicial de SARA (síndrome da angústia respiratória), antes da evolução com piora do quadro de saúde.
LIMITAÇÕES DE USO
O equipamento tem capacidades funcionais e de setup muito exíguos. Por ser uma tecnologia da década de 1950, sem a presença de nenhum dispositivo eletroeletrônico acoplado, apresenta limitações óbvias de regulagem. Portanto, não deve ser usado nas seguintes situações:
> Em pacientes com SARA (síndrome da angústia respiratória) já instalada em sua forma grave.
> Em pacientes que necessitem de PEEP (pressão expiratória final positiva) como fundamental em sua terapia.
> Em locais onde não há equipe técnica treinada para avaliar as conexões e suas integridades, pois o aparelho não possui alarmes e sensores para eventos adversos como desconexão do TOT (tubo orotraqueal).
Fonte: https://breath4lifeproject.com/