O pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro levou mais pessoas a romper o distanciamento social e se expor ao risco de contágio nas ruas de Caxias do Sul. Na tarde desta quinta-feira (26), o movimento no Centro e no bairro São Pelegrino era maior em relação aos primeiros dias do confinamento, que entrou em vigor no último sábado (21) e teve alterações ao longo da semana. Essa constatação é da fiscalização da prefeitura e de profissionais que atuam em funções essenciais e observam o vaivém da população.
O movimento contrário às recomendações de médicos do mundo inteiro, visível nas redes sociais, é temerário e vem acompanhado de uma pressão de pequenos empresários para que o comércio reabra as portas. Ainda nesta quinta-feira, o prefeito Flávio Cassina e o vice-prefeito Edio Elói Frizzo voltarão a reafirmar que o município seguirá mantendo as regras do distanciamento social para conter o caos no serviço de saúde e mortes em decorrência do coronavírus na cidade. A Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) revela que há apontamentos de dificuldades financeiras envolvendo os pequenos empresários e comerciantes, mas respeitará as determinações do poder público.
O confinamento vem sendo desrespeitado principalmente por pessoas sem relação com o funcionamento de empresas. Nesta quinta-feira, o Centro teve a rotina alterada na parte da manhã, quando centenas de pessoas buscaram as vacinas contra a gripe. Durante à tarde, quando o serviço já havia cessado, o cenário era seguramente o mais agitado desde o início do decreto.
- Hoje tem muito mais gente, o movimento está assim desde a manhã. Antes, era só o público que ia no hospital, agora tá maior, inclusive o pessoal de carros - conta o taxista Felipe Sartori, 30 anos, que trabalha num ponto em frente ao Hospital Pompéia.
O movimento de casais, famílias ou pessoas sozinhas na Avenida Júlio de Castilhos era considerável, bem como o tráfego de veículos. Entre tantos pedestres, a reportagem encontrou quatro gerações de uma mesma família perto da Praça Dante Alighieri. A família havia ido ao centro pela manhã para garantir a vacina de Maria Georgina Borges de Oliveira, 68 anos, e decidiu aproveitar parte do tempo para resolver outros assuntos. Ketlyn Silveira da Silva, 22, carregava no colo a filha Clara, 1 ano. Georgina era amparada pela filha Rosangela de Fátima de Oliveira, 54, mãe de Ketlyn e avó de Clara.
- Precisamos resolver algumas coisas e não temos como quem deixar - justificou Ketlyn, referindo-se a menina e a avó Georgina.
- O que o presidente falou pode ser verdade - complementou Rosangela, numa alusão aos riscos minimizados no discurso.
Na Praça Dante Alighieri, a reportagem contou nove bancos ocupados por pessoas, alguns com mais de três pessoas. Fernando Barros, 55, era um deles.
- Eu nunca saí daqui da praça, moro em frente. Tem mais movimento sim. Acredito que as lojas poderiam abrir, mas separando quem é do grupo de risco, como idosos - comenta.
No Parque da Lagoa, no Desvio Rizzo, o movimento é maior no final do dia. Nesta quina-feira, crianças e adultos ocupavam a pista de caminhada, a Academia da Melhor Idade, o parquinho e os bancos.
"Não vamos pressionar o município"
Com cerca de 1,9 mil advertências verbais repassadas a donos e responsáveis por empresas do ramo em geral que estavam atendendo sem autorização nos últimos sete dias, a Secretaria Municipal do Urbanismo (SMU) tem o desafio de fazer valer a determinação do decreto que está controlando todas as atividades não essenciais em Caxias. A medida tem validade até o dia 8 de abril, mas pode ser prorrogada ou abreviada de acordo com a evolução da epidemia. Até quarta-feira (25), o município recebia, por hora, cerca de 50 denúncias de comércio operando de forma irregular. Até agora, um estabelecimento foi multado e quatro receberam notificações, segundo o titular da pasta, João Uez. Os bairros com maior número de comércio aberto e pessoas nas ruas são Santa Fé, Serrano, Cruzeiro e Bela Vista. Há ainda descumprimento do decreto nos bairros Fátima, região Esplanada e Vila Cristina.
Nesta quinta-feira, as denúncias caíram pela metade, o que está sendo atribuído a uma maior conscientização do público, na opinião do secretário Uez.
- Claro que a manifestação do presidente botou mais pessoas nas ruas. Mas nosso conselho é um só: fique em casa.
O presidente da CIC, Ivanir Gasparin, em contato com associados, tem reforçado a decisão de aguardar o prazo de 15 dias do decreto.
- Não vamos pressionar o município, precisamos aguardar a evolução da doença. Mas aperta o lado financeiro dos pequenos empresários, começa a faltar recursos. No momento, não sabemos apontar qual seria a solução. Estamos respeitando o que vem das autoridades - reitera Gasparin.