Ser motorista de aplicativo se tornou uma alternativa para driblar a crise e se sustentar em Caxias do Sul. A cidade foi a primeira do interior do RS a contar com o serviço, que para muitos profissionais desempregados, é a única fonte de renda. Desde a estreia da primeira empresa em 27 de outubro de 2016, a situação dos motoristas mudou muito. Atualmente, devido ao aumento no número de aplicativos que conectam os passageiros aos veículos, os ganhos com a atividade reduziram, já que aumentou a oferta e, consequentemente, as corridas são divididas.
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Reportagem publicada no Pioneiro, em setembro, mostrou que até profissionais diplomados, com curso superior, aderiram à função para pagar as contas. Especialistas ressaltam que a atividade pode ser um bom negócio quando o profissional sabe administrar os ganhos. Essa, porém, não é a realidade da maioria dos motoristas. Quatro profissionais conversaram com a reportagem em nome de vários grupos de motoristas de aplicativos da cidade para expor a rotina diária dos profissionais.
“Tem viagens que não pagam nem a gasolina”
Motorista de aplicativo há dois anos, Maiquel Borba, 37 anos, trabalha 12 horas por dia, para conseguir levantar cerca de R$ 250:
– Esse valor é bruto. São R$ 100 para combustível e quem aluga carro paga R$ 60 por dia. Então, sobra R$ 90. Quem não aluga tem a prestação do carro que não sai por menos de R$ 800. Ainda consigo me sustentar, mas apenas me sustentar com a profissão – relata Borba.
O presidente da União dos Motoristas de Aplicativo de Caxias do Sul (Umacs), Gervásio Longui, 47, afirma que com o aumento no número de aplicativos, o número de corridas para cada profissional reduziu, o que reflete na renda.
– Para conseguir valores mais altos das corridas têm que ter a sorte de conseguir uma chamada para ir mais longe, ou quando está na dinâmica, ou ainda, para fora da cidade – conta Longui.
Ramon Ribeiro Drum, 25, deixou o trabalho em uma metalúrgica para se dedicar a atividade:
– Faço em torno de 20 corridas por dia, mas os valores são muito baixos. Tem viagens que não pagam nem a gasolina. É ilusão pensar que os motoristas ganham dinheiro fácil. Consigo me manter e pagar minhas contas. Só isso – reclama Drum.
Robson Jacobi, 28, ressalta que no final do mês, a situação é ainda pior.
– Não está fácil a vida de motorista de aplicativo, tem profissionais que trabalham 12 horas por dia e mal conseguem faturar R$ 200 por dia. Sem falar nos dias de final de mês em que as corridas ficam escassas pois tem mais motoristas – afirma Jacobi.
De dez, seis têm a taxa mínima
Para os passageiros, quanto mais motoristas à disposição, menor o preço. A cada dez corridas durante o dia, seis têm a taxa mínima que é R$ 4,50, segundo os profissionais.
– Estamos beirando ao colapso no número de motoristas. Eles não repassam os números oficiais, mas até o fim do ano, estaremos em torno de 10 mil. Ninguém vai conseguir levar seu sustento para casa desta forma – acredita o motorista Robson Jacobi.
O presidente da Umacs acrescenta que o número de motoristas aumentou depois da liminar que suspendeu a regulamentação:
– Daqui há pouco não dá uma corrida para cada um motorista. Com a lei que regulamentava a atividade era bem melhor, porque muitos que faziam o “bico”, largaram para não ser pego nas fiscalizações. Com a liminar que suspendeu a regulamentação, 700 novos motoristas se cadastraram. Quem não tem alternativa segue dirigindo, mas muitos desistem – aponta Longui.
Falta de manutenção prejudica atividade
Motoristas que têm carro próprio têm que arcar com a manutenção dos veículos. Longui ressalta que esses gastos são altos:
– Quando acho que está sobrando dinheiro, tenho que trocar pneu, rever a suspensão do carro, pagar a vistoria do GNV. Os gastos de manutenção com o carros são altos, e temos que manter tudo em dia para prestar um serviço de qualidade.
Jacobi também se preocupa com a segurança dos passageiros. Para ele, o número de empresas faz bem ao bolso dos passageiros, mas prejudica o atendimento.
– Há carros sem condições de trafegar, com pneus carecas, sem step, sem macaco e com a lataria batida. Duvido que a metade desses veículos tenha seguro. Daqui uns dias pode acontecer até algo de pior e a maioria não possui seguro para passageiros. Só queremos respeito e ser dignos de uma profissão. Ser motorista de aplicativo não deve ser um refúgio ou ser tratado como um simples complemento de renda – destaca Jacobi.
"A cada dia corremos risco de ser assaltados", desabafa motorista
O alto índice de violência contra motoristas de aplicativo motivou os profissionais a intensificar os cuidados e criar uma rede própria de monitoramento.
– Estamos sempre alertas. Nos últimos seis meses criamos ações para nos proteger. A realidade é que nos colocamos diariamente em risco. A cada dia corremos risco de ser assaltados – diz o motorista Maiquel Borba.
Longui segue a mesma linha:
– É cada vez mais assaltos, mais riscos e menos renda. Estamos expostos ao perigo. É uma tarefa cansativa, física e mentalmente. Acabamos desgastados e quando mais cansados, menos rende o trabalho.
Para Jacobi, a insegurança assusta:
– Está aumentando o número de motoristas assaltados e de carros roubados. O índice só aumenta – lamenta.
PASSAGEIROS AVALIAM SERVIÇO
"Já embarquei em carros mais simples como Uno. Estava limpo, o motorista era simpático, mas não parece o modelo adequado aos aplicativos", diz André Leão, 25, eletricista
“ Não tenho reclamações quanto aos carros que me atenderam. Foi um dos melhores serviços que inventaram", elogia Jozielli Silva da Rosa, 38, apontadora de produção
“Já circulei com alguns motoristas que não são tão gentis e educados, mas a maioria atende com gentileza. No geral avalio com nota 7", avalaia, Aline Graciele da Silva Gonçalves, 29, cozinheira
"Uso o aplicativo diariamente. Sempre fui bem atendida. O valor é acessível, os carros bem conservados e o atendimento também é positivo", diz Rochele Andrade Nadalon, 40, metalúrgica
“Alguns carros não têm condições de circular, mas o pior mesmo é o despreparo e a falta de educação de alguns motoristas", destaca Bruno Silva, 35, engenheiro
“Já peguei carros que faziam muito barulho, sujos e também com o para-brisa quebrado. Mas a maioria está em ótima condições. Gosto de usar o serviço. Minha avaliação é positiva", ressalta Alessandra Karina Rech, 21, professora
NÚMERO DE MOTORISTAS
A Secretaria de Trânsito informa que tem 352 motoristas de aplicativos regularizados. Por nota, a assessoria lembra ainda que está em análise uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), proposta pelos motoristas, que questiona pontos da legislação responsável pelo regramento do serviço e que restringiu as ações de fiscalização da pasta. Diante deste cenário, a secretaria não comenta o assunto.
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