Se alguém ainda pensa que a música clássica e a tradicionalista não combinam, vai mudar de ideia ao ouvir Heloísa Fochesato de Souza, 17 anos, tocando uma milonga no violino. Aliás, existe algo mais tradicional do que o clássico? Ocorre que até há pouco tempo os dois estilos musicais não se misturavam nos Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) ou raramente o faziam. Mas, esse cenário vem mudando e as entidades têm buscado agregar esse instrumento erudito aos seus grupos musicais.
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Há dois anos, Heloísa atendeu ao convite de um amigo para conhecer o CTG Campo dos Bugres porque a entidade estava à procura de um violinista. A ideia era inserir o violino junto aos demais instrumentos tradicionalmente usados para agregar sonoridade ao grupo musical da entidade. É esse grupo, em geral, com cinco ou seis componentes, que acompanha as invernadas artísticas em ensaios e apresentações de dança. Via de regra, entre vaneiras, bugios, valsas e milongas, são soberanas a gaita, os violões e os elementos da percussão – cajon e pandeiro, entre outros. Heloísa explica que o violino é mais melódico, faz parte do grupo dos agudos e agrega leveza às canções que ganham novos arranjos.
– O violino me trouxe para o CTG. É algo muito novo. Ainda não se vê tanto. O que vejo é que as pessoas pedem por uma delicadeza musical. O violino oferece essa delicadeza que a invernada, às vezes, não consegue colocar na dança sem ouvir. Fico muito feliz em ver isso acontecendo, ver os violinistas participando do movimento (tradicionalista) porque faz a diferença musicalcamente falando. Também fico feliz por poder participar disso, colocando a minha personalidade. Consigo colocar o erudito a favor do tradicionalismo – pondera a violinista.
O contato da Heloísa com o violino começou ainda na infância. Com nove anos ela entrou para um projeto da orquestra da escola onde estuda, aprendeu a tocar e, como toda pessoa com alma de artista, se apaixonou. Mas, foi no CTG que a adolescente descobriu outros ritmos e possibilidades.
– Teve uma grande mudança. Muitas coisas que abordamos de uma forma na orquestra, no CTG, precisamos fazer de forma totalmente diferente. E isso foi uma descoberta que mudou muito a minha maneira de pensar musicalmente. Tinha coisas que lá (na orquestra) funcionavam e aqui (no CTG) não funcionavam e vice-versa. Na orquestra, tocamos mais músicas eruditas e populares. Tocava com partitura e aprendi técnicas mais voltadas para o violino. Aqui (CTG), consegui aprender mais como me relacionar em grupo, tocar sem partitura e sobre mudanças de modulação, quando muda o tom da música... coisas que tive que aprender a fazer de maneira mais autônoma – relatou a musicista.
Acostumada a ambientes mais restritos, a violinista também pode colocar em prática algo com o qual não estava acostumada, como tocar em público. O novo ambiente e conhecimentos levaram Heloísa a vencer o primeiro concurso individual do qual participou, o Encontro de Artes e Tradições (Enart) do ano passado. Ela tocou a Milonga para as Missões, de Gilberto Monteiro, com arranjo de André Machado, acompanhada por Guilherme Rovieira, ao violão.
– Quando comecei a aprender, percebi que era algo que me fazia muito feliz e que tudo isso poderia ser levado adiante – disse Heloísa que se prepara para vestibular de Música na UFRGS.