Um gesto encarado como simples pelo bento-gonçalvense Rafael Audibert, 33 anos, ensina solidariedade e humanidade. Ainda no ano passado, ele foi identificado como doador compatível de medula óssea. A ligação da equipe do Registro de Doadores de Medula Óssea (Redome) chegou dez anos depois dele ter se inscrito em uma campanha que buscava doares para um jovem da cidade com leucemia. Desta vez, graças à compatibilidade e ao "sim" que ele respondeu à equipe, a vida de uma mulher que mora no Rio Grande do Norte poderá ser salva. A identidade da paciente que enfrenta leucemia e será socorrida pela doação de Audibert é mantida no anonimato pela equipe do Redome. No entanto, ele dispensa saber quem será a beneficiada por acreditar que gestos assim não precisam ter rosto, nome ou CPF conhecidos.
— Por estar em contato com o Redome, descobri que só em fevereiro, duas pessoas morreram aguardando pela doação de medula no país. E elas tinham encontrado doador, mas por negação deles em seguir com o processo ou por dificultar a doação, elas não resistiram ao tempo de espera — exemplifica.
O enredo fica ainda mais comovente porque o cabelereiro de Bento Gonçalves tem outra motivação forte para querer ajudar ao próximo. Regina e Antônio Carlos, pais dele, morreram aos 46 e 50 anos, vítimas de câncer. Mais de uma década depois desta perda irreparável, ele viajou para Natal a convite do Redome para se submeter a exames, que certificaram se ele estava em condições de passar pelo procedimento de doação, e também para recolhimento de mais dados para que o processo seguisse. O desfecho é feliz: Rafael e a doadora têm 100% de compatibilidade. A cirurgia estava marcada para o final de fevereiro, mas precisou ser adiada diante do estado de saúde debilitado da paciente. Uma nova data será informada assim que houver melhora do quadro - a expectativa é que seja em breve. Rafael resolveu compartilhar sua história nas redes sociais e recebeu uma enxurrada de mensagens: pessoas transplantadas de medula óssea, familiares de pessoas que seguem na fila de espera, gente que perdeu alguém aguardando um "sim", como o que foi dito por Rafael. Como todo processo costuma ser mantido no anonimato, a exposição que Rafael deu ao tema formou uma rede de informações sobre doação de medula óssea importante, que relembra o quanto é fácil fazer parte do cadastro do Redome e poder ajudar o próximo.
— As pessoas não sabem sequer como é feita a doação de medula óssea. Em nenhum momento quero me promover ou fazer marketing pessoal. Quero que as pessoas entendam os processos de doação, percam os medos e saibam que não há risco em doar — defende.
"Se não fosse atitudes assim, eu não estaria vivo"
Audibert foi um dos milhares de bento-gonçalvenses que foram incluídos no cadastro do Registro de Doadores de Medula Óssea (Redome) para ajudar Bruno Basso - na época, diagnosticado com leucemia aos 14 anos e que precisava com urgência de um transplante. A ideia era encontrar na cidade alguém com compatibilidade ao jovem. No entanto, as células que salvaram Bruno chegaram de dois pontos do mundo - dos Estados Unidos e São Paulo. O diagnóstico aconteceu em 2007, e o transplante foi em 2010. Aos 26 anos, Bruno hoje enfrenta outras complicações da doença, mas segue uma vida normal e trabalha como auxiliar administrativo. Ele busca ajuda para custear prótese no joelho direito. Além disso, criou um grupo onde são criadas diversas campanhas para ajudar pessoas que enfrentam problemas semelhantes ao que enfrentou, chamado Solidariedade Serra Gaúcha.
— Se não fosse a atitude de pessoas como o Rafael, eu não estaria vivo hoje. Na época, mais de cinco mil pessoas se cadastraram, e isso é fruto dessa solidariedade — resume Bruno.
Compatibilidade é rara, lembra especialista
Encontrar um doador compatível é raridade - e na região da Serra, não é diferente, conforme a médica especialista em Hemoterapia e coordenadora da Agência Transfusional do Hospital Geral, Márcia Araújo Leite.
— É raro encontrarmos doadores na região, a chance é de um para 100 mil habitantes. Entre irmãos, a chance é de 30% e os não aparentados a situação é ainda mais difícil - seja pela origem europeia, que poderia tornar o tipo de doador mais incomum, ou por outro fator —afirma Márcia.
A médica lembra da necessidade de aumentar o banco de doadores - mas, segundo ela, é importante também manter os dados de cadastro atualizados.
— Também é importante que as pessoas saibam que a doação é totalmente segura. Não há prejuízo algum para o doador de medula óssea — explica.
Como doar
:: No Hemocentro de Caxias do Sul, o candidato preenche uma ficha com informações pessoais e submete-se à coleta de uma pequena amostra de sangue, de 5 ml. O sangue coletado é enviado para um serviço de referência, onde é realizado o exame de hispocompatibilidade (HLA), que identifica as características genéticas que podem influenciar no transplante. O serviço é realizado de segunda-feira a sexta-feira.
:: Esse exame/cadastro é incluído no Registro de Doadores de Medula Óssea (Redome) e fica disponível até que o doador complete 60 anos. Caso seja identificada a compatibilidade com um paciente que necessite de transplante, o doador será chamado para realizar exames clínicos e laboratoriais mais detalhados.
:: Se o paciente já é cadastrado no Redome, é necessário manter os dados atualizados, principalmente endereço e telefone. Em caso de mudança de informações, ligar para (21) 2505-5656, (21) 2505-5639 ou (21) 2505-5638.
:: São requisitos para doação de medula: apresentar documento oficial com foto e CPF e ter entre 18 e 55 anos de idade (incompletos).
:: Para cadastro de doador de medula óssea: o Hemocentro atende de segunda a sexta, das 8h30min às 17h. O telefone do Hemocentro é (54) 3290-4536 ou 3290-4543.
O que é medula óssea e como é feita a doação
:: A medula óssea é um líquido que ocupa o interior dos ossos, onde são produzidas as células do sangue (hemácias, leucócitos e plaquetas). Algumas pessoas desenvolvem doenças que podem comprometer a função da medula óssea, sendo necessário o transplante. Entre essas doenças, estão: leucemia, linfomas, mielomas, anemias genéticas e aplasia da medula óssea, entre outras.
:: O procedimento de doação é realizado em centro cirúrgico hospitalar, com uso de anestesia geral. Consiste em punções com agulhas finas e especiais na região da bacia. São retirados, no máximo, 10% da medula óssea _ o equivalente a uma bolsa de sangue. Os riscos para o doador são praticamente inexistentes e o único incômodo relatado por alguns voluntários é uma dor discreta no lugar da punção.
Fonte: Prefeitura de Caxias do Sul