A diretora da Escola Municipal Renato João Cesa, onde Naiara Soares Gomes estudava, vê uma preocupação maior dos pais em não deixarem os filhos sozinhos. Segundo Vanessa Reis dos Santos , outra mudança é que crianças do 1º e 2º ano do Ensino Fundamental só podem sair acompanhadas da escola, no bairro São Caetano, em Caxias do Sul. A instituição passou a trabalhar também sobre o tema do autocuidado, com os alunos e os pais, ensinando a não conversar com estranhos e a não deixar outros tocarem o corpo delas.
No entanto, tratar do tema com os pequenos permanece como um tabu. É o que explica a coordenadora da Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipave), professora Marivane Carvalho ao indicar que pais costumam se opor à abordagem da violência sexual com crianças.
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— O que a gente está fazendo um trabalho agora de orientar os pais para fazerem esse trabalho com os filhos. Converse com seu filho. Então, já que muitos não conseguiram (abordar o tema pela Cipave), eles estão fazendo o contrário. Estão fazendo assim: converse com seu filho sobre quem pode tocar no corpo dele, como é corpo dele. Então, está devolvendo para a família para ela trabalhar. Infelizmente, não são todos que trabalham.
Nesse sentido, psicólogos vão atuar voluntariamente em parceria com a Cipave para orientar os pais sobre o assunto. Para se ter uma ideia, no ano de 2018, 111 crimes sexuais foram registrados em Caxias do Sul contra crianças e adolescentes com menos de 17 anos, segundo a Secretaria de Segurança Pública. Quase metade deles foi contra crianças menores de 12 anos.
Cipaves vão trabalhar com os pais
Segundo a coordenadora da Cipave da 4ª Coordenadoria Regional de Educação (4ª CRE), com sede em Caxias do Sul, Marivane Carvalho Rosa, sempre que um acontecimento ou ato de violência impacta a sociedade, como o caso de Naiara, a equipe que trabalha na Cipave aproveita para trabalhar o assunto no ambiente escolar.
— Pensamos bastante, vimos com as escolas como elas estavam trabalhando, propomos algumas ações, mas ainda temos um certo tabu na sociedade. Como trabalhar a questão do abuso sexual? É muito complicado. É muito delicado. Apesar de entendermos que a forma de prevenção é tranquila. Quando trabalhamos a prevenção é como você é naturalmente. Ninguém está instigando a nada. Esta é a função da escola, mostrar a prevenção para o aluno — explica Marivane.
A Cipave foi informada por algumas escolas sobre pais que manifestaram contrariedade diante da abordagem desse assunto nas escolas com os filhos.
— Ninguém está ensinando algo que seja errado. Estamos falando do corpo, o cuidado com o corpo e que esse corpo é da pessoa e ninguém pode tocá-lo. É algo natural e precisa ser tratado de forma natural, não pejorativa. Temos que tratar com seriedade, com zelo — reforçou a coordenadora do programa.
Mas para que o trabalho alcance o resultado desejado, é preciso a participação de todos os atores do processo: aluno, pais e escola. Daí, a importância do entendimento e aceitação por parte dos pais. Por isso, neste ano, a Cipave vai mudar a proposta. A comissão vai trabalhar com os pais, para que eles tenham um olhar mais atento sobre os filhos, cuidem os indicativos dentro de casa. Também haverá atividades e capacitações com os professores para que enxerguem com mais clareza os indícios e também sobre formas de abordar a prevenção com as crianças e adolescentes.
Na prática, serão palestras com rodas de conversa com professores e orientações aos pais sobre que medidas tomar diante do comportamento dos filhos. Para escolas, já é de conhecimento de todos que é dever da instituição comunicar ao Conselho Tutelar caso suspeitos.
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