O calor excessivo dos últimos dias tem imposto a quem precisa sair de casa para trabalhar ou cumprir algum compromisso fora de casa um desafio a mais e um verdadeiro teste de resistência. Com temperaturas diariamente ultrapassando a casa dos 30ºC, andar pelas calçadas das vias centrais em meio ao concreto dos edifícios e junto a ruas asfaltadas ou de pedras irregulares tem sido penoso aos caxienses.
Mas, se engana quem pensa que fazer o trajeto em um ônibus do transporte coletivo urbano amenizaria esse calorão. Ao contrário. Um teste feito pelo Pioneiro em uma das linhas que circulam pela cidade na tarde desta quarta-feira apontou que a temperatura dentro do veículo era de 1ºC a mais do que na rua. Sem falar na sensação de abafamento que é maior no interior do coletivo do que ao ar livre. É que nenhum dos ônibus urbanos de Caxias tem ar-condicionado.
A reportagem encontrou a dona Ione Cardoso, 67 anos, em uma parada da Rua Pinheiro Machado, no Centro. Ela havia saído da casa onde mora, no bairro Cinquentenário, por volta das 13h. De lá, pegou um coletivo até o Centro e, 20 minutos mais tarde, esperava o segundo ônibus que a levaria ao destino, o médico com o qual a aposentada tinha consulta agendada no começo da tarde e cujo consultório fica na divisa dos bairros Jardim América e Madureira. Já na parada da Pinheiro, sob o abrigo, ela puxou o leque que trazia dentro da bolsa, onde também carregava uma garrafa d'água. O termômetro levado pela reportagem marcava 33,7ºC.
– Só assim para enfrentar esse calor – disse a aposentada, movimentando o leque para lá e para cá.
Embarcamos com ela. O coletivo estava praticamente vazio, mas o número de passageiros começou a aumentar algumas quadras adiante, nas paradas da Rua Bento Gonçalves. Mesmo assim, ficou longe da capacidade de 35 pessoas sentadas. O veículo parecia bem conservado e os assentos confortáveis. Mas, o equipamento que poderia tornar a viagem um pouco mais agradável não existia. Sem o condicionador de ar, o jeito é andar com as janelas abertas para, pelo menos, amenizar o abafamento. Dona Ione escolheu o banco bem da frente, no lado oposto ao do motorista. Ali não tinha janela. De leque em punho, ela seguiu por todo o trajeto sem dar descanso para o braço. Nesse momento, o termômetro portátil apontava 34,7ºC.
– Deveria ter ar (condicionado). Só sabem cobrar... A sensação é bem ruim, mas fazer o quê? – lamenta a idosa.
Enquanto isso, o medidor de temperatura que fica junto ao para-brisa do veículo atingido diretamente pelo sol oscilava entre 40ºC e 44ºC. Sentado alguns centímetros a frente do aparelho estava o senhor José Luiz Casal, 68 anos, motorista da linha Madureira. Ele contou que a maior parte dos 46 anos de profissão foi na área de turismo onde os ônibus são mais confortáveis e climatizados. Há três anos, enfrenta os verões ao volante do transporte público caxiense sem nenhum dispositivo que amenize o calor.
Ar condicionado não é, mas deve ser, requisito em concessão
De acordo com a empresa que tem a concessão do transporte coletivo urbano em Caxias, a Viação Santa Tereza (Visate), a frota que atende a cidade é composta por 320 veículos e nenhum deles tem ar-condicionado. O contrato da empresa com o município é de 2000 e vence no ano que vem. O documento não prevê a instalação dos aparelhos nos ônibus como requisito da prestação do serviço. Por outro lado, determina que atenda as necessidades da população mantendo o número de veículos em condições de segurança, conforto e asseio.
O assunto já foi pauta de reuniões da Associação dos Usuários de Transporte de Passageiros (Assutran) e de audiência pública sobre o serviço em Caxias em 2018. Segundo o presidente da entidade, Cassiano Fontana, o tema voltará à pauta neste ano, inclusive, na consulta popular que recolhe opinião dos usuários sobre o transporte e nas discussões sobre o lançamento de edital para a nova concessão.
– Independente da consulta, a diretoria da Assutran é favorável à colocação. Claro que isso acaba onerando a passagem, mas faz parte. Temos que defender o bem-estar do usuário – declara Fontana.
O Pioneiro tentou falar com os vereadores que compõem a Comissão de Desenvolvimento Urbano, Transporte e Habitação, mas nenhum deles atendeu as chamadas ao celular na tarde de ontem.
O secretário interino de Trânsito, Transporte e Mobilidade, Pedro Cogo, confirmou que a questão será debatida em audiência pública com a comunidade já que impactaria na tarifa.
– Estamos discutindo para o próximo edital, mas é importante colocar que o ar condicionado aumenta o consumo do veículo e, com certeza, essa conta será repassada para o usuário. Temos que fazer uma avaliação criteriosa, porque temos lutado para que a tarifa aumente o menos possível e estaremos acrescentando uma despesa. Estamos estudando custos e quanto impactaria para termos todos os ônibus ou a maior parte deles com ar-condicionado – disse Cogo.