Uma mulher é morta a cada duas horas no Brasil. O assassinato pela condição de ser mulher ocorre cada vez mais por motivações banais, que precisam de atenção do poder público e conscientização da sociedade sobre direitos iguais para homens e mulheres. Em Caxias do Sul, no ano passado, sete mulheres foram vítimas de feminicídio, que ocorre quando há perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino.
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Para tentar driblar estatísticas tristes e que crescem ano a ano, prefeituras da região criam iniciativas que dão exemplo de preocupação e precaução contra a violência feminina. São os casos de Carlos Barbosa, Farroupilha e Gramado.
Carlos Barbosa, por exemplo, destaca-se pela inovação diante do projeto Grupo Reflexivo com Autores de violência doméstica, lançado nesta semana e no qual não apenas vítimas recebem apoio da rede de assistência: os agressores também são alvo do programa. Isto porque, após as audiências em que os homens são comunicados da pena que cumprirão, eles passam a receber atendimento para que entendam a dimensão do dano que causaram à companheira. O primeiro atendimento é individual para que, depois, possa ser inserido em um grupo. A ideia é estimular o rompimento do ciclo de violência, trabalhando a responsabilização pelo ato de violência e, assim, prevenir novos ataques. Este é um importante passo para a estruturação da rede de enfrentamento da violência contra a mulher no município, instituída no ano passado, conforme a titular da Secretaria de Assistência Social e Habitação, Jéssica Dalcin Andrioli:
— A iniciativa é implementar uma mudança comportamental grande no agressor. Também poderemos identificar porque a agressão aconteceu, se existiu uso de álcool ou drogas, se há algum tratamento que possa reduzir as atitudes agressivas. Toda reflexão será acompanhada no grupo.
A ideia se assemelha bastante ao projeto HORA - Homens: Orientação, Reflexão e Atendimento, que existe em Caxias do Sul desde 2016. Dos primeiros 343 acusados que passaram pelo grupo na cidade, apenas dois haviam rescindido. Em Carlos Barbosa, município com pouco mais de 28 mil habitantes, a dificuldade é convencer as mulheres a relatarem a agressão e reconhecer que precisam de ajuda. Os 151 casos de agressão registrados em 2017 são um sinal de alerta, mas também mostram que mulheres estão criando coragem para denunciar. Em menos de três meses, 33 mulheres já registraram ocorrência na delegacia.
— Isso sempre existiu. A agressão não é novidade, só que ela sempre aconteceu de forma escondida por aqui. Nossa rede quer divulgar para a mulher que ela tem direitos, e onde ela pode buscar ajuda _ afirma Jéssica.
Farroupilha e Gramado com cartórios especializados
Após a mobilização da comunidade, Farroupilha contará com um cartório especializado para o atendimento de mulheres. É a alta demanda registrada por lá que corroborou com a necessidade de um serviço especializado. Em 2017, a Polícia Civil de Farroupilha registrou cerca de 500 ocorrências de violência, uma média de 41 casos por mês. Em Gramado, município vizinho conhecido pela vocação turística, mulheres agredidas também estão criando coragem de levar os casos à polícia: a cidade inaugura hoje o seu primeiro cartório feminino.
— Quanto menor a cidade, mais difícil fica para a mulher falar sobre a agressão que sofre em casa. A vergonha e o medo de denunciar, de ser reconhecida nas ruas, gera um problema grande. Com a delegacia, queremos que todas sejam melhor acolhidas — afirma a primeira-dama de Gramado, Bianca Bertolucci.
Bianca é uma das sete personalidades femininas gaúchas que recebeu ontem, da Assembleia Legislativa, o Troféu Mulher Cidadã. A atuação de Bianca é, justamente, voltada ao combate da violência feminina. A instituição do cartório é esforço dela e da equipe de assistência social que recebe as mulheres após agressões verbais ou físicas. A iniciativa surgiu após um aumento de 227% no número de casos em Gramado: dos 294 atendimentos prestados em 2016, foram pelo menos 963 no ano passado. O desejo de ter uma delegacia especializada persiste, adianta a primeira-dama, que tem outros planos para a rede de proteção à mulher que toma forma no município:
— Queremos também levar aos colégios a educação não-sexista, que educa principalmente os meninos para a não-cultura da violência. Isso terá impacto lá na frente, quando adulto, certamente.
OS CASOS
:: Farroupilha registrou cerca de 500 ocorrências de violência em 2017. É uma média de 41 casos por mês.
:: Carlos Barbosa atendeu a 151 casos de agressão em 2017 - ou seja: a cada dois dias, um caso é registrado.
:: Em Gramado, foram 963 mulheres agredidas durante o ano passado: mais que duas vítimas diárias.