Ao menos nove unidades básicas de saúde de Caxias do Sul estão sem pediatras para atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Em alguns casos, a situação persiste há anos, mas a falta de profissionais piorou recentemente em função da exoneração e demissão de médicos da rede pública.
Como justificativa para não preencher o quadro de servidores, a prefeitura alega que não houve interesse de candidatos no último concurso público para a contratação de pediatras. O concurso estava vigente até o ano passado. O Executivo também não conseguiu achar profissionais para os contratos temporários. O problema chega a ser uma contradição num país onde a pediatria é a segunda área com mais profissionais no país – só perde para a clínica médica, segundo o estudo da Demografia Médica no Brasil, de 2015.
A dificuldade de acesso a pediatras também ocorre na rede particular. Parte dos especialistas credenciados em planos de saúde não está agendando consultas para novos pacientes e outros estão deixando de atender ou reduzindo o número de atendimentos nos consultórios para se dedicar aos plantões em instituições privadas.
Para entender o quanto isso a afeta a população, a reportagem contatou 30 pediatras ligados a um dos planos de saúde de Caxias. Dos 30 médicos, oito informaram que não marcavam consulta para novos pacientes, 11 tinham horário disponível até o final de fevereiro, nove poderiam atender somente a partir de março e dois deles só tinham agenda para depois de abril. São sinais claros de que a especialidade não consegue absorver a demanda da cidade.
A principal razão para o baixo interesse de profissionais em atuar nesse mercado, como alegam alguns pediatras e instituições de classe, é principalmente a baixa remuneração, tanto na rede pública quanto na privada. Isso ocorre com os médicos que atendem em consultórios ou nos plantões pediátricos do SUS, os chamados pediatras generalistas.
— Não estão faltando pediatras no mercado. Faltam pediatras nos lugares em que os profissionais são mal remunerados, mas isso ocorre em qualquer área. Os valores pagos aos médicos hoje são ridículos. Não dá para querer que um pediatra mantenha um consultório com secretária, luz e água, recebendo R$ 70 ou R$ 80 por uma consulta, e isso sem contar os impostos. Também não dá para aceitar que um profissional se dedique à rede pública ganhando pouco mais de R$ 3 mil por 12 horas semanais — acredita Ércio Amaro de Oliveira Filho, diretor do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers).
Mara Ribeiro Mendes atende pequenos há 33 anos. Ela lamenta pela falta de valorização da especialidade e acredita que o interesse pela pediatria por parte dos novos médicos vem diminuindo nos últimos anos. Afirma que já ouviu de alunos do curso que a área de atuação não dá retorno, ainda mais se for levado em consideração o tempo de estudo. Depois da graduação, que normalmente dura seis anos, o aluno precisa passar por uma residência de três anos e, se optar por uma subespecialidade, ainda precisa estudar por pelo menos mais dois.
— O pediatra precisa estar disponível 24h por dia e não ganha nada mais por isso. Os pais se deparam com algum problema com o filho e claro que procuram o pediatra, seja a hora que for. Por isso os jovens médicos preferem áreas mais tranquilas. Pediatras criam um vínculo lindo com as famílias, mas é preciso muita dedicação — acredita.