O Carnaval de Caxias do Sul terminou de forma lamentável e escancarou, no coração da cidade, uma fragilidade que já dava sinais bem antes mesmo da festa ganhar as ruas: a folia precisa ser repensada pelos idealizadores e contar, de fato, com a parceria e liderança do poder público na concepção e organização da festa.
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Na noite de domingo (18), Leandro Machado, 19 anos, foi brutalmente espancado por um grupo de jovens na esquina da Rua Sinimbu com a Doutor Montaury, a poucos metros da Praça Dante Alighieri. A violência causou comoção, principalmente, após a divulgação de um vídeo que mostra as agressões.
Esse vídeo publicado circula amplamente pelas redes sociais desde a noite de domingo, dia 18. A autoria das imagens não é conhecida. O Pioneiro tentou encontrá-lo durante desta segunda-feira (19), mas sem sucesso.
Não foi o pior crime do Carnaval. Antes disso, na semana passada, um homem foi assassinado e outro permanece hospitalizado em estado grave após ter levado um tiro. Mas foram as cenas de selvageria no centro da cidade que indicaram as brechas que precisam ser reavaliadas para o próximo ano.
Apesar da lei ser clara, muitos adolescentes compraram e consumiram bebidas de álcool sem controle. A festa popular, que ganhou muito mais força neste ano, dependeu mais da vontade da iniciativa privada. A prefeitura, por sua vez, ficou distante.
O espancamento que fechou o Carnaval ocorreu após o Maracaxias, que reuniu foliões na Rua Alfredo Chaves na tarde e noite de domingo. Após os incidentes do final de semana anterior, a BM estava mobilizada para acompanhar a folia e fazer a dispersão da multidão. A Guarda Municipal também participou da operação. Não foi suficiente, infelizmente.
De acordo com o secretário municipal de Segurança Pública, Clóvis Juvenal Pacheco, no momento do espancamento, às 22h10min, a Brigada Militar e a Guarda Municipal concentravam o efetivo na saída do Maracaxias.
— A Guarda estava com seu efetivo máximo junto ao evento. Ali, estávamos aguardando que as pessoas se dispersassem — declara.
A estratégia foi adotada após os eventos da última terça-feira (13), quando, depois do término do Carnaval, diversos grupos de jovens atiraram garrafas de vidro na via.
— Se deliberou a diminuição de tempo do evento (que acabou às 21h) e um aumento de tempo que o nosso efetivo permaneceria ali — explica Pacheco.
Por isso, o ponto do crime, bem próximo à Praça Dante Alighieri, ficou temporariamente desassistido.
— Ao redor do evento, onde estava o maior fluxo de pessoas, era o ponto mais estratégico, onde tinha maior possibilidade de ter algum problema. Se fosse olhar por esse lado (policiar a praça) teríamos que levá-los (os foliões) até em casa — ironiza o secretário.
Mesmo se tratando de um fato de menor gravidade, se comparado às ocorrências no Largo da Estação Férrea, o espancamento choca pela brutalidade. As imagens impressionam até quem está acostumado a combater a criminalidade na cidade.
— Sabemos que a violência está presente, mas também ficamos chocados (com o vídeo). Foi um ato de selvageria. Não parece que seja ao acaso. Provavelmente é resultado de uma rixa anterior, envolvendo grupos rivais, e não um caso relativo ao Carnaval — pondera o comandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), major Jorge Emerson Ribas.
O oficial ressaltou que a Brigada Militar estava mobilizada para dar segurança ao Carnaval.
— Estamos nos sentindo frustrados com o ocorrido. Todos os policiais envolvidos estavam imbuídos no sentimento de fazer o evento transcorrer bem — reforça.
De acordo com Ribas, o registro das câmeras na rua mostra que viaturas do Comando de Operações Especiais (COE) da Brigada passaram pelo local do espancamento menos de 10 minutos antes da briga.
— É difícil para nós ter controle sobre um grande público em local aberto e de via pública — lamenta.
Prefeitura quer reforçar ações preventivas para próximos eventos
Apesar de acreditar que a atuação da prefeitura e da BM constituiu exemplo de parceria que deu certo entre as forças de segurança, Clóvis Pacheco quer promover uma reunião com as secretarias de Trânsito e do Urbanismo para avaliar no que é possível melhorar para os próximos eventos.
— Estou solicitando uma reunião interna para ver onde nós falhamos. Alguma coisa houve, e nós podemos melhorar ainda mais a qualificação — aponta.
Além de editar um decreto para regrar eventos em espaços públicos, o secretário pretende empreender ações preventivas para o próximo Carnaval.
— Houve problemas pontuais, inclusive com ambulantes vendendo bebidas alcoólicas na rua, que tecnicamente teriam que ter autorização. E com garrafas, copos de vidro, que são perigosos. Para o próximo Carnaval, possivelmente teremos que disciplinar a área antes da chegada do público — antecipa.
A secretária do Urbanismo, Mirangela Rossi, diz que três profissionais atuaram na fiscalização da venda de bebidas alcoólicas por parte de ambulantes. Ninguém foi autuado, segundo ela.
— Houve fiscalização sim, mas não do jeito como gostaríamos. Conversamos com o pessoal do Zanuzi, com os ambulantes e tentamos controlar a situação. Não houve autuação porque não queríamos confusão. Só orientamos para que assim que o bloco passasse, que os ambulantes saíssem — detalha Mirangela.