Formar um grupo de trabalho capaz de pressionar o Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi a única proposta sugerida durante reunião com vereadores de Caxias do Sul para tratar do caso da família Magnabosco, que cobra indenização milionária por terreno invadido na década de 1980 e que deu origem ao bairro Primeiro de Maio. Na semana passada, o processo, que se arrasta há mais de 30 anos, culminou com o sequestro de R$ 69 milhões de contas da prefeitura. O montante foi reservado enquanto recursos para retirar o município como réu da ação e questionando o valor total da dívida ainda tramitam no STJ.
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O encontro dos parlamentares, que ocorreu na manhã de segunda-feira após a convocação do presidente da Câmara, Felipe Gremelmaier (PMDB), contou com a presença de procuradores das três últimas gestões do município: Vanius Corte (administração Pepe Vargas, PT), Lauri Romário Silva (duas gestões de José Ivo Sartori, PMDB) e Victório Giordano da Costa (Alceu Barbosa Velho, PDT). Não ficou definido, no entanto, quem integrará o grupo que vai ao STJ nem quando isso deve ocorrer. Em manifestação, o vereador Gustavo Toigo (PDT) sugeriu que a comitiva contasse com o prefeito Daniel Guerra (PRB), o governador José Ivo Sartori (PMDB), o deputado Pepe Vargas, o ex-prefeito Alceu Barbosa Velho, além de deputados e senadores gaúchos.
A ideia, no entanto, conforme alerta Costa, pode trazer prejuízos ao município:
– Existe um risco ao tentar pressionar por uma decisão, pois julgador não gosta de ser pressionado. E, daí, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) pode simplesmente acatar o parecer do relator, que é favorável aos credores. Mesmo que essa alternativa seja, no momento, a mais visível, é preciso cautela para não complicar mais ainda a situação.
Para Vanius Corte, a pressão política pode, sim, acelerar o julgamento, antes que sejam feitos outros sequestros de valores.
– O processo chegou a um patamar preocupante, com o bloqueio de contas e visíveis prejuízos à cidade. Então, por mais que já se tenha procurado por diversas vezes o STJ, dialogar é sempre a melhor forma. Esse é o momento de unir as forças vivas do município e mostrar a discordância com o que está acontecendo. É preciso pressionar por uma rápida solução. Esperar pelo Judiciário não será bom – diz Corte.
Em comum, todos os procuradores concordam que o processo tem inconsistências jurídicas, além de garantirem que a ação indenizatória teve o acompanhamento correto desde o início.
– Perdi as contas de quantas vezes fomos até Brasília para tratar do processo do Magnabosco. Esse processo começou em 1983 e as idas até lá também fizeram parte das outras gestões. Inclusive, grupos de trabalho foram formados sempre em busca de uma solução. Temos convicção de que assim que ação indenizatória for julgada, ela será procedente – conclui Lauri Romário Silva.
O parecer da reunião será encaminhado ao prefeito Daniel Guerra (PRB) ainda nesta semana. Enquanto isso, a atual procuradora-geral adjunta, Ana Claudia Schittler, aguarda a análise do recurso que contesta o sequestro dos R$ 69 milhões.
O QUE DISSERAM
Vanius Corte
"Esse processo é a maior indecência jurídica que eu já vi na vida. Nos embargos infringentes (recurso que cabe quando não for unânime o julgamento proferido pelo tribunal, em apelação), eles transformaram a ação de reivindicatória em indenizatória, já que, para a Justiça, não dava mais para tirar as pessoas da área ocupada. Com uma ação indenizatória, decidiram colocar como réu quem tinha dinheiro, ou seja, o município. Se fosse colocado às famílias, certamente elas não iriam pagar por falta de condições. Ou seja, o município nunca havia sido citado porque o objetivo não era indenizar, era restituir. Em 2003, teve embargos declaratórios (recurso dirigido ao juiz da causa, para que esclareça algum ponto obscuro ou contraditório na sentença) e, em 2004, é que houve a publicação desta decisão que ocasionou toda essa situação que se vive hoje. A gente não sabia que tava lidando com algo tão pesado."
Lauri Romário da Silva
"Temos de ter muito cuidado pois estamos falando de um processo que já não é mais nosso. Quando assumi, já tínhamos conhecimento do que o processo significava para o município. Em 2005, quando o recurso especial foi atendido, o processo teve um curso bem favorável, pois o ministro Humberto Martins entendeu que o encaminhamento era positivo. Mas, para a nossa surpresa, o ministro morreu e quem assumiu o caso foi a ministra Eliana Calmon. Ela se fechou em seu gabinete e tornou o diálogo muito difícil. No andamento do processo, percebemos que a situação que se avizinhava trazia grandes perigos. Mas, em momento algum do processo, a procuradoria se descuidou. Só quem conhece o caso sabe como todos os procuradores trabalharam para solucionar a ação."
Victório Giordano da Costa
"É nítido que há uma irregularidade processual. É flagrante. Estive cinco vezes em Brasília conversando com a ministra que hoje está com o caso na mão (Suzete Magalhães). Em outubro do ano retrasado (2015), ela havia dado a esperança de que o processo seria julgado até março, mas nada aconteceu. O nosso pedido era de que se fizesse andar o processo, que o julgamento saísse logo. Na época, a ministra se mostrou surpresa com o andamento do caso, porém, nos surpreende que ela não tenha dado o voto a favor. Chegamos à situação de hoje por mera responsabilidade da Justiça. Tudo que se podia ser feito, foi feito, em todas as gestões de procuradores que fizeram intervenções nesse processo."