Faz pouco mais de seis meses que o vitivinicultor Arlindo Luiz Dallegrave, 77 anos, soube da existência de uma carta redigida por Antonio Dalle Grave, irmão do tataravô italiano. Em julho de 1876, o primeiro imigrante da família escreveu aos pais a fim de dar satisfações sobre a longa viagem transoceânica e projetar o futuro. Disse que havia comprado um lote no Sul do Brasil e ele era fértil, que o ar e a água eram bons, além de convidar os familiares a saírem da Itália.
Quase 140 anos depois da chegada dos primeiros imigrantes italianos, Arlindo ainda se comove por ter visitado entre março e abril os recônditos de onde os parentes saíram, em Callibago de Santa Giustina, na Itália, e ter acesso ao documento pelas mãos da diretora do museu do Feltre. Talvez porque ele ainda trabalhe na terra que tanto inspirou os antepassados, onde cultiva uvas desde sempre numa propriedade em Loreto.
- Meu pai foi agricultor a vida inteira. É interessante notar que, se os imigrantes não conseguiram realizar o próprio sonho, a terceira e a quarta gerações estão usufruindo do progresso gerado por eles - avalia.
Rapidamente, os imigrantes viram o surgimento da indústria e a transformação das cidades - a Serra é formada por 47 municípios, sendo que a região metropolitana (instituída pela lei complementar estadual nº14.293 em 2013) tem 13 cidades. Até quem não tem uma ideia tão clara do futuro, nem é descendente de italiano, está inserido na impressão de Dallegrave.
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A região virou polo de atração de migrantes, como a família de Mateus Rocha Soares, 13 anos, mineiro de Uberaba, que vive em Caxias do Sul há oito anos, desde que a mãe e os irmãos vieram em busca de melhores condições de vida.
- No começo era estranho, mas agora acho legal morar aqui - conta Mateus, que reside com a mãe, um irmão, um irmã e o sobrinho numa casa de alvenaria na Vila Amélia, em Caxias.
Estudo intitulado Migrações recentes no Município de Caxias do Sul, coordenado pela professora Vania Herédia, da UCS, aponta que Caxias foi a cidade que, entre 2000 e 2010, mais ganhou população no Estado, com aumento de 75.145 habitantes (20,85%), segundo Censo 2010, crescimento também observado em Bento Gonçalves (17,26%) e Farroupilha (15,06%). Reconhecida pelo potencial industrial, a Serra experimenta alguns gargalos no que diz respeito ao desenvolvimento a médio prazo.
A fim de refletir sobre o que está por vir e inspirada por cidades que já tornaram-se referências em diferentes áreas, a série A Serra que Queremos aponta alguns caminhos para Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Farroupilha - três principais PIBs e cidades mais povoadas da região - em 2050.
Pedro Henrique Bica Vieira, 11, nasceu em Caxias e vive com a avó e dois tios numa casa no Loteamento São Gabriel, zona sul de Caxias. O futuro melhor, para ele, passa necessariamente pela conquista de uma profissão - quer ser desenhista - porque acha que, assim, sendo o primeiro da família a cursar uma faculdade, pode melhorar de vida.
Já Emanuelle Bisutti Gardini, oito, moradora de Farroupilha, sonha morar em Orlando (EUA). Amanda Dallé Balotin, oito, não chega a pensar em viver no Primeiro Mundo. Para ela, que reside com avós paternos, pais e irmão caçula em uma propriedade rural na Linha 40 da Graciema, em Bento Gonçalves, mudar-se para a "cidade" já é realização suficiente.
- Tenho muita curiosidade sobre como será meu futuro - relata a bento-gonçalvense.
As crianças referenciadas nesta reportagem serão apresentadas ao longo desta semana, durante a publicação da série.