Os números das Surdolimpíadas, evento realizado entre os dias 1º e 15 de maio em Caxias do Sul, foram apresentados em entrevista coletiva na Universidade de Caxias do Sul (UCS), nesta sexta-feira (3). O valor total da dívida com os fornecedores é de R$ 12.199.196,14. No montante, já está descontado uma verba superior a R$ 2,4 milhões que o Comitê Organizador tem a receber e será repassado aos credores.
Os dados eram aguardados com ansiedade pelos prestadores de serviço que se envolveram na festa esportiva, que também imaginavam ter uma resposta sobre quando e como receberiam os débitos em aberto, o que não foi definido. Muitas empresas ainda têm valores elevados para receber. Em alguns casos, a quantia devida ultrapassa o valor de R$ 1 milhão.
Segundo o CEO das Surdolimpíadas, Richard Ewald, uma série de fatores contribuíram para dívida, como a queda no do número de países participantes, a recuperação do real frente ao dólar, aumento do diesel e até fatores climáticos.
— A organização vinha com planejamento de novembro com um cenário bastante positivo, com um número de atletas alto e fez um dimensionado para aquele número. Alguns fatores como retorno da pandemia e a guerra no Leste Europeu causaram a desistência de países. Ainda houve a suspensão de dois países (Rússia e Belarus). Assim, um contingente muito grande de pagantes que financiavam o evento foi degradado e, nos últimos dias antes da abertura, somos surpreendidos com um número baixo. Aí nasce o nosso problema — explicou o diretor-executivo.
A grande fonte de financiamento das Surdolimpíadas são as taxas de inscrições pagas pelos participantes e o valor custeado de hospedagem de cada delegação. Em novembro, o Comitê projetava mais de 6 mil participantes, com câmbio de R$ 5,20 (para cada dólar) e uma arrecadação de R$ 46 milhões. Contudo, o cenário real foi de 3.983 participantes, um câmbio de R$ 4,91 e uma arrecadação de R$ 29 milhões. Para deixar a conta ainda mais no vermelho, o Time Brasil não teve custos com hospedagem. Outros 12 países também não pagaram o comitê.
Números resumidos das finanças da edição em Caxias:
RECEITA: 33.788.593,10
DESPESA: 45.987.789,24
SALDO: - 12.199.196,14
Soluções propostas
Muitos empreendedores estavam presentes na coletiva para ouvir as respostas do comitê. Todos querem uma solução para a dívida. Diversas frentes foram criadas para buscar recursos. Os organizadores focam o pedido de ajuda junto aos governos municipal, estadual e federal. Agendas com os entes públicos serão realizadas, conforme o CEO dos Jogos.
— Primeiro de tudo, os movimentos são no sentindo de mitigar os impactos econômicos na vida de todos os envolvidos. Estamos preocupados com isso e estamos levando ao poder público, governo municipal, estadual e federal formas de aportar recursos complementares extraordinários. Não é um simples prejuízo. Foi gerado por força maior — disse Ewald.
Todos os contratos foram formalizados com a Sociedade de Surdos de Caxias do Sul, mas a entidade sem fins lucrativos não tem condições financeiras que arcar com o prejuízo. Ficou acordado no encontro que, semanalmente, os credores receberão um resumo dos avanços e, a cada 15 dias, será marcado um encontro presencial.
— Vamos alimentar os credores semanalmente com notícias, pois a cada dia temos evoluções. Semanalmente teremos um resumo e a cada 15 dias teremos um encontro para decidir os rumos. Precisamos combinar como vamos aliviando, quem vem primeiro e depois. São regras que precisamos ajustar— afirmou Richard.
O Comitê Internacional de Esportes para Surdos (ICSD), promotor do megaevento, não tem recursos para bancar a dívida de R$ 12 milhões. Entretanto, a entidade irá buscar recursos com órgãos do Exterior, como o Comitê Olímpico Internacional (COI).
— Não temos um aporte direto deles (ICSD), pois não possuem capital para isso no momento. Mas se comprometeram em buscar nas fontes internacionais aportes, inclusive com Comitê Olímpico Internacional (COI), onde já tem uma reunião marcada. Vamos buscar a mesma ajuda que fez ao Japão, em Tóquio, no tempo da Olimpíada — argumentou Ewald.
Confira ações que estão sendo executadas, segundo a organização das Surdolimpíadas:
Junto ao governo federal será solicitado:
- Ajuda no pagamento dos custos do antidoping;
- Pagamento dos custos do Time Brasil;
- Venda dos alvos ainda não recebidos para criação de um Centro de Excelência de Tiro Esportivo;
- Reunião com o Ministro da Cidadania, Ronaldo Vieira Bento;
Junto ao governo estadual:
- Captação via projeto Pró-Esporte;
- Decreto especial do governador para extensão de prazo de captação do ICMS;
Junto ao governo municipal:
- Ajuda emergencial da prefeitura, com reconhecimento da Câmara de Vereadores, pelo legado material que ficará para a cidade;
Sindicato teme fechamento de negócios
Segundo o CEO das Surdolimpíadas, o principal setor com dívida é o de transportes. Na sequência aparecem publicidade, comunicação, televisionamento, hotelaria e gastronomia. O presidente do Sindicato Empresarial de Gastronomia e Hotelaria da Região Uva e Vinho (Segh), Marcos Ferronatto, alerta para um cenário crítico. A dívida com o setor é de quase R$ 5 milhões. Ferronatto teme fechamento de negócios.
— Nós estamos buscando, de imediato, um aporte financeiro para as empresas, pois vêm de uma pandemia e a situação é muito delicada. Elas precisam de um aporte para não fecharem as portas. Nós precisamos de um valor razoável. Entre gastronomia e hotelaria, beiram os R$ 5 milhões os valores pendentes, em oito municípios. São na faixa de 20 hotéis e oito restaurantes de porte maior. Tem outros menores que foram envolvidos, mas receberam. Por causa das Surdolimpíadas, nenhuma empresa fechou, mas relataram uma situação crítica — argumentou o presidente.
O empresário do setor de transportes Gil Husken acompanhou todo relatório apresentado na Sala Florense da UCS. Ele cobrou a falta de garantias financeiras para a realização de um evento deste porte.
— Todos foram ludibriados, não tem nem nexo, pois como uma empresa com capital social baixíssimo vai fazer um evento desse meio sem aporte financeiro ? Não tinha garantia nenhuma. O próprio CEO disse indiretamente. Isso não se faz, muito menos com nome de um município e Estado — questionou o empreendedor, que não acredita em uma solução:
— Já sabíamos que não tinha solução e não tem solução. Vai virar em pizza, lamentavelmente. Com certeza (será judicializado), só quero ver se vão pagar — finalizou.