Não faltam bons motivos para brindar e comemorar o Dia do Vinho Brasileiro, lembrado neste domingo (5). Mais do que uma data para colocar a bebida símbolo da Serra gaúcha em evidência, o atual momento é analisado pelo setor como inédito em duas décadas. O investimento na agricultura, resultando em mais qualidade da uva, além dos avanços no enoturismo e as mudanças no hábito de consumo das pessoas são alguns dos caminhos elencados como impulsionadores de um cenário animador. E se o vinho brasileiro vai bem, a Serra é referência. A região é a principal fornecedora da bebida, correspondendo a 90% da produção gaúcha, que, por sua vez, responde por nove entre 10 garrafas vendidas em todo o país.
Entre os principais fatores do melhor momento da bebida, segundo o presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Deunir Argenta, está o investimento nos vinhedos, resultando em uvas de melhor qualidade e que impactam diretamente no resultado do vinho produzido no país. Nesse período, de acordo com ele, os produtores da região adotaram novas técnicas de cultivo da uva e também melhorias no tratamento do solo. Além disso, ele lembra que a bebida passou por uma série de transformações ao longo dos anos que garantiram melhorias em sua elaboração, principalmente com estudos aprofundados sobre o terroir.
Essa mudança foi sentida, com mais ênfase, com a chegada de uma nova geração às propriedades, provocando um choque de culturas, resultando em mais pesquisa, tecnologia e lucratividade. Ou seja, quem experimentou o vinho brasileiro há mais de duas décadas, por exemplo, não pode mais dizer que conhece a bebida porque, atualmente, a qualidade está superior.
— Podemos seguramente dizer que, literalmente, colhemos o que plantamos. Avançamos como nenhum outro país do mundo em pouco tempo e os anos mais recentes foram decisivos para isso. Temos tecnologia de ponta do vinhedo ao ponto de venda. Aliás, as técnicas adotadas no manejo do vinhedo têm sido decisivas para a qualidade das uvas que cultivamos. Evoluímos muito nesse aspecto e, claro, com uma matéria prima de melhor qualidade, obviamente fica mais fácil termos vinhos e espumantes de excelência. Aprendemos com cada terroir. Isso levou tempo, investimento, paciência e conhecimento, mas hoje estamos muito mais maduros — analisa Argenta, que está à frente da principal entidade representativa do setor.
Além do investimento na produção, o fator pandemia acelerou uma mudança no comportamento do consumidor, colocando o vinho como a “bebida da quarentena”. Somente em 2020, durante o isolamento social, o consumo de vinho entre os brasileiros aumentou quase 20%. Mais presente nos lares, a produção nacional também teve alta, que foi de 32,4%, quase 10% a mais do que os importados.
Argenta entende que a bebida ficou mais democrática e acessível, podendo ser adquirida até por telentrega. Fatores externos, como a alta do dólar, por exemplo, tornaram os rótulos importados mais caros e também distantes da taça dos brasileiros.
— Em casa, diante de restaurantes fechados, o consumidor olhou mais para o vinho nacional no supermercado e na internet, provou e aprovou. As vinícolas que não tinham e-commerce, aceleraram o processo e passaram a ter. Muitas começaram a vender pelo WhatsApp. Assim, a relação com o consumidor ficou muito mais próxima e a relação custo benefício, diante do aumento do dólar, também contribuiu — observa.
Todas essas características, segundo Argenta, permitiram que o vinho brasileiro rompesse a barreira dos dois litros per capita de consumo no país. Atualmente, segundo dados da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), é como se cada brasileiro consumisse 2,4 litros de vinho por ano. Se o consumo cresce, o faturamento do setor acompanha o movimento. Em abril deste ano, segundo a entidade, a venda de vinhos finos atingiu 1,2 milhões de litros, superando em 34% o volume comercializado no mesmo período de 2021. A expectativa é que o comportamento se mantenha em alta com os dias frios do outono e com a chegada do inverno, no fim deste mês.
— O vinho foi o grande companheiro do brasileiro durante a pandemia do Coronavírus. Ajudou a aproximar as pessoas, que mesmo em casa, chegavam a fazer degustações online. É uma bebida para ser degustada, a fim de sentir seus aromas, convidando a harmonização. Sim, está mais democrático, seja pela diversidade, seja pelo preço ou pela acessibilidade.
Apesar do protagonismo e por concentrar as marcas mais tradicionais, a Serra é uma das 26 regiões produtoras de vinho, que estão espalhadas em 10 estados brasileiros. Segundo a Uvibra, Santa Catarina e Minas Gerais vêm se destacando e existem iniciativas de vinho sendo elaborado até mesmo em Brasília, revela Argenta. O Nordeste brasileiro também se mostrou como terra fértil com o sistema de irrigação viabilizado pelo Rio São Francisco. No Rio Grande do Sul, a Campanha tem se destacado no cultivo de cepas tintas como a Tannat e a Touriga Nacional, por exemplo.
Vinho no Brasil
Segundo a União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), a seguir estão listados os motivos que traduzem o bom momernto do vinho no país:
- Investimentos do vinhedo ao ponto de venda.
- Mais qualidade.
- Diversidade de estilos com o surgimento de novas regiões produtoras.
- Melhor distribuição e acessibilidade.
- Preço justo.
- Avanços no enoturismo.
- Mudança no hábito de consumo: foram decisivos para este avanço que permitiu, inclusive, romper a barreira dos 2 litros per capita de consumo no país.
Enoturismo cresce e gera empregos
Outro fator observado pela Uvibra como impulsionador do vinho brasileiro é o enoturismo. A oportunidade de viver novas experiências e entender a cultura do vinho tem atraído cada vez mais turistas de todo o país para a região. É a chance de caminhar entre as parreiras, vendar os olhos para degustar o vinho, harmonizar a bebida com a gastronomia, fazer um piquenique com produtos coloniais, colher e pisar uvas, entre outras vivências disponíveis na região.
Somente na Vinícola Aurora, de Bento Gonçalves, uma das pioneiras no enoturismo na Serra, no primeiro trimestre deste ano, a empresa recebeu 44,8 mil turistas brasileiros, americanos e ingleses em suas três unidades, sendo duas delas em Bento e outra em Pinto Bandeira. O número representa 13% a mais em relação ao mesmo período de 2019, quando 39,6 mil pessoas estiveram na Aurora, e 75% superior a 2021, em que foram registrados 21,9 mil visitantes.
A expectativa é de mais movimentação nos próximos meses, já que, historicamente, o inverno representa mais movimentação, superando períodos como a vindima (entre janeiro, fevereiro e março) e também o final do ano (novembro e dezembro). Até o mês de julho, por exemplo, não há mais domingos disponíveis para visitação na matriz, segundo a gerente de turismo da Aurora, Ana Maria De Paris Possamai.
— Recebemos, principalmente, os gaúchos. É um público que gosta de vinho. Vem também turistas de São Paulo e do Nordeste, já que somos parceiros de agências de turismo de Gramado e Canela. O público é muito diverso e nos exige preparação: recebemos desde um leigo até a um expert em vinho, o que nos fez pensar em experiências novas. Mas, a maioria, é um visitante que está se aventurando, começando a conhecer o mundo do vinho. Cada vez mais elas estão vindo com interesse, com muitas perguntas — analisa Ana Maria, que está há 12 anos na função.
Com o movimento voltando aos patamares pré-pandemia, foram criadas 10 vagas de empregos e há perspectivas de ampliação de outros novos postos de trabalho no setor de enoturismo e também previsão de ampliação dos espaços, ainda em análise e planejamento junto ao poder público de Bento Gonçalves.
Turistas com sede de descobertas
Um compromisso em Porto Alegre neste sábado (4) foi a oportunidade encontrada pelo casal César Daurte e Dienifer Samara da Silva para antecipar a viagem e passar a semana em Bento Gonçalves. Na quinta-feira (2), eles chegaram de Montenegro e visitaram a vinícola com o objetivo de conhecer os diferentes tipos de vinho durante a degustação oferecida pela empresa.
— A região é uma maravilha e eu, apesar de não ser um expert no assunto, sempre fui um apreciador de vinhos. Gosto de diversificar, conhecer coisas novas. Eu prefiro o seco, mas ela (Dienifer) o suave. Vamos adaptando para que possamos curtir o que o vinho nos oferece — conta ele, que é agente penitenciário.
Para Dienifer, que é uma microempresária, a bebida foi importante em uma manhã gelada e cinzenta na região.
— Além de ser ótima, ajudou a aquecer o corpo do frio — diverte-se.
Quem veio de mais longe foi a família do dentista Jonas Bortolini, 46 anos. Ele, a namorada Stephany Freitas, 33, e os filhos Benício, 9, e Isabella, chegaram na região vindos de Itaquirai, no Mato Grosso do Sul. Ele, que é gaúcho de Tuparendi, contou que é apreciador de vinhos argentinos, devido à proximidade da cidade com o país vizinho e onde visita frequentemente.
— Faz muito tempo que queríamos conhecer aqui. Apesar de ter nascido no estado, nunca tinha vindo na Serra. Por questões de morar perto, acabo sempre comprando vinho argentino, mas sinto que é um bom momento para apreciar o que é feito aqui também. Não me considero uma pessoa com um paladar refinado que saiba diferenciar tanto os rótulos, mas quero valorizar a nossa produção e por isso quis conhecer a vinícola e saber como é feito o vinho — conta.
Exportar está no horizonte de vinícola caxiense
À frente da vinícola Dom Affonso, de Caxias do Sul, o também presidente da Associação Brasileira de Enologia, André Gasperin, entende que o vinho ficou mais fortalecido nos últimos anos. Ele atribui esse momento ao interesse dos consumidores, que estão mais dispostos a conhecer os rótulos nacionais e experimentar vinhos de diferentes categorias.
— Isso é bom porque consolida o produto no mercado, fixa aqui no país e também no exterior, já que muitas vinícolas da região possuem presença forte em outros países — analisa.
Segundo ele, a facilidade do acesso à bebida é o maior ganho do setor com a pandemia. Na vinícola, que completa quatro décadas neste ano, há previsão de investimentos na visitação. Depois de exportar o suco de uva, o planejamento agora é levar a marca de vinhos também para outros países.
— Estamos mais focados no suco, temos contatos para exportar o vinho, mas é algo que vamos fazer com planejamento, trabalhando algumas marcas exclusivas para o mercado externo, aproveitando novos horizontes — relata.
Segundo a Uvibra, 2021 fechou com um aumento de 83,25% nas exportações de vinhos brasileiros se comparado a 2020. Os 8.132.342 litros, ou seja, 10,8 milhões de garrafas, que saíram do Brasil nos 12 meses chegaram a 53 países, com destaque para o Paraguai, Haiti, Rússia, China e Estados Unidos.
Data é comemorada com promoção de vinho grátis
O Dia do Vinho Brasileiro é comemorado pelo setor e também pode representar um bom negócio para os consumidores. A União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra) vai brindar seis apreciadores com vinhos brasileiros durante um ano inteiro.
Serão 72 garrafas de vinhos e espumantes, seis por mês, de diversas regiões produtoras do país para cada contemplado. Para participar da campanha, basta responder a pergunta ‘Se tem vinho brasileiro, tem o quê?’ em um vídeo de até um minuto, postar nas redes sociais, marcar a @uvibra_ e usar a hashtag #diadovinhobrasileiro.
Os autores das seis respostas mais criativas receberão os rótulos em casa de junho de 2022 a maio de 2023. A promoção segue até o dia 5 de junho. O time que vai avaliar os vídeos é formado por Suzana Barelli, Ricardo Castilho, Rodrigo Ferraz, Pri Matta, Juan Alba e Ivane Fávero.
A promoção é uma boa dica para quem aprecia vinho e deseja conhecer e degustar a diversidade de terroirs brasileiros, única no mundo. Muito dessa produção será contemplada nessas 72 garrafas que estarão sendo enviadas em 12 meses. São vinhos e espumantes de diferentes estilos e categorias. Muitos deles com medalhas conquistadas e reconhecidas internacionalmente pela sua qualidade. Até o final de 2021, os vinhos e espumantes brasileiros já haviam arrematado mais de 5.900 premiações em concursos mundo afora.
A divulgação dos seis sortudos será feita no dia 5 de junho nas redes sociais da Uvibra, que convida as vinícolas, confrarias, enólogos, sommeliers e apreciadores em geral a compartilhar a campanha em suas redes sociais e brindar o Dia do Vinho Brasileiro.