A Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale) lançou nesta quinta-feira (31) um abaixo assinado que pretende direcionar ao prefeito de Bento Gonçalves, Diogo Siqueira, dois pedidos: um pela manutenção de Marciano Batistelo como subprefeito do distrito e outro pela manutenção do Conselho Distrital e do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (Compahc). O documento é resultado das movimentações que ocorreram depois que o Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos decidiu barrar dois empreendimentos de grande porte no roteiro turístico.
No texto, a Aprovale descreve que Batistelo, morador e empreendedor do Vale, tem sido alvo de pressão institucional e assédio moral de forma avassaladora. “Porém é justamente neste momento em que contamos com o apoio sensato do Sr. Prefeito para nos amparar moral e legalmente, recusando veementemente seu pedido de demissão”, escreve no documento o presidente da Aprovale, Sandro Valduga. Batistelo tem sido pressionado para deixar o cargo, segundo a entidade.
O abaixo assinado menciona ainda que o Conselho Distrital e o Compahc são canais para a livre manifestação sobre o território do Vale: “Antes de ser um destino turístico, esta é a região da nossa cultura vitivinícola, terra de nossos antepassados e de nossas futuras gerações. Rogamos ao Sr. Prefeito Diogo jamais permitir que nossa voz seja silenciada ou nosso voto seja amputado”.
Na segunda, o vereador Anderson Zanella (Progressistas) apresentou na Câmara um projeto de lei que retira o poder deliberativo (de tomar decisões) do Compahc e o torna consultivo (terá apenas a opinião consultada). Além disso, a Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento e Bem-Estar Social, presidida por Zanella, aprovou um pedido encaminhado à prefeitura e ao Ministério Público para que a reunião em que os dois empreendimentos foram barrados pelo Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos se torne sem efeito, o que implicaria no cancelamento das medidas tomadas. A comissão aprovou ainda a solicitação de cancelamento de alvarás de construção do Castelos do Vale, por considerar que tem características semelhantes às dos empreendimentos vetados.
O abaixo assinado está disponível em estabelecimentos instalados no Vale dos Vinhedos e na Sede da Aprovale. O documento pode ser assinado até domingo (3) e será entregue ao prefeito na segunda-feira (4).
Entidade também divulgou nota
O abaixo assinado foi divulgado juntamente com uma nota da Aprovale, em que apresenta a defesa do voto contra os empreendimentos na área de Denominação de Origem do roteiro enoturístico. Confira os pontos levantados pela entidade na nota:
- os projetos apresentados apresentaram alto índice de pontos negativos no estudos de impacto apresentados e por este motivo foram recusados tecnicamente pelo Conselho Distrital, com um voto da Aprovale em total de 8 (negativos) a 2 (positivos);
- os projetos apresentados não foram apreciados como incorporação imobiliária e sim como hotelaria, portanto solicitamos que os estudos de impacto sejam refeitos sob esta personalidade jurídica, dado que os índices de impacto diferem entre tais atividades;
- os projetos excedem em escala (de construção e de operação) à infraestrutura disponível no Vale dos Vinhedos e reduzem a área destinada à atividade vitivinícola dentro da demarcação da Denominação de Origem;
- o IPURB atendeu a ofícios de um particular e um parlamentar para liberar a divulgação de atas e audios do Conselho sem que estes estivessem devidamente finalizados e aprovados por seus membros. Independentemente, o acesso à íntegra dos áudios, por si só, comprova a ausência de qualquer inconformidade no processo de votação dos referidos projetos;
- A APROVALE é membro do Conselho Distrital com direito a pronuciamentos e um único voto. Esta posição não permite à Aprovale convocar empreendedores para discussão de projetos. Tal tarefa, se necessária, cabe ao IPURB;
- Vários membros do Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos são empreendedores de restaurantes, hotéis e similares. Isto ocorre porque o Vale dos Vinhedos é um destino enoturístico, composto prioritariamente por vitivinicultores, trabalhadores e empreendendores do setor do turismo. Portanto é natural que as principais lideranças e representantes da Aprovale exerçam estas atividades. O fato de um Conselheiro, de qualquer entidade, estar no mesmo ramo de negócio de um projeto analisado, não o desqualifica, muito pelo contrário, aporta voluntariamente o conhecimento técnico que o Conselho necessita para corretamente avaliar projetos.
- Consideramos o pedido de suspensão dos alvarás do empreendimento Castelos do Vale um contrasenso. Os estudos de impacto reveleram que o projeto estava em conformidade com o Plano Diretor e dentro da escala de viabilidade para sua implantação no Vale, razão pela qual o voto da Aprovale foi positivo à sua aprovação e assim se manterá.
Por fim, nossa entidade está promovendo, em apoio à Comunidade do Distrito do Vale dos Vinhedos, o seguinte abaixo assinado, a ser encaminhado ao Prefeito Municipal.
Posição dos empreendimentos
Os empreendimentos barrados são o Bewine e o Projeto Enoturístico do Vale dos Vinhedos. Nesta semana, ambos divulgaram notas sobre a decisão do Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos.
Nota dos empreendedores ligados ao Projeto Enoturístico do Vale dos Vinhedos :
A Família Salton e a Gramado Parks se manifestaram publicamente nesta terça-feira (29), durante a reunião da Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento e Bem-Estar Social da Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves, sobre o projeto turístico que ambas buscam desenvolver no Vale dos Vinhedos.
No encontro, representantes das duas empresas esclareceram que todo o projeto foi elaborado dentro do conceito e vocação do Vale dos Vinhedos, de enoturismo e com experiências diferenciadas para continuidade na valorização das raízes culturais da região. São contemplados com ampla abrangência e compromisso temas como sustentabilidade, mobilidade, apoio a produtores locais e respeito às características do roteiro turístico, agregando novos vinhedos produtivos e que garantem a continuidade e crescimento da paisagem local, mantendo as características da região.
Os representantes da Família Salton e da empresa Gramado Parks reforçaram, durante o encontro, que o empreendimento ainda não foi lançado e não está sendo comercializado. O projeto da Família Salton e da Gramado Parks está percorrendo todos os trâmites legais, seguindo rigorosamente todas as exigências solicitadas pelos órgãos públicos, além de apresentar benefícios que serão estendidos à comunidade, dentro dos parâmetros de ética, transparência, visão de longo prazo e sustentabilidade dos negócios e destinos em que atuam.
Em 2022, a Família Salton completará 112 anos de história e é a vinícola mais antiga em atividade no Brasil. A empresa se dedica à vitivinicultura, tecnologia e inovação, e leva o nome de Bento Gonçalves para mais de 30 países. Os produtos da marca priorizam a excelência e preservam a essência baseada na cultura local. Ao longo de sua história, a Salton sempre foi parceira da comunidade e participou ativamente do desenvolvimento de Bento Gonçalves. Para este novo projeto, a empresa manterá sua posição de respeitar os interesses de toda a comunidade.
Nota dos empreendedores ligados ao Bewine:
O Bewine foi aprovado em novembro de 2021 pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPURB) de Bento Gonçalves e cumpre rigorosamente todas as normas estabelecidas. Para a sua aprovação, foram solicitadas algumas adequações no projeto, e todas, sem exceção, foram executadas.
Queremos manter o diálogo aberto com o Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos e estamos à disposição para prestar qualquer esclarecimento – inclusive reapresentando o projeto aos conselheiros.
O Bewine dará ainda maior impulso ao desenvolvimento social e econômico da Serra Gaúcha, principalmente para Bento Gonçalves e o Vale dos Vinhedos, onde será construído – reduzindo o déficit da rede hoteleira, já que dividido entre 421 apartamentos e o maior parque temático do vinho do mundo, o complexo terá capacidade de receber 1,6 milhão de público passante.
Serão gerados mais de 2,4 mil empregos diretos e indiretos, em um investimento que ultrapassa os R$ 300 milhões, sendo o Valor Geral de Vendas (VGV) de R$ 1,3 bilhão.
G-30 divulga manifesto
Nesta sexta-feira, o G-30 também divulgou uma nota de apoio às restrições para os grandes empreendimentos que possam interferir no Vale dos Vinhedos. Confira abaixo o texto assinado por Thomas Fontana, CEO do G30 Serra Gaúcha:
Há cinco anos, o G30 Serra Gaúcha foi criado para trabalhar pelo ecossistema do turismo desta importante região do Rio Grande do Sul. Desde então, tem reunido o trade para falar de demandas, celebrar conquistas e planejar ações rumo a um objetivo muito claro: tornar a Serra Gaúcha, até 2030, o destino mais estruturado, desejado e sustentável do Brasil.
Cumprir essa meta passa, necessariamente, pela atração e pelo crescimento de empreendimentos turísticos. Por isso, fazemos questão de deixar muito claro neste documento que não somos contra a instalação de novos negócios, muito pelo contrário. No entanto, reforçamos que nenhum empreendimento é uma ilha, todos estão inseridos em um ecossistema que precisa ser olhado em meio ao seu contexto. É a partir desse raciocínio que divulgamos agora o nosso posicionamento a respeito das discussões sobre os novos empreendimentos que pretendem se instalar no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves.
Não temos dúvidas de que cada um deles é capaz de gerar renda, desenvolvimento, empregos e boas experiências para os turistas. Também não temos dúvidas de que, com planejamento e cuidado, a multipropriedade é um modelo de hotelaria que pode ser benéfica à região, trazendo, por exemplo, fluxo todos os dias da semana. Porém, ela pode gerar efeitos indesejados. Para exemplificar essa posição, pegamos emprestada uma frase de Caio Calfat, importante personalidade desse setor: “A multipropriedade pode construir ou destruir um destino”. Queremos, é claro, que ela construa muitos. E não destrua nenhum. Há caminhos para que essa vontade seja atendida.
Estando claro que não somos contrários aos empreendimentos em si, ao crescimento dos destinos e à multipropriedade, passamos aos nossos argumentos para defender que, neste momento, se pare com os avanços a respeito das autorizações de novos empreendimentos e se converse, como sociedade civil organizada, para avaliá-los não de forma isolada, mas dentro do ecossistema onde pretendem se inserir.
a) O Vale dos Vinhedos tem cerca de 80 quilômetros quadrados de extensão e precisa que boa parte dessa área seja coberta por vinhedos. Essa necessidade está ligada à preservação da paisagem, à atração de turistas, à manutenção da Denominação de Origem (DO) e à identidade que faz dele referência em enoturismo do Brasil. Sabemos que, isoladamente, cada empreendimento não ocupa uma grande área, mas reforçando que temos que pensar em contexto, se autorizados, abrirão um precedente para os próximos que virão (sabemos de pelo menos outros cinco grandes projetos que esperam aprovação). Para efeitos de comparação: a ilha de Veneza tem 5 vezes mais área, mas você imaginaria sete grandes resorts lá dentro?
b) A multipropriedade acelera de forma muito rápida a oferta de leitos e, consequentemente, a chegada de turistas. Queremos mais turistas? Sim, queremos, mas que estrutura vamos oferecer a eles e à comunidade que lá já habita? Enquanto o número de visitantes cresce muito rápido, o saneamento, a mobilidade e outras questões não crescem na mesma velocidade. O Vale dos Vinhedos não tem estrutura para absorver o movimento decorrente de novos grandes empreendimentos. E temos um exemplo claro disso: Gramado. Por lá, a multipropriedade chegou muito acelerada, sem critérios, e os problemas estruturais que já existiam foram amplificados. Em Bento Gonçalves, temos a chance de evitar esse mesmo desfecho.
c) O que aconteceu em Gramado tem relação com um fato que nos preocupa em relação ao Vale dos Vinhedos. Na cidade das Hortênsias, os conselhos são consultivos, não têm poder de veto. E quem atua no mercado de lá afirma que esse foi um passo decisivo para que se perdesse o controle na aprovação de muitos empreendimentos gigantescos em pouco tempo. Um destino com problemas sérios de mobilidade, energia, saneamento não se sustenta. E aí entende-se como a falta de planejamento pode destruí-lo. Por isso, nos manifestamos totalmente contrários ao projeto que tramita na Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves com o objetivo de tirar o poder deliberativo dos conselhos. A comunidade do Vale dos Vinhedos não pode perder o seu direito de opinar sobre o que quer ou não que aconteça por lá. Sempre defendemos a união e o diálogo e não concordamos com cerceamento.
d) A conta do que pode acontecer com o Vale dos Vinhedos virá e será tarde para lamentar. Não estamos dizendo que esses empreendimentos precisam sair de Bento Gonçalves, apenas indicando que se aproveite este momento par discutir critérios e avaliar o todo. O que será feito para resolver os problemas que serão gerados? Onde mais, dentro do território bento-gonçalvense, sem que seja em meio a vinhedos que precisam ser preservados, eles podem ser instalados? Que tipo de alternativa existe para que se concilie desenvolvimento e preservação?
Com esse manifesto, o G30 Serra Gaúcha, que fortemente atuou pela retomada do turismo na pandemia pregando união, conclama todas as entidades da Serra Gaúcha, não apenas as de Bento Gonçalves, para que sensibilizem os orgãos públicos para um retorno ao início, com o objetivo de melhorar o planejamento. Sabemos que há limites entre municípios, início e fim de roteiros. Mas, sabemos também, que o turista vem para a Serra e é isso que importa. Somos uma única região e, unidos, sempre evoluiremos mais. Esse assunto não é apenas do Vale dos Vinhedos, é da Serra Gaúcha. É esse destino que está nas nossas mãos, porque se houver uma despreocupação com a identidade do Vale dos Vinhedos, o precedente se espalhará para as demais cidades.
Este é o momento de parar, conversar, antever problemas e discuti-los tecnicamente. Colocamo-nos à disposição dos empreendedores, vereadores, Prefeito e Secretários, Conselho Distrital e demais atores para diálogos sobre o tema. Nós podemos planejar melhor.