Do início de janeiro até esta quarta-feira (26), ao menos 45 prefeituras da região haviam decretado situação de emergência por conta da estiagem. Para se ter dimensão do impacto da falta de chuva na Serra, no dia 3 de janeiro, apenas Montauri e Santa Tereza haviam solicitado ajuda na esfera estadual. Conforme a última atualização, já são 358 municípios gaúchos na mesma situação.
A gerente regional da Emater, Sandra Dalmina, afirma que, regionalmente, a cultura mais afetada continua sendo o milho. O escritório tem sede em Caxias do Sul, mas abrange um total de 49 municípios dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes) Serra, Hortênsias e Campos de Cima da Serra.
— Além do milho, temos recebido bastante ocorrência de uva, porque começou a colheita, então, o pessoal tem como identificar mais. Com certeza ainda vamos receber (relatórios) de caqui, que é mais atrasado, também de maçã. Está começando a aparecer, porque está bem no início da safra, prejuízos na soja — detalha Sandra.
Ela relata ainda que os danos são sentidos de forma geral nas três áreas de atuação do Escritório, embora, perceba que há, talvez, um pouco menos de impacto na Região das Hortênsias.
— A chuva regular nestes últimos dias tem mantido melhor essa região. Já nos Campos de Cima da Serra, a estiagem demorou a chegar em alguns municípios. Mas, agora, este mês, já está sendo bem complicado, vem se agravando — enfatiza Sandra.
Além do número crescente de municípios que recorrem aos decretos de emergência, Sandra aponta como indicador da gravidade da situação o número de homologações realizadas pelo governo estadual — 274, conforme último levantamento.
— Muitas vezes acompanhamos decretos que as prefeituras fazem e não são (homologados). E, agora, estão sendo homologados praticamente todos, inclusive, Caxias do Sul, que já teve situações com geada e não tinha sido homologado. É um reconhecimento da Defesa Civil de como a situação está complicada — avalia a gerente regional da Emater.
Cenários se assemelham pela região
Pinto Bandeira e São Marcos estão entre os municípios da região que entraram recentemente para a estatística, com decretos publicados na segunda e terça-feira, respectivamente. Embora cada cidade tenha suas particularidades, no que se refere às plantações e expectativa de colheita, o cenário geral provocado pela seca é o mesmo: plantas murchas, algumas que sequer chegam ao ponto de produzir algo, e reflexos no abastecimento de água para famílias e animais.
Conforme o secretário de Agricultura, Pecuária, Comércio, Industria e Meio Ambiente de Pinto Bandeira, Tailor Rigon, as principais produções do município são o pêssego e a uva. Ambas as frutas, segundo o levantamento da Emater, apresentam perdas de cerca de 20% da produção.
— Semana que vem vamos rever estes dados porque estamos começando agora a safra da uva, então, pode mudar. Além disso, tivemos intempéries com granizo, o que ocasionou uma perda de 10% na produção da ameixa — detalha Rigon.
Ele também relata que há cerca de 20 propriedades do interior sofrendo com o desabastecimento, sendo as comunidades mais atingidas as Linhas Silva Pinto Norte, 40 e Clementina.
Já São Marcos contabiliza um impacto financeiro em torno de R$ 10 milhões, levando-se em consideração os prejuízos em 11 culturas. As lavouras mais atingidas são as de milho, mas também há consequência na produção de uva.
A prefeitura também estima que haja 180 pessoas afetadas no interior do município. Para amenizar a situação, já foram distribuídos cerca de 106 mil litros de água potável, além de disponibilização de máquinas para a abertura de bebedouros para dessedentação animal.
"Nunca foi assim", relata agricultora
Embora números e dados chamem a atenção e sejam muito importantes para a formação de relatórios e decretos, são os relatos de quem vive o dia a dia da estiagem que mais impressionam. Moradora do Travessão Carvalho, interior de Flores da Cunha, a agricultora Adriane Bernardi revela que nunca viu situação semelhante.
— Plantamos (o tomate) há uns 20 dias e, por falta de água, morreram algumas mudas. O açude praticamente secou, estamos mantendo como dá. Faz seis anos que plantamos tomate, nunca foi assim. Tanto que ano que vem vamos desistir se for época de seca de novo— lamenta Adriane.
Além das 3 mil mudas de tomate, a família trabalha na produção de uva, a qual também terá prejuízos:
— Terminamos de colher hoje de manhã (terça-feira) a Bordô, e perdeu muito no peso. Perdemos 40% em relação a safra passada — diz a agricultora.
Soluções à vista, mas ainda sem prazo de saírem do papel
Como medida para atenuar a situação de agricultores que vêm sofrendo pelas consequências da estiagem, a Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr), do governo do RS, solicitou aos municípios interessados que enviassem ofícios para abertura de poços e microaçudes. O cadastro foi viabilizado até a última segunda-feira e faz parte de uma das ações do programa Avançar na Agropecuária e no Desenvolvimento Rural. Para esta etapa, o investimento é previsto em R$ 173,7 milhões.
De acordo com a secretaria estadual, a previsão é de destinação de até 10 microaçudes e um poço para cada município. No primeiro momento, serão priorizados aqueles com situação de emergência homologada pelo Estado. Entre as prefeituras que esperam pelo benefício está Caxias do Sul.
Segundo o secretário da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Rudimar Menegotto, a escavação dos açudes representa pouco diante do tamanho do município, mesmo assim, será bem-vinda:
— Vai ajudar. No fundo, o que nos interessa mais são os açudes, porque o Samae faz o abastecimento para o consumo humano (que seria a finalidade dos poços artesianos) —comenta o secretário.
Menegotto também detalha que ainda não é possível estimar quando os açudes e poços serão abertos e nem mesmo os locais que os receberão:
—Precisamos da confirmação, para depois nos reunirmos com o conselho e determinar os agricultores que vão ser beneficiados. E, depois a Emater, junto com os técnicos da secretaria, faz o projeto. Pelo que sei, o processo é esse. Mas não sabemos o quanto vai demorar — diz.