A falta de diretrizes claras sobre qual deve ser a reação da população diante da expansão do coronavírus no Brasil gera incertezas não só no dia a dia das famílias, mas também nos setores econômicos e consequentemente, aos próprios trabalhadores. Por enquanto, a recomendação mais difundida é o afastamento social temporário. Mas, da perspectiva econômica, o mundo não pode parar. E enquanto empresas ainda debatem, ao trabalhador resta aguardar, apreensivo, as decisões dos empregadores, concomitantemente ao avanço da epidemia.
— Como é uma questão de saúde pública, não pode o empregador punir um trabalhador pela ausência no emprego. O isolamento é a precaução necessária e o momento é de colocar a saúde dos empregados e da sociedade acima dos interesses da empresa. Os trabalhadores são os mais expostos aos riscos econômicos e sociais que virão. Também estão mais expostos ao contágio, uma vez que são eles que utilizam transporte público, além de executarem as atividades laborais em locais com grande concentração populacional — avalia Anelise Manganelli, economista e técnica do Escritório Regional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) do Rio Grande do Sul.
Embora os riscos à mão de obra sejam relativos às funções que exercem, via de regra, quem atua com maior contato ao público externo esteja mais suscetível. Caso, por exemplo, do setor de serviços, como restaurantes, hotéis e transporte, em que prestadores não necessariamente conhecem seu público ou a condição de saúde deles.
Em razão disso e diante da falta de decretos governamentais que regrem ou paralisem as atividades, sindicatos trabalhistas precisam atuar na cobrança de medidas a empresas e entidades patronais.
— O papel dos sindicatos é fundamental por ser um interlocutor das demandas da classe trabalhadora mediante a classe empresarial e governo — complementa a técnica do Dieese.
A hesitação em simplesmente suspender as atividades de empresas se refere à lógica do mercado: parar produção é perder dinheiro. Preocupação que naturalmente também afeta os trabalhadores. No entanto, segundo Anelise, leis trabalhistas amparam a garantia de estabilidade em situações de riscos à salubridade.
Em caso de dúvida, o trabalhador deve contatar o sindicato correspondente à sua categoria ou a sede da Secretaria Regional do Trabalho do Ministério da Economia, na Rua Bento Gonçalves, 2.621, bairro São Pelegrino, em Caxias do Sul, ou pelo número (54) 3221-3306.
Os pequenos
Autônomos e micro e pequenos empresários vivenciam um conflito específico e pontual: como não ficar vulnerável à contração do vírus e, ao mesmo tempo, não interromper a renda que lhes garante a sobrevivência. Há pelo menos três situações: o trabalhador que mesmo doente continua trabalhando para manter seus rendimentos, o que amplia o risco de disseminação do vírus; o trabalhador que pode não estar infectado, mas ainda assim terá seus rendimentos afetados pela redução da atividade em geral, por conta de restrições de circulação de pessoas e mercadorias e, c) o trabalhador _ contaminado ou não _ que para de trabalhar e não tem qualquer fonte de renda alternativa para sustentar a si e a sua família.
— O isolamento, nesse contexto, não é uma possibilidade — explica Anelise.
Conforme a economista do Dieese-RS, nesse contexto, cabe responsabilidade ao governo determinar medidas que garantam a estabilidade financeira e proteção da saúde dos trabalhadores.
FIQUE ATENTO
Os trabalhadores, as empresas e os sindicatos devem ficar atentos a uma série de situações e adequações legais que surgem neste momento de ajuste de jornada de trabalho e de produção às exigências do controle do contágio pelo coronavírus.
Grupos de risco
Os sindicatos estão buscando diálogo com bancadas patronais para garantir a redução da burocracia. A lógica de afastamento mediante atestado não vai funcionar. As próprias autoridades de saúde recomendam que as pessoas não procurem os hospitais, de modo a evitar a disseminação da doença, a menos nos casos mais graves.
Proteção no afastamento
O trabalhador para se afastar do local de trabalho precisa de garantia de que não terá os dias descontados. Manter as exigências para afastamento só acelerará o contágio. Diante do momento, sindicatos de trabalhadores e empregadores devem buscar essa harmonização forma
Medidas de segurança
O Ministério Público do Trabalho (MPT) emitiu nota nesta semana com algumas recomendações de medidas de segurança que devem ser adotadas nas empresas, como: fornecer lavatórios com água e sabão; álcool 70% ou similares adequados à atividade; adotar medidas que impliquem alterações na rotina de trabalho, como, por exemplo, política de flexibilidade de jornada quando os serviços de transporte, creches, escolas, dentre outros, não estejam em funcionamento regular; seguir planos de contingência recomendados pelas autoridades, tais como: permitir a ausência no trabalho, organizar o processo de trabalho para aumentar a distância entre as pessoas e reduzir a força de trabalho necessária, permitir a realização de trabalhos à distância. Na mesma nota, o MPT recomenda que as empresas, sindicatos patronais e sindicatos laborais firmem acordos e/ou instrumentos coletivos de trabalho prevendo flexibilização de horários, abono de faltas sem a apresentação de atestado médico, entre outras medidas necessárias para conter a transmissão da doença. Em caso de dúvida, o trabalhador deve procurar seu sindicato para saber se a empresa que trabalha firmou algum acordo ou mesmo conhecer os termos dele.
Férias coletivas
Algumas empresas estão cogitando a possibilidade de conceder férias coletivas, que é diferente de recesso. Recesso é como se fosse uma licença remunerada, o trabalhador receberá o salário normalmente, na data que habitualmente recebe. Já as férias coletivas estão previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, art. 139) e são concedidas pela empresa para todos os empregados ou para um ou mais setores. Férias coletivas significa ausência de todos _ caso tenham sido concedidas a toda a organização _ ou no setor _ caso tenham sido concedidas a um departamento. Necessariamente, deve ter a antecipação do pagamento dos dias de férias, acrescido de 1/3.
Por legislação, o anúncio das férias coletivas deveria ser protocolado com 15 dias de antecedência. No entanto, o escritório regional da Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia já informou aos sindicatos, que excepcionalmente nesse caso o prazo será de dois dias, e não precisa ser protocolado, mas poderá ser feito por e-mail.
Redução de jornada
Algumas empresas estão encaminhando medidas como a redução da jornada de trabalho. É útil para evitar demissões em setores mais afetados por uma redução de demanda. Mas é medida inócua diante da crise do coronavírus, porque não produz o isolamento.
Fonte: Anelise Manganelli, economista e técnica do Escritório Regional do Dieese-RS
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