Os primeiros meses do ano têm aroma de uva para quem vive ou visita a Serra. O período da colheita do fruto que origina reconhecidos vinhos, espumantes e outros derivados, a tradicional vindima, também é época para atrair turistas curiosos não somente em provar uvas e bebidas, mas em viver todas as experiências que o enoturismo proporciona. A expectativa é que mais de 300 mil visitantes aproveitem as atrações da vindima entre janeiro e março, em diferentes municípios da Serra.
Quando questionados, os agricultores costumam dizer que a vindima simboliza a celebração após o trabalho de um ano inteiro e que também marca o início da jornada na busca pelo vinho perfeito. O período é ainda um convite para que o visitante conheça a região em uma época única do ano, em que o verde das parreiras dá espaço ao colorido das uvas.
Essa experiência começa logo no início do ano em lugares como a Vinícola Cainelli, localizada no distrito de Tuiuty, em Bento Gonçalves. O empreendimento abre as portas a partir do primeiro fim de semana do ano, inaugurando a experiência do turista nesta safra. O objetivo é atrair visitantes que passaram o Ano-Novo na Serra e que estão em busca de novas experiências.
Na primeira etapa do passeio, os visitantes conhecem a história da vinícola e da família. A casa que acompanhou diferentes gerações dos Cainelli se tornou em um museu, com itens e mobiliários típicos do início do século passado, em uma espécie de passeio ao passado.
Depois, munidos de chapéus de palha e cestas de vime, os caminhos levam para os vinhedos. São dois hectares de uva que podem ser colhidas pelos turistas. Não há ferramentas e o processo é feito com o esforço e habilidade das mãos, unindo o polegar e o indicador para romper a ligação entre o cacho e o parreiral. A única orientação é que só se pode degustar a fruta depois que for apanhada — retirar um grão do cacho ainda no parreiral atrai mais abelhas e, por isso, não é recomendada.
Outro recado é a ausência de sinal de internet, anunciada em uma placa na entrada do parreiral. "Nesse vinhedo, não temos Wi-Fi, mas você encontrará uma conexão muito melhor". Conexão que chega também com música. Toda a etapa é acompanhada por uma apresentação ao vivo de grupos típicos da região, que entoam animadas canções italianas.
Um passeio alegre e que diverte crianças e adultos. Vindos de São Carlos (SP), a designer Maria Alice Torres, 41, e o engenheiro da computação Igor Custódio, 41, trouxeram o filho Fritz, 2, para conhecer a região e vivenciar a vindima em família.
— São histórias familiares que trazem boas lembranças. A uva é muito rica, tem uma série de benefícios para saúde e é um privilégio estar aqui, conhecendo mais sobre essa fruta e a produção de vinho. Vim pela primeira vez em 2019 e retornamos agora com o nosso filho, já que conhecemos a região e a gente sabia que é um passeio possível de se fazer com crianças. É uma experiência para guardar para a posteridade — conta Maria Alice, enquanto o marido carrega Fritz no colo e o ajuda a colher a uva.
Depois de muito esforço, é chegada a hora da recompensa. O passeio inclui um lanche típico italiano, também conhecido como merendin, servido embaixo do parreiral. São delícias da Serra, como pão, salame, queijo, cucas, polenta brustolada feita na hora e muito suco e vinho à disposição dos visitantes.
Cada um carregando a sua cesta carregada de uva, é hora de retornar para a sede da propriedade para a divertida pisa das uvas. A volta é feita com a ajuda de um tuc tuc, uma espécie de trator com capacidade para transportar até 10 pessoas.
— É um período de muito trabalho, mas de muita alegria. Faça sol ou faça chuva nós vamos para a vindima. Queremos que os turistas vivam aqui um pouco do que é a nossa rotina, daquilo que fazemos há muitos anos. O merendin que oferecemos acontece até hoje. Como o pessoal vai cedo para o vinhedos, a gente para na metade da manhã, vira as caixas de uva e comem todo mundo junto, almoçando e jantando. É um período de compartilhamento, de corpos cansados, mas almas felizes. É muito trabalho, mas é muito divertido — conta um dos proprietários da vinícola, Roberto Cainelli Júnior.
Pisa na uva é o carro-chefe das experiências
A cena é clássica e continua atraindo o interesse dos visitantes: pessoas descalças, dentro de um tanque de madeira, pisando alegremente em dezenas de cachos de uva ao som de música italiana. A brincadeira simboliza um marco do passado no processo de produção de uva _ a prática foi descontinuada e aparece ainda apenas como atração em festas ou em programações turísticas.
Conforme as pessoas pisam sobre a uva, a casca se rompe, liberando o suco da fruta. Por ser um pouco escorregadio, uma corda ajuda a manter o equilíbrio. Essa experiência que remonta os antepassados é bastante procurada por turistas em busca de cenas instagramáveis.
Foi o que fizeram os economistas Alessandra Vaz e Israel Golin, ambos de 46 anos, acompanhados do filho Eduardo, 11. Pela segunda vez na Serra, foi a estreia da família de São Paulo na experiência de amassar as uvas com os pés.
— Eu esperei para fazer esse passeio na vinícola junto com o nosso filho para ele entender a cultura daqui, servindo até como um auxílio nos estudos. A gente adorou tudo, é totalmente fora do nosso dia a dia, em que tudo é muito corrido, cheio de poluição, contra o relógio. E aqui é tudo com calma, no contato com a natureza, pegando a uva direto no pé — resume Alessandra, enquanto limpava os pés após a pisa.
— Você vai pisando, sai o suco da uva, fica um pouco gosmento, mas é muito legal — diverte-se Eduardo.
Quem também aprovou a experiência foi um grupo de Maceió (AL), liderado pela biomédica Susy Siqueira, 40.
— É a terceira vez que estamos aqui na Serra. Eu acho o clima muito agradável. É a primeira vez pisando na uva, uma experiência muito gostosa — conta.
Colher uva, tomar vinho embaixo do parreiral e pisar nos cachos pode permitir uma experiência que supera fronteiras.
— Estou muito fascinada porque as parreiras estão carregadas, é muito bonito de ver, de tocar. Tenho uma amiga que veio em setembro e não encontrou nada disso. Me sinto privilegiada. Não fui à Itália ainda, mas, de certa forma, estou vivendo um pouco do que é estar na Europa — define a carioca Ana Carla Portella Pereira, 46, estreante como turista na Serra.
Programe-se:
Vindima na Cainelli
- O quê: visita, colheita da uva, lanche típico italiano, passeio de tuc tuc e pisa da uva.
- Quando: sábados e domingos, às 9h30min e às 15h30min, até 3 de março.
- Quanto: R$ 299 por pessoa (exceto no Carnaval). Crianças de 8 a 12 anos pagam R$ 130. Menores de 7 anos pagam R$ 2.
- Informações: (54) 99615-6209.
Colheita no fim da tarde para minimizar o calor
Outra opção para vivenciar a vindima é participar da colheita da uva, mas em um horário pouco diferente do habitual. Para driblar o calor do verão na Serra, que costuma ser intenso durante a manhã, a Vinhos Cristofoli, no distrito de Faria Lemos, em Bento Gonçalves, preparou o Entardecer de Vindima, onde os turistas são recepcionados em meio aos parreirais após às 17h30min.
Assim que se encerra a apresentação da história da família, a experiência parte para um passeio de trator até os vinhedos com as uvas Sangiovese e Chardonnay, que está localizado no topo da propriedade, entre a vista do Vale dos Vinhedos e o Vale do Rio das Antas. Ali o visitante é recepcionado com músicas típicas italianas e espumantes.
— Por ser ao entardecer, permite a contemplação de uma linda vista formada pelos vales e os vinhedos durante o cair do sol. Usamos o nosso diferencial para atrair os turistas em um horário específico — descreve a proprietária do local, Letícia Cristofoli, que organiza a ação há quatro anos.
É ali que se divertem e também fazem a pisa das uvas à moda antiga. Após sair do mastel (tanque madeira utilizada para a atividade), o visitante carimba os pés pintados com suco de uva em um pano de algodão. O resultado é uma recordação da experiência.
Por fim, é servido com um brunch noturno, com menu de pães, frios e queijos regionais, frutos secos, salada de folhas, ragu de ossobuco com polenta mole e para adoçar, mousse de iogurte natural com calda de suco de uva. Todos os pratos são finalizados no local pela própria família.
Programe-se:
Entardecer de Vindima - Vinhos Cristofoli
- O quê: Visita à vinícola, passeio de trator aos vinhedos, pisa das uvas e brunch noturno.
- Quando: sextas e sábados, às 17h30min, até a primeira semana de março.
- Quanto: R$ 429 por pessoa. Crianças de 6 a 14 anos pagam entre R$ 214 e R$ 107. Menores de cinco anos não pagam.
- Informações: (54) 98403-9247
Aprender a colher a própria uva
Mais do que pisar na uva e ter experiências embaixo dos parreirais, o turista também pode colher a fruta que quiser levar para casa. A experiência é possível na Slaviero Uvas, localizada no distrito de Otávio Rocha, em Flores da Cunha. A entrada no local é gratuita e funciona no sistema colhe e pague, onde o visitante fica livre para conhecer a propriedade. São mais de 30 variedades, entre uvas finas de mesa e outras americanas, como Bordô, Niágara e Isabel.
— Entregamos uma tesoura e um cesto e orientamos como deve ser feita a colheita. Alguns cachos podem estar menos maduros e precisam ficar mais tempo ainda no parreiral, por isso, acompanhamos e damos todo o suporte para que a uva que seja levada esteja com a melhor qualidade — conta Cimara Slaviero, uma das responsáveis pelo empreendimento.
A Slaviero Uvas concentra ainda a venda de produtos coloniais, como salames, queijos, pães, geleias, suco de uva, vinhos, frutas da estação e é também oferecido degustação. No espaço é contada a história da região que começou a receber turistas há quase 60 anos.
— Os visitantes chegavam ao Hotel Dona Adélia, aqui na localidade, para se hospedar e acabavam pedindo se tinha um lugar para conhecer o dia a dia na colônia. Eles ficaram encantados com a experiência, em poder apreciar a fruta direto do pé, e indicavam para outras pessoas, aumentando a cada vindima o número de visitantes por aqui — relata.
Programe-se:
Colheita da uva - Slaviero Uvas
- O quê: Colheita de uva para pagar e levar.
- Quando: Diariamente, das 8h às 18h.
- Quanto: Entrada gratuita. Uvas finas a partir de R$ 10 o quilo.
- Informações: (54) 99955-1818.
Outras atrações pela região
Além das atividades em vinícolas, municípios da região se preparam para eventos que celebram a colheita da uva e as tradições dos imigrantes italianos.
A mais tradicional delas é a Festa Nacional da Uva, em Caxias do Sul, que começa em 15 de fevereiro e segue até 3 de março. Neste ano, o evento espera distribuir 150 toneladas de uva aos visitantes, tanto nos pavilhões como nos seis desfiles na Rua Sinimbu. Haverá cerca de 400 expositores de diferentes segmentos, exposição de uvas, atividades de entretenimento e gastronomia típica italiana. A festividade marca o início das comemorações dos 150 anos da chegada dos primeiros imigrantes italianos na Serra.
Instagram: @festanacionaldauva
Em Flores da Cunha, ocorre a Festa Nacional da Vindima (Fenavindima), entre 22 de fevereiro e 10 de março, no Parque da Vindima Eloy Kunz. Em 2024, Flores da Cunha completará 100 anos de emancipação política e por isso celebrará um século de colheita. A festa ocorrerá nas sextas, sábados e domingos e terá artesanato, agroindústria, vinícolas, gastronomia típica, alimentos e bebidas e multifeira.
Instagram: @fenavindima
Neste mês, Monte Belo do Sul promove a Festa de Abertura da Vindima, entre os dias 25 e 28. A programação ficará concentrada na Rua Sagrada Família, que estará coberta por uma estrutura de lona. No local ocorrerá ainda a pisa de uvas, numa mastela de três metros de diâmetro, onde os visitantes poderão reviver a tradição.
Instagram: @visitemontebelo
Garibaldi também terá uma programação que conta com diversas experiências, como pisa das uvas, piqueniques e degustações, de 26 de janeiro a 9 de março. Neste ano, a abertura oficial ocorre na propriedade Vinhos Bettú, na Estrada do Sabor, no dia 26 de janeiro, a partir das 17h30min. A recepção conta com pisa das uvas simbolizando o início da Vindima, apresentações culturais com Os Gaiteiros e Orquestra Jovem de Garibaldi, coquetel oferecido pelas famílias da Estrada do Sabor.
Instagram: @turismogaribaldi