A vizinhança pegando a estrada para as férias no litoral, Chaves sem saber como entrar no hotel pela porta-giratória, Quico se afogando e sendo salvo pelo professor Girafales em uma piscina onde a água batia no joelho, o luau na beira da praia. Essas são cenas vivas na minha memória e provavelmente na dos leitores que cresceram assistindo ao seriado mexicano mais famoso entre os brasileiros.
Acapulco é sinônimo de Chaves, mas a praia no sul do México tem muito mais a oferecer, desde um bom pescado à beira-mar ao carinho de um povo que sabe receber bem os visitantes — não é sempre que você chega em um hotel e vê uma faixa com a frase "Bem-vindo a sua casa" na porta do quarto.
Convém avisar que o calor é intenso e a chuva dá as caras somente 25 dias por ano. Não à toa, Acapulco é conhecida como a terra do sol. As temperaturas, em maio, beiravam os 40°C, e as águas do Oceano Pacífico estavam morninhas.
Retomada
Hoje com 717 mil habitantes, Acapulco viveu o auge nas décadas de 1940 e 1950. A cidade era destino de estrelas de Hollywood como Marilyn Monroe. Era rota obrigatória de cruzeiros também, chegando a receber até três navios por dia. Com o surgimento de Cancún, Acapulco perdeu boa parte de seus turistas internacionais.
Além de disputar visitantes com o caribe mexicano, Acapulco sofreu, como todos os destinos turísticos mundiais, os impactos da pandemia. Mas conforme o secretário de Turismo do México, Miguel Torruco Marqués, as reduções nos casos de covid-19 estão permitindo a retomada.
Uma prova da aposta dos governos locais na praia da costa do Pacífico foi a realização da 46ª edição do Tianguis Turístico, entre 23 e 26 de maio, em Acapulco. O evento é a maior e mais importante feira de turismo do país.
Com Taxco de Alarcón e Zihuatanejo, Acapulco forma o chamado Triângulo do Sol. Essas duas cidades valem ser incluídas no roteiro de quem viaja ao Estado de Guerrero, assim como a capital, Chilpancingo, e a litorânea Coyuca de Benitéz, onde Sylvester Stallone já esteve. Assim, você terá muito mais histórias para contar na volta e não apenas dizer que esteve onde Chaves passou as férias.
3 dicas
- Comer um pescado a la talla em um dos restaurantes da praia Bonfil. O peixe, assado na brasa, é um dos pratos típicos de Acapulco.
- Visitar La Quebrada, uma das principais atrações turística de Acapulco. É um penhasco onde pessoas da região saltam quando uma onda se aproxima, evitando assim que se machuquem com a queda. O salto é praticado por moradores locais — não se recomenda o pulo por quem não conhece a região.
- Ao usar o serviço de táxi, utilizar os carros azuis. São mais seguros. Os amarelos são compartilhados e podem parar em qualquer lugar.
O hotel do Chaves
Embora Acapulco seja bem mais do que Chaves, é praticamente impossível para um fã do seriado não visitar o hotel que serviu de locação para os icônicos episódios das férias da turma gravados no final da década de 1970. O empreendimento mantém as características daquela época, e é possível reconhecer a piscina e a sacada dos apartamentos. A clássica porta-giratória permanece lá, mas, no dia da minha visita, estava fora de funcionamento _ um pouco frustrante.
Não há referências à passagem de Roberto Bolaños e elenco pelo hotel. Quando os três episódios foram gravados, o então Hotel Continental era de um dos sócios da Televisa, mas anos depois foi vendido e hoje se chama Emporio. Moradores comentam que a família de Bolaños não permite explorar a marca. Apesar disso, o hotel segue associado ao personagem e é comum turistas, principalmente brasileiros, pedirem aos taxistas para serem levados ao hotel do Chaves.
Rambo e as tarântulas
Anos após Acapulco ser set de gravação de Chaves, a vizinha Coyuca de Benitéz serviu como dublê do Vietnã no filme Rambo II, lançado em 1985. A cidade com uma lagoa que encontra o mar recebeu Sylvester Stallone e equipe para cenas em pontos como a base aérea.
A curiosidade é uma das primeiras a ser contada aos turistas pelos guias locais, todos muito orgulhosos. Impossível não imaginar a presença de Stallone naquele local e relembrar cenas de um ícone do cinema de ação dos anos 1980.
Coyuca também é conhecida por manter uma espécie de santuário de tarântulas, o Aracneé. A unidade de manejo ambiental busca preservar as espécies mexicanas. A coleção de aranhas é a maior do mundo: são 500 tarântulas de 47 espécies e exemplares dos cinco continentes.
Conforme os funcionários do Aracneé, as tarântulas não são prejudiciais e cumprem importante papel na cadeia alimentar, por isso, precisam ser preservadas. Esse tipo de aranha não oferece risco e pode, inclusive, ser adotado como animal de estimação.
A mágica Taxco
A 246 quilômetros de Acapulco, em uma das pontas do Triângulo do Sol, está Taxco de Alarcón. Dizem que a cidade colonial, com cerca de 105 mil habitantes, se parece com a Itália. A padronização das casas e fachadas, prevista em lei, é parte fundamental do encantamento que o município provoca.
As edificações do centro histórico são todas brancas, e os letreiros dos estabelecimentos comerciais precisam ser pintados de preto. Além disso, a fiação das principais ruas é subterrânea, garantindo belas fotos sem aquele emaranho de fios. As ladeiras, sem calçadas e semáforos, com a frota de táxis formada principalmente por Fuscas, completam o cenário.
Os veículos, aliás, foram escolhidos para o transporte de passageiros porque têm motores mais potentes para suportar os morros. É em um Escarabajo, como os mexicanos chamam o Fusca, que se pode subir até o ponto mais alto de Taxco, onde fica o Cristo Monumental. De lá, se tem uma vista panorâmica da cidade.
As subidas íngremes, que tiram o fôlego de quem não está acostumado, acabaram atraindo um importante evento para Taxco: o Campeonato Mundial de Downhill Urbano. Suspenso por dois anos por causa da pandemia, volta a ser realizado em outubro e promete reunir atletas de vários países, inclusive do Brasil, e receber cerca de 70 mil visitantes — tivemos uma prévia da competição durante a visita a Taxco com alguns competidores mexicanos.
Único pueblo mágico do Estado de Guerrero — o título é conferido pela Secretaria de Turismo do México a pequenas cidades que preservam história, cultura e tradições e mantêm viva a identidade nacional —, Taxco tem ainda opções para quem gosta de aproveitar a natureza: Pozas Azules, um parque com piscinas naturais de água azul, e as Grutas de Cacahuamilpa, parque com formações rochosas formadas há milhares de anos.
2 dicas
- Uma das principais celebrações de Taxco é a Sexta-feira Santa. Uma procissão é realizada pelas principais ruas da cidade. Os moradores se autoflagelam durante o percurso para fazer pedidos ou pagar promessas. Há mulheres que caminham curvadas e homens que carregam cruzes de espinhos ou se usam chicotes com pregos para ferir as costas durante todo o trajeto. Os rostos ficam encobertos para que os participantes não sejam reconhecidos. A procissão com sacrifício faz parte da crença dos taxquenhos.
- Outubro e novembro são meses dedicados às festividades do Dia dos Mortos em todo o país. Em Taxco não é diferente. Caminhadas e encenações são realizadas nas ruas da cidade para a celebração mais importante do México.
Carnaval em Chilpancingo
No caminho entre Taxco e Acapulco, está Chilpancingo, a capital de Guerrero, onde fomos recebidos em maio com uma festa que parecia Carnaval. As ruas estavam tomadas de gente, numa demonstração antecipada da Fiesta del Pendón (Festa da Bandeira). A comemoração ocorre sempre no segundo domingo de dezembro, abrindo as festividades de Natal.
Tem desfile e danças dos tlacololeros que representam os esforços e perigos que os agricultores enfrentam para cultivar e colher o milho. Os tlacololeros açoitam um chicote que produz um som parecido com o de um raio que além de afugentar o tigre (figura que representa ameaça para a produção), chama a chuva para que haja boa colheita.
É comum, conforme os moradores, durante a Fiesta del Pendón, acabar toda a cerveja e mezcal dos bares e mercados da cidade, que tem cerca de 283 mil habitantes. Para quem não bebe álcool, a opção é o delicioso chilate, bebida feita com água, cacau, arroz e canela.
Vale visitar Chilpancingo também no Dia das Mães, quando se realiza o Festival do Pozole e Mezcal. São quatro dias de evento para provar o tradicional prato da culinária, uma sopa feita de milho com carne de porco ou galinha. O pozole pode ser verde, vermelho ou branco, dependendo do tempero usado. Já o mezcal é um "primo" da tequila. Produzido a partir do sumo fermentado do agave, se diferencia da tequila por ser, em geral, destilado apenas uma vez, contra duas ou três da tequila.
Programe-se
- Desde o final do ano passado, o México exige visto de brasileiros. O documento pode ser solicitado no site da embaixada. O país aceita também o visto americano. Conforme o secretário de Turismo do México, Miguel Torruco Marqués, a exigência do visto não impactou no número de turistas brasileiros. Entre janeiro e março deste ano, 64.477 brasileiros visitaram o México. É 39,2% a mais do que o registrado no mesmo período de 2021, quando 46.313 brasileiros entraram no país.
- Não há exigência de comprovante vacinal contra a covid-19 para entrar no México. Porém, no retorno ao Brasil é preciso apresentar o certificado de vacinação. Para evitar transtornos, leve impresso em espanhol.
- Acapulco tem aeroporto, mas a melhor opção é desembarcar na Cidade do México (pela oferta de voos e preços). Saindo de Porto Alegre, há opção com escala no Panamá, porém, não há voos diários.
* A repórter viajou ao México com a Organização Mundial de Jornalismo Turístico (OMPT, em espanhol) a convite do governo do Estado de Guerrero.