A curiosidade por questões da astronomia, geologia e natureza – coisa de criança aquariana – foi responsável pelos primeiros mergulhos de Alessandra Rech no universo dos livros. Estar com o nariz enfiado nos pesados volumes da enciclopédia Conhecer virou uma rotina infantil que, de alguma maneira, despertou a hoje patrona da 37ª Feira do Livro de Caxias do Sul para universos diferentes e amplos.
– Eram 12 livros bem pesadões. Se eu tinha que ir na casa de algum parente, eu geralmente levava uns dois (risos) – lembra ela.
A estreia com os livros de ficção veio com o denso O Diário de Anne Frank, emprestado por um tio quando tinha apenas 12 anos. Esse caminho de proximidade com as letras ganhou novo capítulo com a escolha pelo curso de Jornalismo, contribuindo para um mergulho também na escrita.
– A redação do jornal realmente foi um tempo muito gostoso, muito afetivo, muito criativo, de muita liberdade. Foi ali que nasceu a crônica, que acabou estando nos meus dois primeiros livros – diz, referindo-se às obras Aguadeiro (2007) e Mirabilia (2014), esse vencedor do Prêmio Vivita Cartier de Literatura, em 2015.
O próximo passo foi adentrar o ambiente acadêmico, por meio do mestrado e doutorado em Letras. Veio a publicação Na Entrada-das-Águas (2010), ensaio que resultou das pesquisas da autora sobre João Guimarães Rosa; e uma aproximação com as “imagens do tempo” presentes na poesia de Hilda Hilst, tema de sua tese de doutorado. Paralelo às pesquisas, Alessandra desenvolveu novas potencialidades dentro de sala de aula, como professora da UCS. Esse ambiente ajudou a despertar uma preocupação mais relacionada às dinâmicas contemporâneas que nascem ao redor do livro.
– No meio acadêmico me surgem outros desafios, mas o fato de poder estar perto da literatura e da cultura, pensar em estudos culturais, sociabilidades que se pode ter em torno da leitura, a questão do sarau, as dinâmicas contemporâneas, as residências criativas, a produção do livro cartoneiro (artesanal). Esses têm sido os caminhos que me estimulam a ir contra aquela ideia de “ah, ninguém mais lê”. São as novas sociabilidades e temporalidades em torno dos produtos culturais, é entender o valor e o lugar dessas relações – defende.
Assim, a patrona que assume a Feira do Livro 2021 de Caxias do Sul é um híbrido entre a menina curiosa que se debruça sobre as enciclopédias, a jornalista/cronista que busca poesia na rotina da cidade, a pesquisadora envolta em diferentes linguagens de escrita, a professora alinhada às particularidades do nosso tempo, além da integrante do coletivo FAM, que envolve teatro e audiolivro. São caminhos diversos que Alessandra também pretende levar para o âmbito da Feira do Livro.
– Deixar fluir essa literatura expandida, que pode estar escrita nas paredes, nos lambes, nas galerias de arte. Começar a reacender essa sensibilidade para a leitura de mundo, deixar também as crianças mais aptas a lerem criticamente o mundo sem impor títulos e determinadas obras que às vezes não fazem sentido para elas e que acabam criando uma relação ruim com a própria palavra escrita – defende ela, que também tem duas obras dedicadas ao público infantil: O Sumiço do Canário - Quando os finais precisam ser inventados (2012), e A insônia dos sabiás (2018).
Conduzindo uma edição da feira (entre 26 de novembro e 12 de dezembro) que terá pelo menos parte de sua programação realizada no meio online, Alessandra lança um olhar positivo ao consumo de livros atual. Conforme ela, muitos livreiros relataram que estão vendendo mais títulos durante a pandemia.
– Isso é um horizonte legal para pensar que as transformações que estão vindo também podem nos ensinar algumas coisas. Independentemente do cenário, a gente também tem como vantagem a possibilidade de fazer lives com pessoas de lugares bem distantes, os cursos de extensão. Ampliou-se aquele conceito de rede de relações, de cultura globalizada, de uma maneira bem efetiva.