Quando era apenas uma aspirante a atriz em Minas Gerais planejando estudar em São Paulo, Andreia Horta viu sua própria história ganhar voz. E não era qualquer voz, era a voz de Elis Regina nos versos da canção No dia em que eu vim embora. A identificação da – hoje já consagrada – atriz com a cantora gaúcha é longínqua e se converte em entrega dramática no longa Elis, que estreia nesta quinta. A escalação da atriz para o papel principal (performance premiada no Festival de Cinema de Gramado) é uma das principais forças da produção.
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– Quando eu li pela primeira vez sobre a vida dela (Elis) eu fiquei fascinada, havia muitas semelhanças com minha história em vários sentidos, pessoais, familiares, várias coisas. E ela era ainda menor do que eu, e ninguém é menor do que, eu sempre sou menor que todo mundo (risos). Eu fui ficando fascinada com tudo, pela maneira como ela foi abrindo o caminho dela, não tinha indicação de ninguém, foi o trabalho que abiu o caminho para ela. Isso para mim é uma riqueza – revelou Andreia, durante a apresentação do filme para a imprensa, em Porto Alegre, ao lado do diretor Hugo Prata, do colega de elenco Júlio Andrade e do produtor Fabio Zavala.
Hugo Prata é estreante no cinema porém veterano dos DVDs musicais, já trabalhou com artistas como Skank, Lenine, etc. A trajetória deve ter facilitado a escolha do diretor por uma cinebiografia (uma tendência no cinema nacional, aliás) de cunho tão musical. E talvez explique a opção por abrir o filme logo com um "clipe", onde a Pimentinha entoa seu maior clássico: Como Nossos Pais. Não há como negar a força da trilha e da própria Andreia Horta, que mesmo dublando consegue se aproximar da intensidade que Elis imprimia em suas performances. Durante o filme, a atriz imita ainda trejeitos, vocabulário e o próprio sorriso escancarado da cantora, impressionando o espectador pela semelhança.
Depois dessa primeira aparição musical da protagonista (com o icônico corte de cabelo curtinho estilo La Garçonne, tendência ainda atual), o filme retorna no tempo para a chegada da cantora gaúcha no Rio de Janeiro (de cabelo chanel), o ponto de partida para o recorte proposto para o filme. A partir daí, a história anda 18 anos, até a morte de Elis, em 1982. Os gaúchos talvez sintam falta do início da carreira em Porto Alegre e até mesmo da parceria com Tom Jobim.
– Isso é dolorido, grandes episódios e personagens se perderam nessa curva. As pessoas falam de cinebiografia, mas não acho que seja. Não é "Elis, o Filme", é "Elis, um filme", a gente precisa fazer outros, a vida dela é muito rica, cortamos na carne coisas muitos fatos interessantes – comenta o diretor.
Assim como outras cinebiografias brasileiras, Elis promete arrebanhar espectadores por conta da força de sua personagem principal. Um desafio e tanto para Hugo Prata, que tinha os gigantes dramas de uma gigante (de 1,53) personalidade para condensar em duas horas:
– O tempo todo me cobrava em fazer um filme à altura da Elis, não só artística, mas da força dramática dela, da força dela como mulher. Eu sabia que não podia falhar.
Roteiro
Nessa intenção de contemplar os vários altos e baixos da carreira da gaúcha, o roteiro por vezes caminha rápido demais por meio de elipses nem sempre bem-vindas. Por outro lado, há uma escolha muito interessante na condução da história que coloca Elis no centro da vida de vários personagens masculinos. Entre eles estão o pai, Romeu (Zecarlos Machado, com sotaque carregadamente gaúcho); os maridos, Ronaldo Bôscoli (Gustavo Machado) e César Camargo Mariano (Caco Ciocler); os conselheiros Miéle (Lúcio Mauro Filho) e Nelson Motta (Rodrigo Pandolfo); e o amigo íntimo Lennie Dale (em aparições breves, porém viscerais, do gaúcho Júlio Andrade). A construção reforça o protagonismo feminista de Elis num ambiente artístico comandado por homens.
– Ela era a estrela de cada um desses caras – justifica Hugo Prata.
No desafio de construir uma dramaturgia condizente com a intensidade de sua retratada, o longa também procura mostrar conflitos envolvendo a censura e a perseguição política – opção que, de fato, reforça a importância histórica do longa e sua urgência entre as gerações mais jovens.
– Uma das grandes motivações pessoais a fazer o filme é justamente o público de vinte anos, tenho dois filhos nessa idade e percebo um gap de memória no Brasil. (...) A Elis teve toda sua produção sob censura, não conheceu a arte livre. A gente fez questão de trazer isso.. Não é a tônica do filme, mas é incrível como as pessoas têm absorvido, claro, reflexo dos tempos que vivemos hoje de novo – opina o diretor.
– Seria lindo se pudéssemos dizer que é um filme contando uma realidade de 20 anos atrás. De muitas maneiras, ele é muito atual. A censura já está infiltrada dentro das cabeças – complementa Andreia Horta.
Veja o trailer
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