Se sua vida tivesse de ser resumida no conteúdo de uma única mala, o que estaria dentro dela? O que melhor representaria quem você é? As respostas a essas perguntas são difíceis, e é justamente isso que torna ainda mais interessante a exposição Peregrinos e Forasteiros, que abre nesta quinta-feira no Museu dos Capuchinhos (MusCap), em Caxias do Sul.
A mostra levará ao público o conteúdo de uma dezena de malas que pertenceram a freis capuchinhos ao longo da história, ou seja, aquilo que eles tinham de mais pessoal e característico.Como fazem votos de pobreza e obediência, os freis, segundo tradição iniciada por São Francisco de Assis, têm na mala o único bem a levar consigo em sua caminhada religiosa. Nela vão seus objetos pessoais, suas memórias individuais, aquilo que os faz ser quem são.
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Quando um frei morre, seus objetos são guardados na mala, que fica armazenada como forma de preservar sua história e a própria história da ordem, que está completando 120 anos de presença no Rio Grande do Sul. Do vasto acervo da "Sala das Malas", que começou a ser formado ainda antes da fundação do MusCap, há 15 anos, foram selecionadas dez para essa mostra inédita.
– Para a exposição, haverá desde malas dos pioneiros a virem para o Estado até de freis de diferentes ofícios, freis missionários, intelectuais, carismáticos... – enumera a museóloga do MusCap, Mirella Honorato.
Um dos destaques deve ser o acervo do frei Rovílio Costa, fundador do museu, historiador e autor de vários livros, que morreu em 2009. Na sua mala, entre outros itens, há uma coleção de gravatas, quipás que ganhou ao frequentar cerimônias judaicas, miniaturas de gatos e, claro, parte dos livros que editou.
Já do frei Luiz Carlos Franceschet, que era o alfaiate da ordem, estarão expostos os moldes usados para fazer os hábitos e, além dos pertences pessoais, sua máquina de costura.
Um único religioso ainda vivo terá sua mala aberta na mostra: o frei Sylvio Dall'Agnol, que foi missionário na África. Entre seus objetos estão lembranças da República Centro-Africana, onde atuou, e pedras das mais diversas partes do mundo, que coleciona.
De outro frei, que era marceneiro, poderão ser conferidos os instrumentos de trabalho. Na lista estão ainda reconstruções de outras facetas dos capuchinhos, como o pároco, o pesquisador e o músico.Também não poderiam faltar os objetos religiosos, como rosários e medalhinhas desses personagens que ajudaram a construir a história dos capuchinhos em solo gaúcho.
Uma curiosidade são os passaportes e as cartas de obediência – ou cartas obidenciais. Essas últimas são o documento oficial emitido quando um frei é transferido para um novo local; o nome deve-se ao fato de que o religioso não escolhe seu destino, vai aonde é enviado.
Também estarão expostas 16 malas de diversos freis, sem o conteúdo, cerca de 50 fotografias da vida cotidiana dos capuchinhos e outros documentos.
Agende-se
O que: abertura da exposição Peregrinos e Forasteiros
Quando: nesta quinta, dia 28, às 18h30min
Onde: no Museu dos Capuchinhos (Rua General Mallet, 33A, bairro Rio Branco), em Caxias
Visitação: até 14 de outubro, de segunda a sexta, das 8h às 11h30min e das 13h30min às 17h; agendamentos para visitas educativas em horários especiais pelo e-mail educativo@muscap.org.br
O que há em cada mala
Confira de quem eram as malas expostas e o que há nela:
- Frei Bruno de Gillonnay (1859 - 1938): frei francês que fundou a província dos capuchinhos no Rio Grande do Sul; dele, não se tem uma mala, apenas o diário de sua missão.
- Frei Exupério de La Compôte (1876 - 1971): também frade francês, destacou-se como músico e professor de música; seus objetos incluem violino, partituras, batuta de regente, livros de sua autoria sobre música, estola, terço e porta rapé.
- Frei Pacífico de Bellevaux (1873 - 1957): outro francês, foi professor nos seminários; sua mala e seu carimbo serão expostos.
- Frei Alberto Stawinski (1909 - 1991): primeiro provincial eleito da província do RS, atuou também como pároco e vigário de diversas paróquias e foi pesquisador da imigração polonesa; serão expostas sua mala, seus objetos litúrgicos viáticos (de viagem) e seus livros.
- Frei Rovílio Costa (1934 - 2009): idealizador do MusCap, pesquisador das diferentes imigrações no Estado e editor, era considerado um frei ecumênico, que circulava em outros meios religiosos, principalmente judaico; podem ser conferidos sua mala, seu terno, um radinho, terço, seus sapatos, parte de suas coleções de gravatas e de bibelôs de gatos, quipás e parte dos livros que editou.
- Frei Luiz Carlos Franceschet (1931 - 2012): o frei, que ingressou na vida religiosa apenas aos 30 anos, trouxe consigo o ofício de costureiro e atuou como irmão alfaiate; estão expostas suas malas, sua máquina de costura, peças de tecido, moldes confeccionados por ele e outros utensílios de costura, como dedal e giz.
- Frei Ambrósio Tondello (1912 - 1990): atuou cerca de 30 anos como conselheiro espiritual na paróquia Imaculada Conceição, e sua mala inclui hábito, relógio de bolso, escapulário, objetos litúrgicos para viagem e as medalhinhas que presenteava às pessoas que iam com ele se aconselhar.
- Frei Salvador Pinzetta (1911 -1972): destacou-se pela vida de oração e extrema simplicidade, tanto que foi pedida a sua beatificação e, anualmente, ocorre uma romaria até o hermitério onde rezava, em Flores da Cunha; sua mala retrata essa simplicidade, com seu hábito, chapéu de palha, terço e relógio de bolso.
- Frei Terêncio Zancanaro (1933 - 2015): sua mala reflete as funções de horticultor e serviços gerais, com botas, caixa de ferramentas e utensílios de pesca.
- Frei Sylvio Giocondo Dall'Agnol (1929): único frei ainda vivo entre os que terão suas malas expostas, foi missionário na República Centro Africana e na Bahia. Tem expostas vestes africanas, esculturas e adornos que trouxe da África, além de parte de sua coleção de pedras e sua máquina fotográfica.